terça-feira, 31 de janeiro de 2017

EM BUSCA DA IGNORÂNCIA ABSOLUTA


Por  Zé da Silva


Cansei. Juro que tentei. Caí na lorota de batalhar por um mundo melhor. Mifu. Tomei drogas na Vila Califórnia e no festival de Águas Claras. Me amarrei em árvores, dei tiros contra gorilas verdes e agentes da CIA. Enfiaram agulhas embaixo de minhas unhas e queimaram meu saco na cadeira do dragão. Sem lenço e sem documento acreditei no Caetano – e caí do cavalo. Escrevi um livro e foi antes do ponto final que me toquei. Não sujei a tela com o tal. Apaguei tudo. Fui para o pico da Neblina, olhei a imensidão em volta e ouvi o barulho dos tratores, das motosserras, dos milhões de índios trucidados por balas e doenças – e também o canto dos caciques bêbados. Voltei para a cidade e o espancamento diário das notícias acabaram por me soterrar de vez. Não dou o tiro no céu da boca porque vai sujar o tapete que ganhei de mamãe. Agora, ali do outro lado da janela, um canário da terra me olha. Chego perto e ele não se assusta. Então, eu digo: sem árvore, sombra e paz o homem segue destemido em sua busca da ignorância absoluta.


FONTE: http://www.zebeto.com.br/ze-da-silva-119/#.WJETAFMrKUk

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