terça-feira, 2 de dezembro de 2014

CABEÇA DE PEDRA


Sou ladrão!

Sou ladrão, sim - e daí? Ninguém nunca me pegou. Sou o rei dos caras de pau. Claro que tenho um mandato parlamentar. E faz tempo! Tanto que, se bobear, ainda terei forças para colocar meu bisneto na quadrilha. Não tenho vergonha do que faço. Roubo algumas quirelas do orçamento. Tem gente que rouba muito mais. Todo mundo rouba, disso tenho certeza. Sempre fui modesto. Me contentei em ficar com uma parcela do que se transformou em beneficio para o meu povo. Meu povo que vota em mim. Meu povo da família vai muito bem, obrigado. No começo fiquei meio sem jeito para fazer a coisa. Depois, me acostumei. Dinheiro fácil. Me conformei com a história do nosso país. Sempre foi assim, desde que os portugueses mandaram os criminosos povoarem a terra que tudo dá. E como dá! Faço meu serviço direito. Engano a todos com discursos patrióticos e que pregam a honestidade. Para os outros. Não sou honesto. Sou honesto comigo mesmo pois me convenci de que dinheiro traz felicidade. Inventaram aquela lorota que diz ao contrário só para manter a bugrada mansa e na miséria. Sempre sou financiado por quem tem muito mais que. É que eles ganham ainda mais com o trabalho que faço para eles. É o jogo. Sou humilde, mas só gosto de ficar em hotel de muitas estrelas quando viajo para a Europa. Miami é coisa de novo rico cucaracha. Sou um velho ladrão. Ostento apenas lá fora, onde ninguém me conhece. Aqui, se pudesse, andava de Fusca, feito o uruguaio que liberou a maconha. Agora tenho de parar essa confissão. Porque vou queimá-la. Faço isso para desopilar. Isso e a missa que vou sagradamente todo domingo. No sábado me confesso. No dia seguinte, comungo. Para ficar pronto para os roubos da semana. Rezo para morrer num domingo. Eu acredito que exista o céu.

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