No episódio CIGARETTE BURNS, dirigido por John Carpenter para a primeira temporada da série MASTERS OF HORROR, a trama central girava em torno da busca de um filme raro e amaldiçoado, que provocou uma tragédia em sua única exibição no Festival de Cinema Fantástico de Sitges. Carpenter ao contar essa genial fábula macabra sobre cinefilia e obsessão, despertou nos corações e mentes dos espectadores mais fanáticos, o que é o meu caso, um desejo de recordar filmes reais que realmente tem esse poder de mergulhar fundo no inconsciente humano, a ponte de fazer com que as mais absurdas reações venham para a superfície do mundo real e palpável. Existem filmes com essa força vital, assustadora, que deveriam ficar restritos aos poucos iniciados com sangue frio suficiente para ver de uma só vez o desfile de suas imagens de intensa brutalidade e de irreversíveis efeitos colaterais na alma. Um desses raros filmes, que emergiu das profundezas mais obscuras do inconsciente humano, é SUBCONSCIOUS CRUELTY, escrito e dirigido pelo canadense KARIM HUSSAIN.Muitos já devem ter ouvido falar do termo “Imagens do Inconsciente” ou até de um “Cinema do Inconsciente”. Para alguns psicanalistas, a observação de desenhos ou trabalhos artísticos de pacientes de manicômios, com as mais diversas doenças mentais, expressam um mundo que é somente deles, que apenas eles percebem, e que são registrados através dessas obras de arte, como os trabalhos sublimes do “Mestre do Labirinto” Arthur Bispo do Rosário. Agora imaginem um filme onde tudo o que é mostrado não possui nenhuma conexão com o seguro mundo palpável do que denominamos como normalidade. Assim pode ser definido SUBCONSCIOUS CRUELTY. Uma breve introdução em off fala dessa questão do poder de alguns filmes em nos transportar para lugares estranhos e assustadores. Vemos na abertura uma surrealista seqüência onde em um quase ritual pagão um corte faz emergir de um corpo um olho, de um local inusitado desse corpo. É o início de uma jornada por um mundo de sombras, gritos, sangue e insanidade, tanto no discurso como na formatação estética do filme. Num primeiro momento vemos o cotidiano doentio, obsessivo de um casal de irmãos, onde tudo é narrado do ponto de vista do homem, notoriamente um psicótico. Sua visão do mundo, de seu corpo, de sua relação com a irmã que ultrapassa todas as possíveis projeções psicóticas, é ilustrada com cenas que os mostram como seres quase híbridos, em uma espécie de casulo, ou nas perturbadoras cenas de hemorragias sofridas pela figura feminina representada pela irmã, que não tem voz nesse segmento do filme, pois toda fala é em off, feita pela figura do irmão.A cada sequência cresce a espiral de loucura do homem e fica no ar uma atmosfera opressiva de angústia com sua voz e os absurdos que ele emite, mesclados as cenas sangrentas que criam um quadro quase monocromático onde o vermelho e o preto se destacam. Nessa longa descida ao abismo, somos jogados dentro do caldeirão de uma mente perturbada até o clímax de seus devaneios. Uma pausa surge em uma seqüência encenada em uma floresta. Vemos homens e mulheres despidos em contato com a natureza de uma maneira íntima, numa espécie de êxtase dionisíaco onde essa natureza parece um ser vivo a ser fecundado e de onde excorrem fios de sangue. Nesse “Anti-Éden” encenado para marcar o meio do filme, podemos respirar um pouco e nos prepararmos para o derradeiro mergulho no abismo, com o terceiro segmento de SUBCONSCIOUS CRUELTY.Nessa terça parte, sem diálogos e nem narrativas em off, mergulhamos no cotidiano de um homem contemporâneo e seus traumas e recalques com relação a sexualidade, representados principalmente pela masturbação e seus delírios punitivos diante do confronto com as imagens pornográficas de um filme e o horror da culpa Católica representada pelas imagens sacras que vão culminar numa carnavalização da figura do Cristo, que é adorado e posteriormente devorado por um grupo de “ninfas-bacantes” em uma seqüência inacreditável onde o Gore extremo se mescla a imagem de uma mulher recebendo a hóstia consagrada que na simbologia católica representa justamente o corpo do cristo, sua carne.
Muitos escândalos, protestos violentos e uma radical divisão da crítica marcaram a passagem desse filme em Festivais de Cinema. Censurado e banido em muitos países, SUBCONSCIOUS CRUELTY virou um filme cultuado por um pequeno número de cinéfilos e totalmente desprezado pela careta e desinformada “Crítica Especializada” do Brasil. Karim Hussain lançou outras obras após esse filme e tem o reconhecimento de críticos mais seletos e recentemente colaborou como roteirista com o Cineasta espanhol NACHO CERDA, em sua estréia no longa-metragem com o filme THE ABANDONED, obviamente inédito no Brasil.Para os Cinéfilos com coragem para se “jogar” no abismo proposto por Hussain em SUBCONSCIOUS CRUELTY, a redenção virá após emergirem do transe de imagens absurdamente extremas e de uma beleza primitiva, ancestral, como os delírios de um Xamã...
fonte: http://revistazingu.blogspot.com/2007/01/cinemaextremo.html
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