domingo, 31 de maio de 2015

OS AMANTES DE PONT NEUF

Les Amants du Pont Neuf
(França, 1991) de Leos Carax 


por Filipe Furtado

Crítica incompreensão

Os quatro longas de Leos Carax (Boy Meets Girl, Sangue Ruim, este Os Amantes do Pont Neuf e o inédito por aqui Pola X) são todos muito consistentes dentro da sua proposta barroca impressionista, mas Carax deu certo azar de aparecer para o público cinéfilo no momento errado. Como Boy Meets Girl e principalmente Sangue Ruim circularam pelo mundo na segunda metade dos anos 80, quando estávamos no auge da popularidade de Diva e Subway, o que boa parte da crítica viu foi apenas o estilo agressivo de Carax, e como Denis Lavant correndo ao som de “Modern Love” de Bowie poderia ser jogado na mesma pilha do maneirismo publicitário de um Luc Besson ou Jean-Jacques Beineix. Pouco importam as outras informações disponíveis, que apontavam Carax como um cineasta de olhar mais articulado e de raízes bem distantes daquela dupla – como os textos que publicara ocasionalmente na Cahiers du Cinema, que mostravam uma paixão evidente pelo cinema mudo e certo drama com tintas excessivas; ou o fato de que fora convidado a fazer pontas em filmes de Philippe Garrel e Jean-Luc Godard. Mas a pecha de publicitário já havia sido distribuída apressadamente, e até hoje Carax tem dificuldades para se livrar dela.
Qual seria este seu projeto então? O que mais chama atenção em Os Amantes do Pont Neuf é uma soma de 3 características muito diferentes: o tom obsessivo que toma conta do filme; a relação particular com sua Paris de estúdio; e, por último mas talvez a mais essencial e vital delas, a presença eminentemente física que o filme aos poucos impõe. Os dois primeiros pontos são intimamente ligados e vale embrar que o filme teve uma produção das mais conturbadas – mais caro filmes francês até então e quase 3 anos para ser concluído. Os Amantes do Pont Neuf é um filme de um obsessivo ambicioso trabalhando com um cheque em branco. Parte do seu charme brota dali – como também acontece nos primeiros Welles, Ivan, o Terrível ou A Idade da Terra. Sobretudo, existe um paralelo muito claro entre a forma minuciosa com que Carax constrói seu filme e a história de amor louco que narra.
A grandiloqüência do filme também informa muito da filiação cinéfila de Carax. Seus modelos aqui estão longe da tolice de um Besson ou Beneix, muito mais próximos de um Aurora de Murnau ou Playtime de Jacques Tati. Carax deseja construir, à sua maneira, uma celebração da sua Paris similar à destes outros filmes. Há o mesmo mundo deliberadamente artificial, o mesmo desejo de usar infinitos recursos para desbravar um universo de forma muito peculiar. Podemos falar igualmente do absurdo que é reconstruir em estúdio toda uma região para narrar um caso de amor entre dois mendigos – incluindo a famosa ponte que empresta titulo ao filme –, como da maneira como seu protagonista cruelmente decide, ao saber que sua amada que está ficando cega teria uma chance de recuperação, esconder esta informação.
Isso tudo se desdobra no peso que o filme aos poucos cria. As primeiras sequencias sugerem uma observação do universo dos mendigos de Paris – não uma observação documental, porque o estilo de Carax é por demais antinaturalista para isso (não só no barroco das imagens, mas também em soluções de montagem e edição de som). Aos poucos, somos introduzidos ao romance e notamos que o objetivo do projeto de Carax é outro: dar-nos uma dimensão física para aquela paixão. Fazer com que ela ocupe cada plano do filme, torne-se a guia principal das suas imagens.
A desleitura crítica da qual Leos Carax foi vítima termina por ser grave pela forma como o impressionismo do cineasta viria a encontrar ecos muito fortes em outras partes da produção contemporânea. Claire Denis e Olivier Assayas, para pegarmos dois dos melhores – e muito diferentes – cineastas franceses dos últimos vinte anos, foram muito marcados pelo filme, e o mesmo pode ser dito de Wong Kar Wai (e, por conseqüência, os seus diluidores). Os Amantes do Pont Neuf é um dos filmes mais influentes do começo dos anos 90, mas sua influência pouco foi observada por conta de uma associação crítica fácil criada anos antes. E este é um crime de uma crítica muito mais publicitária do que qualquer imagem da obra de Carax.

segunda-feira, 25 de maio de 2015

CABEÇA DE PEDRA


Uma lagosta para Bukowski

Ninguém sabe como aquela lagosta apareceu. Os três tinham bebido muito na noite anterior. Fizeram a famosa via sacra por vários bares da cidade – que terminou no boteco onde o trio sempre entrava torto e pedindo para o conjunto musical tocar Summertime. Quando acordaram na casa de um deles, mais amarrotados do que pobre no trem da Central do Brasil, viram o embrulho em cima da mesa. Dentro do jornal que anunciava mais um crime bárbaro na cidade, o bicho, inteiro, pálido, se é que lagosta fica assim – mas aquela estava sem cor, pálida. Se entreolharam e um deles disse que sabia preparar. Às onze da manhã de um dia normal da semana, derrubaram algumas doses de cachaça, para rebater, e o crustáceo foi para a panela cercado de batatas e cebolas boiando em água com muito sal. Cervejas foram compradas, um litro de conhaque de alcatrão de São João da Barra também. Tomaram tudo. A água secou, o bicho e os ingredientes torraram um pouco menos que o trio. Quase houve um incêndio na casa de madeira. Eles acordaram antes da tragédia e resolveram comer do jeito que estava. Um quase morreu engasgado. Dormiram de novo. No dia seguinte queriam ir a um restaurante para saber que gosto tem uma lagosta. Não foram por falta de numerário. Aquele era um tempo em que reverenciavam Henry Chinaski, famoso personagem e alter-ego de Charles Bukowski.

HOWLIN' WOLF

Smokestack Lightning - Live (1964)

SOLDA

CÁUSTICO


SOLDA CÁUSTICO: http://cartunistasolda.com.br/

sábado, 23 de maio de 2015

MEIA-NOITE EM PARIS

MEIA-NOITE EM PARIS (Midnight in Paris, 2011, Gravier Productions, 94min) Direção e roteiro: Woody Allen. Fotografia: Darius Khondji. Montagem: Alisa Lepselter. Figurino: Sonia Grande. Direção de arte/cenários: Anne Seibel/Hélène Dubreuil. Produção executiva: Javier Méndez. Produção: Letty Aronson, Jaume Roures, Stephen Tenenbaum. Elenco: Owen Wilson, Marion Cottilard, Rachel McAdams, Michael Sheen, Kathy Bates, Corey Stoll, Adrien Brody, Alison Pill, Tom Hiddleston, Carla Bruni, Léa Seydoux. Estreia: 11/5/11 (Festival de Cannes)

4 indicações ao Oscar: Melhor Filme, Diretor (Woody Allen), Roteiro Original, Direção de Arte/Cenários
Vencedor do Oscar de Roteiro Original
Vencedor do Golden Globe de Roteiro
Woody Allen é um cineasta capaz de devolver à plateia a fé no bom cinema. "Meia-noite em Paris", seu longa-metragem vencedor do Oscar de melhor roteiro, é uma pequena obra-prima de delicadeza, romantismo, bom-humor e cultura. Logicamente, não é um filme para o público cuja ideia de comédia é qualquer infâmia com Leandro Hassum e Bruno Mazzeo, mas sim um presente carinhoso a seus fieis espectadores. Ecoando a fantasia de "A rosa púrpura do Cairo" - em que a personagem de Mia Farrow se apaixonava pelo protagonista de um filme, que abandonava a tela para conquistá-la - e a beleza singela de "Manhattan" - que, como o título sugere, é uma homenagem à Nova York - "Meia-noite em Paris" convida a audiência a uma deliciosa viagem a um tempo em que a Cidade-Luz ainda era uma festa, frequentada por gente da estirpe de Ernest Hemingway e Salvador Dalí.
Owen Wilson (surpreendentemente bem e deixando para trás os irritantes trejeitos que lhe deram fama) vive Gil Pender, um roteirista de Hollywood que sonha em ser reconhecido como escritor sério. Em viagem por Paris com sua noiva, a bela Inez (Rachel McAdams imitando Scarlett Johansson), ele sente-se enciumado por sua relação com um antigo professor, Paul (Michael Sheen) e, um pouco bêbado e muito perdido nas ruas da cidade em uma madrugada, acaba indo parar em uma festa um tanto estranha, onde dá de cara com o escritor F. Scott Fitzgerald (Tom Hiddleston) e sua esposa Zelda (Alison Pill), além de testemunhar o próprio Cole Porter (Yves Heck) tocando para os convidados. Percebendo que está convivendo com artíficies dos anos 20, como Hemingway (Corey Stoll, ótimo) e Gertrude Stein (Kathy Bates) - a quem pede opiniões sobre seu novo romance - Gil passa a, todas as noites, sair para a farra com seus novos amigos, que incluem o pintor Salvador Dalí (Adrien Brody) e o cineasta Luis Buñuel (Adrien de Van) - a quem dá a ideia de seu filme "O anjo exterminador". Tudo fica complicado quando ele se apaixona pela bela Adriana (Marion Cottilard), musa de artistas como Pablo Picasso e Modigliani e fica tentado a abandonar sua geração para permanecer na segunda década do século XX.
As piadas de "Meia-noite em Paris" são sofisticadas e eruditas, mas jamais soam pedantes ou herméticas. É claro que é preciso uma certa cultura para melhor usufruir de todos os detalhes e homenagens que Allen larga pelo caminho, mas mesmo quem nunca ouviu falar de Toulouse-Lautrec e T.S. Eliot pode se deixar contaminar pelo romantismo derramado que a bela fotografia de Darius Khondji inspira e pela questão que o roteiro levanta: afinal de contas, a época em que sonhamos viver é realmente melhor do que a em que realmente vivemos ou tudo não passa de uma fantasia regada por nossas referências culturais?

Qualquer que seja a resposta, isso é o que menos importa. O que realmente vale dizer é que "Meia-noite em Paris" é Woody Allen em sua melhor forma - o que se refletiu no sucesso inesperado de bilheteria e na indicação ao Oscar de melhor filme e sua merecidíssima premiação na categoria de roteiro original. Sem contra-indicações para quem gosta de Allen em particular e de cinema em geral.


sexta-feira, 22 de maio de 2015

BORBOLETANDO

NO QUINTAL DE DONA ZEFA







Fotografias de Ricardo Silva

sábado, 16 de maio de 2015

FRANZ KAFKA


Um machado para o mar congelado

É bom quando nossa consciência sofre grandes ferimentos, pois isso a torna mais sensível a cada estímulo. Penso que devemos ler apenas livros que nos ferem, que nos afligem. Se o livro que estamos lendo não nos desperta como um soco no crânio, por que perder tempo lendo-o? Para que ele nos torne felizes, como você diz? Oh Deus, nós seríamos felizes do mesmo modo se esses livros não existissem. Livros que nos fazem felizes poderíamos escrever nós mesmos num piscar de olhos. Precisamos de livros que nos atinjam como a mais dolorosa desventura, que nos assolem profundamente – como a morte de alguém que amávamos mais do que a nós mesmos –, que nos façam sentir que fomos banidos para o ermo, para longe de qualquer presença humana – como um suicídio. Um livro deve ser um machado para o mar congelado que há dentro de nós.





PHILIPPE DRUILLET






ESTA VIDA É UMA VIAGEM


por Paulo Leminski

esta vida é uma viagem
pena eu estar
só de passagem


sexta-feira, 15 de maio de 2015

B B KING

Riley Ben King, mais conhecido como B.B.King
(Itta Bena, Mississippi, 16 de setembro de 1925 – Las Vegas, 14 de maio de 2015 )

quinta-feira, 14 de maio de 2015

SOLDA


VÊ TV


SOLDA CÁUSTICO: http://cartunistasolda.com.br/

A CANALHICE CRETINIZANTE


por  Nelson Rodrigues

- Nada mais cretino e mais cretinizante do que a paixão política. É a única paixão sem grandeza, a única que é capaz de imbecilizar o homem.

- Como são parecidos os radicais da esquerda e da direita. Dirá alguém que as intenções são dessemelhantes. Não. Mil vezes não. Um canalha é exatamente igual a outro canalha.


quarta-feira, 13 de maio de 2015

RUGENDAS

ALGUMAS DAS ETNIAS AFRICANAS EXISTENTES NO BRASIL IMPÉRIO
(1821-1825)





RUBEM BRAGA

O Pavão

Eu considerei a glória de um pavão ostentando o esplendor de suas cores; é um luxo imperial. Mas andei lendo livros, e descobri que aquelas cores todas não existem na pena do pavão. Não há pigmentos. O que há são minúsculas bolhas d'água em que a luz se fragmenta, como em um prisma. O pavão é um arco-íris de plumas.

Eu considerei que este é o luxo do grande artista, atingir o máximo de matizes com o mínimo de elementos. De água e luz ele faz seu esplendor; seu grande mistério é a simplicidade.

Considerei, por fim, que assim é o amor, oh! minha amada; de tudo que ele suscita e esplende e estremece e delira em mim existem apenas meus olhos recebendo a luz de teu olhar. Ele me cobre de glórias e me faz magnífico.


Rio, novembro, 1958


Texto extraído do livro "Ai de ti, Copacabana", Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1960, pág. 149.

FONTE: http://www.releituras.com/rubembraga_pavao.asp

domingo, 10 de maio de 2015

MEUS CAROS AMIGOS

 Amici Miei (1975)

 por Gerson Steves


Se cruzar a fronteira dos cinqüenta já é complicado nos dias de hoje, em que eles são os novos 40, imagine na década de 70. Era sinônimo de absoluta falta de perspectivas profissionais, financeiras e até sentimentais. E é justamente sobre um grupo de amigos, nessa faixa etária tão significativa, que trata o filme Meus Caros Amigos (Amici Miei), de Mario Monicelli, rodado em 1975. Lembro que o vi na época e me diverti muito com as trapalhadas e pequenas travessuras de um grupo de senhorzinhos de meia idade. Hoje, distante mais de 30 anos no tempo, e também vivendo a curva dos 50, o filme me pareceu mais melancólico e (pasme) até filosófico do que na época.
Recheado de situações hilárias, é narrado em primeira pessoa pelo jornalista Perozzi, vivido por Philippe Noiret, num encadeado de flash-backs não lineares em que são contadas as aventuras e estripulias de cinco amigos inseparáveis– os outros são interpretados por Ugo Tognazzi, Duilio Del Prete, Gastone Moschin e Adolfo Celi. No filme, cada um tem seu grande momento, mas ficam a cargo de Noiret e Tognazzi as cenas mais antológicas. Graças ao grande talento cômico e dramático de ambos, seus personagens ganham em profundidade e dimensão – por vezes trágica.

Logo na primeira cena, vemos um jornalista que dorme mal, freqüenta a noite entre bêbados e prostitutas, e fuma sistematicamente – quase a crônica de uma morte anunciada. É Noiret – imortalizado no personagem Alfredo de Cinema Paradiso – que vai apresentar os outros personagens e contar como todos se conheceram e se envolveram na “ciganagem”, forma com que chamavam a prática de sair sem destino por algumas horas ou até dias, envolvidos em pegadinhas. A voz do jornalista conduzirá as desventuras amorosas e sexuais dos amigos e irá revelar até os pequenos atos de nobreza cotidiana que poderiam escapar aos olhares menos sensíveis.
Tognazzi – conhecido do público brasileiro pela trilogia Gaiola das Loucas – interpreta um conde falido que se divide entre uma vida miserável com a mulher e a filha e um ardente romance com uma jovem 30 anos mais nova, de quem se torna praticamente escravo sexual. No estilo inconfundível do malandro romano que fora playboy nos anos 50, ele possui uma técnica toda especial de enrolar as pessoas misturando frases e palavras absolutamente sem sentido num contexto inesperado e ditas com tamanha verossimilhança que ninguém é capaz de contrariá-lo.

Mario Monicelli, como diretor, não cede à tentação de fazer uma comédia fácil tipicamente italiana daquele período. Sua luz é dramática, os enquadramentos são uma brincadeira com vários gêneros cinematográficos (do neo-realismo aos filmes de gângsters americanos) e a narrativa não é nem um pouco linear. Além disso, a trilha sonora constitui um espetáculo à parte, apresentando sonoridades que lembram toda uma cinematografia italiana, com direito a ecos de Nino Rota.
É um filme que não poupa a crítica às instituições mais caras à Itália conservadora da época e tampouco às transformações que aquela sociedade via acontecerem ao seu redor. Não escapam a Igreja, o casamento, a família, a propriedade, o trabalho, a polícia, a máfia, a liberação sexual feminina, as drogas, a velhice e a morte. Tudo vira motivo de piada. Tudo é pretexto para um olhar cínico e malandramente rejuvenescedor.
O filme foi um sucesso tão grande que gerou duas continuações não previstas quando da feitura de seu original; as três foram rodadas entre 75 e 85, todas com direção de Monicelli, mas na última sem a presença de Noiret (por questões de roteiro da primeira versão). Ainda assim, todas valem muito a pena. Aproveite, ainda, para se deleitar com a participação de Adolfo Celi – que foi casado com Tônia Carrero e exerceu forte influência sobre o teatro brasileiro dos anos 40 e 50 por sua atuação no TBC (Teatro Brasileiro de Comédia). Pegue os três e veja em estilo maratona!

CLAUDIO CURI ACRESCENTA:

Mário Monicelli é considerado por muitos o rei da comédia, ou seja o mais engraçado dos realizadores italianos, mas sua visão é mais engajada do que parece ser. Em suas comédias retrata seus personagens de uma forma muito humana, sempre com grande sensibilidade. Iniciou sua carreira em 1935, quando já era crítico de cinema e, mais tarde (a partir de 1949), formou com Steno, outro diretor, uma grande dupla de roteiristas e, depois, diretores, especializados em comédias. Trabalharam muito com o grande ator italiano Totó, em uma série de filmes hilariantes.
A partir de 1954, Monicelli, separando-se de Steno, continuou sua carreira sozinho, sendo o realizador de filmes memoráveis, tais como Pais e Filhos, Os Eternos Desconhecidos. Os Companheiros, Casanova 70, O Incrível Exército de Brancaleone(talvez o seu maior sucesso), além deste delicioso Meus Caros Amigos, de 1975, que teve uma sequência em 1982, chamada Quinteto Irreverente (Amici Miei Atto II).
Além de Totó, Monicelli trabalhou com os maiores atores italianos de todos os tempos, tais como Anna Magnani, Vittorio Gassman, Marcello Manstroianni, Silvana Mangano, Gina Lollobrigida e tantos outros.
Em 1992 foi o autor de outra comédia deliciosa, sobre a família, chamada Parente é Serpente (Parenti Serpenti), em que mostra filhos que tentam se livrar de seus pais para não terem que cuidar dos mesmos na velhice. Um enorme sucesso.
Monicelli inspirou diretores de gerações seguintes, como Ettore Scola, cujo O Bailejá teve aqui a sua resenha. Teve, também, vários filmes indicados ao Oscar de melhor filme estrangeiro, tendo ganhado o Leão de Ouro em Veneza, pela carreira e pelo filme A Grande Guerra, em 1991. Faleceu em 2010, em Roma, aos 95 anos.

sexta-feira, 8 de maio de 2015

quinta-feira, 7 de maio de 2015

CABEÇA DE PEDRA


Trinca, trincando e desbundando



Chegou no manicômio algemado, só de cueca e no camburão da polícia. Os olhos injetados, babava pelos dois lados da boca. Não conseguia falar, dentes rangendo. Levaram-no para a unidade de desintoxicação, aplicaram sedativos, deitaram-no na cama, amarraram seus braços e pernas. Uma enfermeira grávida perguntou, depois de um tempo, se ele estava se sentindo melhor. Ele olhou e disse: “Trinca, trincando e desbundando”. Ela estava acostumada àquilo. Só não gostava muito quando chegavam os alcoólatras que entravam em estado de delirium tremens – porque os bichos que viam os faziam urrar de pavor e ela achava que isso o seu bebê poderia ouvir e não gostar. Uma semana depois o trinca, trincando e desbundando já estava sóbrio e conversando com os outros pacientes internados. Contaram como chegou e o que falou. Ele tentava lembrar de todo jeito como aconteceu tudo aquilo, mesmo porque até a véspera do ocorrido nunca tinha colocado nenhum tipo de droga na corrente sanguínea. Era um careta radical. Então lhe veio a imagem da festa onde estava tomando água mineral e foi até a cozinha procurar algo para comer. Não achou e abriu a porta de um armário. Lá havia uma bandeja de prata e com um monte de pó branco em cima. Achou que era de comer. Pegou uma colherinha, encheu-a, colocou na boca e engoliu.

THE ROLLING STONES


Sympathy for The Devil

terça-feira, 5 de maio de 2015

AUGUSTO DOS ANJOS


Psicologia de um Vencido



Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.

Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme -- este operário das ruínas --
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!

sábado, 2 de maio de 2015

sexta-feira, 1 de maio de 2015

DOROTHEA LANGE

A Grande Depressão sob as lentes de Dorothea Lange

Dorothea Lange (1895 – 1965) foi uma influente fotógrafa documental e fotojornalista norte-americana conhecida por seus retratos da Grande Depressão para a Farm Security Administration (FSA). Suas imagens ajudaram a humanizar as consequências da Crise de 1929 e influenciaram o desenvolvimento da fotografia documental.


Children of Oklahoma drought refugee in migratory camp, 1936. Foto: Dorothea Lange.


One of Chris Adolph’s younger children, 1939. Foto: Dorothea Lange.

Nascida na segunda geração de uma família de imigrantes alemães sob o sobrenome Margaretta Nutzhorn, Dorothea passou a usar o nome de solteira da mãe aos 12 anos, quando seu pai abandonou a família. Esse foi um dos dois incidentes traumáticos que marcaram sua infância. O outro foi a contração de Poliomielite aos sete anos, o que a deixou com a perna direita enfraquecida e a fez mancar pelo resto da vida.

Farmers who have bought machinery cooperatively, 1939. Foto: Dorothea Lange.


Country Store, 1939. Foto: Dorothea Lange.

Lange aprendeu fotografia com Clarence H. White na Columbia University de Nova Iorque e logo começou a trabalhar como aprendiz em diversos estúdios da cidade, como o Arnold Genthe. Em 1918, mudou-se para São Francisco, onde abriu seu bem sucedido estúdio de retratos e morou pelo resto de sua vida. Na época, casou-se com seu primeiro marido, o pintor Maynard Dixon, com quem teve dois filhos, Daniel e John.

Mother and child of Arkansas flood refugee family, 1937. Foto: Dorothea Lange.


Grandfather and Grandson, Manzanar Japanese Concentration Camp, 1942. Foto: Dorothea Lange.

Com a Crise de 1929 logo depois do nascimento de John, Lange tirou sua câmera do estúdio para clicar a situação das ruas. As imagens que fez dos desabrigados chamaram a atenção de outros fotógrafos, o que a levou a trabalhar na Ressettlement Administration (RA), depois chamada de Farm Security Administration (FSA), uma instituição criada com o objetivo de combater a pobreza rural, uma das principais consequências da Grande Depressão. Seu segundo marido, o professor de economia Paul Taylor, foi reponsável por politizá-la ainda mais.

Resettled farm child, 1935. Foto: Dorothea Lange.


Against the wall, 1934. Foto: Dorothea Lange.

De 1935 a 1939, Lange retratou para a FSA o sofrimento dos pobres e esquecidos, especialmente das famílias rurais deslocadas e dos trabalhadores imigrantes. Suas imagens eram distribuídas gratuitamente a jornais de todo o país, tornando-se fortemente representativas da época. A fotografia mais conhecida deste período é “Migrant Mother”, um dos mais icônicos registros da história da fotografia, que retrata uma imigrante chamada Florence Owens Thompson com três de seus sete filhos. A foto original original contava com a mão de Florence segurando um dos alicerces da barraca, mas a imagem foi retocada para que seu polegar fosse escondido. O dedo indicador permaneceu intacto e pode ser visto na parte inferior direita da imagem.

Migrant Mother, 1936. Foto: Dorothea Lange.


Mother and baby of family on the road, 1939. Foto: Dorothea Lange.

A fotógrafa foi premiada em 1941 fom uma bolsa da Fundação Guggenheim para excelência em fotografia, que abandonou para registrar a evacuação forçada de japoneses americanos a campos de realojamento após o ataque a Pearl Harbor. Para muitos, suas imagens das crianças nipo-americanas jurando lealdade à bandeira antes de serem enviadas a esses campos são uma assustadora lembrança de uma antiga política: deter pessoas que não cometeram crimes, e sem lhes oferecer qualquer apoio. As fotografias desse episódio, em especial do campo de Manzanar, foram tão obviamente críticas que o exército as confiscou. Hoje elas estão disponíveis na divisão de fotografias do site do arquivo nacional do país e na Biblioteca Bancroft da Universidade da Califórnia.

Migratory mexican field workers home, 1937. Foto: Dorothea Lange.


Cheap auto camp housing for citrus workers, 1940. Foto: Dorothea Lange.

Nas últimas décadas de sua vida, Lange sofreu de diversos problemas de saúde. Faleceu em 1965. Em 2006, uma escola foi batizada em sua honra em Nipomo, na Califórnia, perto do local onde foi clicada “Migrant Mother”.