segunda-feira, 30 de abril de 2012

O ENIGMA DE KASPAR HAUSER

WERNER HERZOG, 1974
O instigante filme “O Enigma de Kaspar Hauser” (ano de 1974), do cineasta alemão Werner Herzog, vencedor do Grande Prêmio do Júri, no festival de Cannes, em 1975, levanta para nós um tema filosófico polêmico, a saber: há uma racionalidade própria à natureza humana, ou ainda, é possível admitir uma natureza humana?
O drama do personagem, interpretado por Bruno S., que não era ator profissional, mas que trabalhou com muito esforço com o diretor alemão, é iniciado, mostrando-o sozinho, sentado, isolado, emitindo sons como de um animal, envolvendo um pano velho em um cavalo de brinquedo. Ele se encontra preso por um corrente, bebe água e come um pedaço de pão. É quando chega um homem vestido de preto, põe um banquinho à sua frente, entregando-lhe um papel e um lápis, forçando-o a escrever. Kaspar Hauser tenta segurar o lápis e escrever algo sozinho. Diante disso, levanta-se outra questão: já há no ser humano uma predisposição para a linguagem, em termos de uma ação consciente?
Em seguida, ele é carregado pelo homem, que o leva para o alto de um monte, pois o nosso personagem não sabe sequer andar. Com muita dificuldade, ele dá os primeiros passos. Aqui, fica explícito o entendimento de que o ambiente determina tanto aspectos físicos, quanto psico-sociais ao ser humano.

Algumas fotografias expõem de modo simples e belo os campos, os telhados, o relógio, a vila, imagens que refletem a mente obscura de um ser isolado, e que agora precisa urgentemente descobrir o mundo. O homem de preto vai-se, e Kaspar Hauser permanece imóvel no meio da praça com uma carta na mão, sendo observado pelos moradores, até que alguém pergunta a ele aonde quer ir, e se pode ajudá-lo, entregando a carta que segura a seu destinatário. O capitão da cavalaria, a quem foi destinada a carta, lê a história daquele rapaz com aspecto de uma criatura abandonada, isolado do convívio social. Não é possível extrair nada dele, como num interrogatório policial. Ele não fala e nem reage às perguntas. O único sinal é o seu nome, que é assinado no papel dado a ele. Resolvem, por isso, isolá-lo em uma cela, dizendo que devem enquadrá-lo nas normas legais, ainda que não parecesse ser ele um vândalo, dizem os guardas, que depois o levam para a casa de um dos moradores da vila.
Lá, o nosso enigmático personagem tem contato com uma família muito caridosa, que ensina a ele os hábitos sociais básicos, como sentar-se a mesa, pronunciar as palavras e frases, aprender a relacionar-se com o mundo a sua volta, ao tentar memorizar um poema ensinado pela filha do guarda da prisão e dono da casa, ou ao brincar com um passarinho, dando-lhe alimento. Ele ainda é capaz de se emocionar com uma criança nos braços, dizendo: “Mãe, sou desprezado por todos”, depois de ser motivo de zombaria para um grupo de bêbados arruaceiros.

Os oportunistas que o vigiam levam-no para o circo, a fim de tirar proveito de interesse público, como a grande atração. De lá ele passa a morar na casa do Sr. Daumer, um sujeito que assistia ao espetáculo circense, e que lhe dá todas as condições para que, enfim, seja despertada nele a potencialidade de socialização.
Ao ouvir o piano, já na casa do Sr. Daumer, ele diz: “Soa forte no meu peito a música. Estou muito velho? Por que tudo é tão difícil para mim? Por que não posso tocar piano como respiro?”... O Sr. Daumer responde a ele que, passados dois anos de convívio, ele já aprendera muita coisa, mas que ainda deve aprender tudo, pois nunca estivera entre os homens antes. Ao que Kaspar Hauser responde: “Para mim os homens são como os lobos”. Aqui, percebemos que, ao ter o domínio da linguagem, o personagem começa a colocar uma dúvida sobre a sua suposta “pureza”, como se essa denotasse uma impossibilidade de análise mais depurada da realidade. O que parece aqui ser ponto para reflexão é: a dita “civilização moderna” não delimita o poder de criticidade do homem, quando de seu processo de socialização?...
A própria existência de Deus é levada por dois teólogos a Kaspar Hauser, com o objetivo de doutriná-lo. “Já tinha alguma idéia de Deus?”, pergunta um dos teólogos. Ele apenas responde: “No cativeiro eu não pensava em nada, e não consigo imaginar que Deus do nada criou tudo, como vocês me disseram”. Um dos teólogos retruca imediatamente: “Deve admitir o mistério da fé sem procurar entender”. Mas, sabiamente, responde Kaspar Hauser: “Primeiro, preciso aprender a ler e a escrever melhor para compreender o resto”...

Vê-se que são questões polêmicas, agora situadas no contexto de uma possível resposta crítica a ser dada pelo personagem, como se o mesmo tivesse agora que lutar contra um sistema de códigos lingüísticos, ideológicos, estéticos, lógicos, teológicos, morais, prontos para extrair de sua mente uma resposta pronta e acabada. Duas cenas são marcantes para ilustrar esse embate: a primeira, em que Kaspar Hauser pergunta à governanta do Sr. Daumer: “para que servem as mulheres, e por que só lhe permitem cozinhar e fazer crochê?”, ao que ela desconversa e pede que isso seja perguntado ao Sr. Daumer; a segunda, quando um professor de lógica lança uma situação problema de caráter lógico dedutivo, dizendo que só há um modo de respondê-la, e depois da demonstração do professor, Kaspar Hauser apresenta outra possibilidade de resposta, o que, obviamente, não é aceito pelo ortodoxo professor. Pessoas como Kaspar Hauser são nessas horas consideradas loucas e inoportunas...
Com isso, o convívio social torna-se uma tortura para o nosso personagem. Numa recepção nobre, na casa de um conde inglês, ele se sente mal e sai, depois de expressar no piano o que sentia em sua alma através da valsa em Fá Maior, de Mozart. Em seguida, ele sai correndo da igreja, dizendo que a canção dos fiéis soa em seus ouvidos como um grito horrível. Fica aqui explícita a idéia de que não há enquadramento possível para Kaspar Hauser, capaz de satisfazer a sua busca interior. É quando ele é agredido em sua casa, com duas pauladas na cabeça. Ele parecia incomodar algumas pessoas. A sua indiferença aos padrões. O seu jeito “anti-social”. Mas faltava uma coisa a ser dita por ele. É quando ele tem uma visão profética. “Eu vi o mar. Eu vi uma montanha, e muita gente. Estavam todos subindo a montanha, como uma procissão. Havia muita neblina. Eu não conseguiria enxergar claramente. E lá em cima, estava a morte”.
Depois de recuperar-se, ocorre outro atentado, agora para conduzi-lo de vez à morte. Nos momentos derradeiros, já no leito de morte, Kaspar Hauser conta a sua última história. “Vejo uma caravana que vem pelo deserto atravessando a areia, guiada por um velho cego. A caravana parou, alguns acreditam que eles se perderam, pois se depararam com as montanhas. Eles não conseguem seguir a bússola. Então o guia cego pega um punhado de areia e a come, como se fosse uma comida. ‘Meus filhos’, diz o cego, vocês estão errados, isto diante de nós não são montanhas, e sim , apenas sua imaginação. Prosseguiremos para o norte’. E então, sem discutirem, eles prosseguiram adiante e chegaram na cidade. E lá a história continua. Mas a história nesta cidade, eu não sei. Eu agradeço por terem ouvida minha história. Estou cansado agora”...

Kaspar Hauser morre, e é logo autopsiado. Os médicos legistas examinam o seu cérebro e percebem uma deformidade, o seu lado esquerdo é menor. Isso dará um lindo processo investigativo. O escrivão, que relata o drama de Kaspar Hauser desde o seu início, afirma: “Finalmente temos a melhor explicação que podíamos achar sobre este estranho personagem”. Uma fala que nada mais representa do que a tentativa de justificar a ineficaz condução social dada pelos anos de não adaptação de Kaspar Hauser a um sistema ideológico alicerçado na burocracia das normas prescritas, segundo modelos fixos de padronização sócio-cultural.
Observa-se desse modo que é mais cômodo colocar a culpa da não sociabilidade do personagem a algum fator fisiológico, do que mergulhar fundo na questão antropológica da vida social e seus desdobramentos nem sempre logicamente demonstráveis e cientificamente comprováveis. Não estaria o filme de Herzog levantando outra possibilidade de responder à polêmica acerca de uma natureza pura do homem ou de uma racionalidade inata, que também necessitaria, para ser melhor compreendida, de afetividade, imaginação, criatividade e amor? Fica para nós a reflexão, em tons de polêmica e controvérsias...

Jorge Leão
Professor de Filosofia do Instituto Federal do Maranhão, e membro do Movimento Familiar Cristão
Em: 03 de março de 2009 

domingo, 29 de abril de 2012

JOE COCKER

With a Little Help From My Friends (1969)


Pode uma música dos Beatles ficar superior à versão feita pelo grupo? Difícil, não? Mas quando Joe Cocker gravou em 1969 “With a Little Help From My Friends”, ele conseguiu o feito.
“With a little help…” foi gravada originalmente em “Sgt Peppers Lonely Hearts Club Band” (1967). Era um rock com uma levada básica, sem grandes mudanças de andamento. Uma melodia espetacular, uma letra linda, uma música magistral.
Joe Cocker, cantor branco com voz negra, chamou Jimmy Page e gravou sua versão da canção dois anos depois. Apresentou a música em Woodstock.
Cocker introduziu um coral gospel, deixou a música mais lenta, valorizando mais os vocais e as guitarras. Aumentou a duração, botando pausas nas quebras. Colocou um piano maravilhoso.
Resultado: a balada beatle virou um rock furioso de nove minutos, com quebras de andamento, com um vocal negro rasgado, uma guitarra absurda que faz toda a linha melódica e um coral gospel segurando as pontas para que o ótimo Cocker cante como nunca.
Se você tem como eu mais de 25 anos, deve se lembrar dessa música na abertura do seriado “Anos Incríveis” (Wonder Years), um dos maiores seriados de todos os tempos. Ou então pega o DVD de Woodstock e confere esta gravação clássica.

sábado, 28 de abril de 2012

HORÓSCOPO

por Zé da Silva

Sagitário

Sobrevivia de fotos antigas. Não, não comercializava, nem tinha coleção. Procurava por aí, em museus, revistas e livros de sebos. Gostava de viver naqueles locais, imaginar como se chamavam e o que faziam as pessoas retratadas, principalmente a de flagrantes. Ouvia o som dos carros, as conversas, penetrava nos edifícios, percorria corredores, comia nos restaurantes, dançava nas boates, mergulhava e nadava em rios limpos que cortavam cidades. Morava num quarto de fundos que a família reservou e o colocou lá porque achavam que era esquisito demais. Nunca trabalhou porque… não tinha tempo. Seu campo de ação se resumia à cidade onde nasceu. Emoções não faltavam. Subiu a serra do mar no lombo de burro, recepcionou imigrantes, participou da construção dos primeiros edifícios. Às vezes saía para procurar resquícios do seu mundo particular. Ainda encontrava alguma coisa. Um dia telefonaram para sua casa. Foram buscá-lo, catatônico, na porta giratória de um banco inglês que se instalara no prédio centenário. Se recusava a sair. Depois, passou meses repetindo “digite a sua senha”. Quando parou, queimou todo o arquivo. Agora percorre a cidade atrás de bandas de garagem. A família acha que ele está melhorando.


SOLDA

VÊ TV
Década de 80


Fonte: http://cartunistasolda.com.br/2011/03/14/solda-ve-tv-79/#comment-82954

ANIVERSARIANTES

 JESSICA ALBA
Jessica Marie Alba (Pomona, 28 de abril de 1981)

PENÉLOPE CRUZ

Penélope Cruz Sanchez (Alcobendas, 28 de abril de 1974)

quarta-feira, 25 de abril de 2012

IMPRENSA ANÔNIMA

 ANÔNIMOS, POR ENQUANTO
EP do IA  (Foto e arte da capa: Felipe Verlaine)

Por Erivaldo Mattüs

Acordado por Frank Zappa & R. Silva, nosso fotógrafo ( o Silva, não o Zappa, quer dizer, vice-versa, eu acho) , abri meus olhos em um quarto imundo com um lindo objetivo no dia. Dois, na verdade. Alimentar-me e ver dinossauros oitentistas numa gravação. Oitentistas não pela idade dos vagabundos, mas em homenagem ao bom som da época.  Studio underground, Concha Acústica, eu acho e belo sistema de gravação. Tinha ouvido falar somente pela gravação da “Morra Tentando”, e percebido a qualidade do material produzido pelo estúdio.  Deu pra manjar tudo com detalhes, as gravações da Power of the Nóia nunca me levaram ao luxo de conhecer um ambiente cheio de requinte para gravações... haha
Felipe Verlaine

Às 14:00 hrs começou a sessão com o Sr. Felipe gravando alguns acordes de guitarra (e que pela primeira vez tinham um som limpinho, cheirando a post punk). Depois ainda consegui um flagra em Paul Vitor, guitarrista antisolo deixar seus rastros na gravação. Tenho aguardado a gravação desse material a anos. Há dez anos, parece ter se tornado uma questão de honra (ou vergonha) ver esses malditos tentando fazer a banda andar. Só não ficaram ricos pelo azar de terem nascido na década errada...
Paulo Vitor

O som me pareceu bastante evoluído, nem ouvi as distorções chiadas. Sujos ao vivo e limpinhos num estúdio, assim caminha a produção... Grandes letras de protesto associadas a um estilo meio perdido na modernidade. O Ep é constituído de quatro hits maturados há quase 10 anos, e que nunca, talvez, atinjam o amadurecimento, pois podem ter desaparecido esquecidos numa gaveta de um quarto qualquer, junto com alguns discos do The Jesus and Mary Chain, Bauhaus e Plebe Rude. A produção visual também vale um destaque, a capa expõe um céu triste daqueles que dão uma linda vontade de nos enchermos de comprimidos com uísque.

  Os anônimos, Felipe, Tiago e Paulo Vitor

Dor, protesto e Raiva! "Por trás do Céu" é um disco que considero “natimorto”, mas não pela receptividade do público, mas por sua própria natureza peculiar a ouvidos despreparados. Quarteto em acordes suaves, mostrando o quão sujos estão os sentimentos, e até onde vai a decadência metafísica, ou seja, música para amar ou odiar. Uma ótima pedida para refletir na escuridão sobre seus dias tão artificiais quanto sua alma!
 Felipe, Paulo Vitor, Erivaldo Mattüs e Tiago Anônimo

Esse é também o primeiro trabalho que sai com a marca do Coletivo Escarcéu e pode ser baixado pelo preço de um tweet ou uma compartilhada. Vale a pena!


Fotos de Ricardo Silva

JOHNNY WINTER

HIGHWAY 61 REVISITED

Apresentação do guitarrista para o programa do Jô Soares, tocando "Highway 61 revisited", em 23/05/2010.

terça-feira, 24 de abril de 2012

BAGDAD CAFÉ

Por Carina Rabelo

A partir das primeiras cenas do filme “Bagdá Café”, do diretor alemão Percy Adlon, o apreciador percebe que se encontra diante de uma obra incomum. Cortes secos, câmera inclinada, filtros cromáticos e personagens caricaturais são algumas das escolhas estilísticas do diretor para a composição de um dos filmes mais aplaudidos pela crítica mundial. No deserto do Mojave, próximo a Las Vegas, encontra-se o complexo de estabelecimentos “Bagdá”: um posto de gasolina, um pequeno hotel e um café. A música interpretada por Javetta Steele expressa a atmosfera do local e das pessoas que ali residem. “Há uma estrada que vai de Vegas para nenhum lugar, um lugar melhor do que onde você já esteve”.
“Bagdá Café” oferece uma narrativa rica nos programas do drama e da comédia, especialmente devido a peculiar atuação de CCH Pounder, que interpreta Brenda, uma mulher amargurada e áspera que sustenta, dois filhos, um neto, dirige um bar decrépito e ainda ‘suporta’ os lapsos de um marido acomodado. Brenda luta pela mínima sobrevivência da sua propriedade e já não acredita mais que sua vida pode romper as barreiras das dificuldades e dos dissabores. Os recursos cinematográficos de enquadramento são fundamentais para que o apreciador possa usufruir das emoções vivenciadas pelos personagens. O super-close e os planos de detalhe são intensamente utilizados, os planos são curtos e o texto ganha um ritmo harmônico, assim como as músicas tocadas por Sal Jr., filho de Brenda, um indivíduo que compõe o universo artístico do Café. A trilha sonora é basicamente composta pela melancólica “I´m calling you”, com algumas intervenções clássicas estilizadas pelo piano nervoso de Sal Jr. e pela fiel reprodução da clássica “Ave Maria”, de Gounod. A obra utiliza alguns elementos do programa musical da Broadway, em cenas que, esteticamente, se assemelham aos tradicionais musicais que apresentam mulheres vestidas de homem, com cartolas e bengalas...e com a participação da platéia do Café nas composições.
O Café na beira da estrada funciona como um ponto de interseção na vida de sete personagens: Brenda, a desleixada proprietária do Bagdá Café, uma filha espirituosa e vulgar, um filho músico incompreendido em sua arte, um pintor cenografista hollywoodiano (interpretado pelo memorável Jack Palance), uma mulher que faz tatuagens, um jovem aficionado por boomerangs e uma forasteira enigmática... Jasmin Muenchstettner (Marianne Sagebrecht), uma alemã observadora, impossível de ser decifrada num simples contato superficial. É preciso conhecê-la e compartilhar do seu café forte e amargo e das suas mágicas. Deixar-se embalar pela sua alma solidária e atenta. Trata-se de uma mulher singular, que consegue captar aquilo que há de melhor em cada indivíduo que compõe a família do Café Bagdá. Uma criatura que através da mágica executa a maior das peripécias humanas: desvelar o enigma das personagens que dão vida àquele insólito ambiente. A proprietária da simplória cafeteira que proporciona o impulso para as reviravoltas na vida daqueles que ali residem.
O conjunto “Bagdá” é um estabelecimento incomum. Um estranho café que, inicialmente quase nada tem para oferecer aos seus clientes. Os quartos do hotel são simples. O posto de gasolina parece mais seco do que os carros que, eventualmente, por ali passam. Não há lucro financeiro, apenas uma possibilidade de sobrevivência. O espaço subsiste à espera de um milagre, como um ato de mágica que poderia revolucionar aquele quadro caótico e estéril.

A fotografia assume um caráter do beleza perante a aridez. Um eterno crepúsculo celeste, contemplado por dois notáveis pontos de luz, resultado do reflexo dos espelhos sobre o centro solar. Há um calor confortável, sustentado pela utilização de filtros amarelos e avermelhados nas lentes das câmera. Algumas cenas em slow motion proporcionam a contemplação da riqueza fotográfica.
A Jasmin, pouco feminina do início do enredo esbarra-se com a Brenda “masculinizada” nos entulhos do Café Bagdá. Há uma clara transformação e feminilização na vida destas personagens, que ganhou corpo com a superação das adversidades através do trabalho e da convivência. A figura do homem torna-se pífia perante a auto-suficiência destas duas mulheres, que descobrem que as perdas podem oferecer a verdadeira liberdade para a fruição integral da vida, em toda a sua plenitude. 

VIVIENE II











































































Fonte: http://biertijd.com/index.php?itemid=34430

HORÓSCOPO

por Zé da Silva

Câncer

Não era mais uma agenda. Era um amontoado de papéis soltos, sujos, faltando pedaços, acomodados entre duas capas de plástico preto, carcomidas pelo tempo. Em todas as letras havia nomes e números. Mas o tempo e o manuseio tornaram indecifráveis a maioria deles. Um calendário identificava o ano em que ela começou a ser preenchida. Até ele retirá-la de dentro de uma baú guardado no sótão empoeirado da casa, passaram-se décadas. Não sabia porquê tinha feito aquilo. Isolara-se de tudo e de todos. Os motivos nem lembrava mais. Resolveu então tentar falar com alguma daquelas pessoas, descobrindo as combinações dos números. No único que acertou depois de meses recebeu a triste notícia de que a pessoa havia morrido havia 15 anos. Nos outros… nos outros começou a falar com estranhos. Para eles, também sem saber o motivo, contava a história da agenda. A maioria se encantou. E passaram a telefonar para ele. Um dia ele saiu e foi até a papelaria mais próxima comprar a edição do ano. De uma agenda. Anotou todos os nomes e telefones com caneta tinteiro. Porque lembrou do costume de assoprar para que a tinta secasse rapidamente. Encheu as páginas com os novos nomes. E teve certeza de que não mais esqueceria-os. Não tinha mais tempo de vida para tanto.

SOLDA

CÁUSTICO

Fonte: http://cartunistasolda.com.br/2012/04/23/mural-da-historia-250/

DIÁRIO DE UM JORNALISTA BÊBADO

10 sóbrios motivos para ver “Diário de um jornalista bêbado”

por Xico Sá*

Aprecio a lenda gringa Hunther S.Thompson (1937-2005) até a tampa da última garrafa de rum do Caribe.
É o cara do chamado jornalismo gonzo, gênero sem moderação, feito à custa de uma consciência adulterada –por álcool inclusive- e muito faro para a grande narrativa em primeira pessoa.
Em suma: tudo que o caretérrimo periodismo da taba tupi,que perdeu o tino de contar história, carece nesse momento para atrair o leitor.
Talvez por causa desse gosto exagerado pela lenda Thompson, tenho agora um olhar sóbrio, chato e ranzinza sobre o filme “The rum diary”, em cartaz  nos cinemas como “Diário de um jornalista bêbado”.
O filme do diretor Bruce Robinson é certinho demais para a gonzolândia mental de H.S.T. Veja trailer aqui. É paisagem caribenha e chistes de quem tomou apenas três doses. Ninguém beija o chão nem os pés das mulheres.
Mesmo considerando que se trata de uma ficção do velho repórter, cujo alterego é um jovem freelancer nômade batizado como Paul Kemp, a película vacila em não se parecer com o seu grande personagem real.
Mas meus jovens leitores, por favor, esqueçam tudo que escrevi, como diria um sóbrio ex-presidente que fumava mas não tragava, e vejam o filme.
Deixo-lhes aí, amigos, boas razões otimistas que valem o ingresso, noves fora o meu desânimo de abstêmio forçado até a essa hora:
  • 1) Depois do filme, você vai querer ler o livro. É sensacional. Tem uma edição de banca, da L&PM, com tradução que faria Thompson pagar todas para o Daniel Pellizari, o cara responsável pelo feito.
  • 2) Johnny Depp,na pele do homem-gonzo, está aquela coisa competente que fazem vocês, meninas, soltarem gritinhos.
  • 3) Gostosa e linda mesmo, porém, é a galeguinha Amber Heard, mulher de um jornalista chato, mas doida pelo bonitón da fita.
  • 4) A melhor das razões: você pode sair do cinema, jovem calouro, e desistir de ser jornalista. Já pensou que vantagem?
  • 5) A pior: você pode sair louco para encher a cara e contar histórias malucas. Aí não terá mais cura.
  • 6) Saiba, no entanto, que Hunther S.Thompson era um bêbado, mas nem todo bêbado é Hunther S.Thompson.
  • 7) Seja qual for a escolha, o amigo vai virar um leitor da obra gonza. Bela vantagem.
  • 8) Se você já estiver no ramo e for aventureiro, corre o risco de ser demitido de tanto encher o saco do chefe para emplacar uma matéria na linha do gonzo, o que é praticamente impossível.
  • 9) Você pode ver depois todos os filmes e livros da vida do cara e querer imitá-lo radicalmente. Cuidado. Thompson, viciado em armas de fogo, suicidou-se com um tiro no coco.
  • 10) Os idiotas da objetividade sempre vencem e têm melhores salários. É outra grande lição. Você desiste?

* Da Folha.com

Fonte: http://jornale.com.br/zebeto/2012/04/23/10-sobrios-motivos-para-ver-diario-de-um-jornalista-bebado/

domingo, 22 de abril de 2012

TERRA

Caetano Veloso

Quando eu me encontrava preso
Na cela de uma cadeia
Foi que vi pela primeira vez
As tais fotografias
Em que apareces inteira
Porém lá não estavas nua
E sim coberta de nuvens...

Terra! Terra!
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?...

Ninguém supõe a morena
Dentro da estrela azulada
Na vertigem do cinema
Mando um abraço prá ti
Pequenina como se eu fosse
O saudoso poeta
E fosses a Paraíba...

Terra! Terra!
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?...

Eu estou apaixonado
Por uma menina terra
Signo de elemento terra
Do mar se diz terra à vista
Terra para o pé firmeza
Terra para a mão carícia
Outros astros lhe são guia...

Terra! Terra!
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?...

Eu sou um leão de fogo
Sem ti me consumiria
A mim mesmo eternamente
E de nada valeria
Acontecer de eu ser gente
E gente é outra alegria
Diferente das estrelas...

Terra! Terra!
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?...

De onde nem tempo, nem espaço
Que a força mãe dê coragem
Prá gente te dar carinho
Durante toda a viagem
Que realizas do nada
Através do qual carregas
O nome da tua carne...

Terra! Terra!
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?
 
Na sacada dos sobrados
Da velha são Salvador
Há lembranças de donzelas
Do tempo do Imperador
Tudo, tudo na Bahia
Faz a gente querer bem
A Bahia tem um jeito...

Terra! Terra!
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?
Terra!

sábado, 21 de abril de 2012

TIRADENTES, 220 ANOS

Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes  (Fazenda do Pombal, batizado em 12 de novembro de 1746 — Rio de Janeiro, 21 de abril de 1792)

Pintura de Pedro Américo, 1893

OUTRA TRISTEZA

Por Ticiana Vasconcelos Silva


Eu sou triste por ter saudades. E só.

Abandono


Na minha casa não há móveis nem paredes

Não há redes e suas árvores de dormir
Não há copos de cingir sedes
Não há colheres de olhar mundos
Não há pães de dividir amor
Não há espelhos de revelações

Na minha casa há apenas um chão

Batido, empoeirado, sem margens
O terreno baldio da crueldade
Já não mais se escora na linha do tempo
Eu apenas vivo nesta casa
E finjo que o teto é o céu.


Fonte: http://paradoxodoser.blogspot.com.br/2012/04/tristeza.html

FOTOS

DE UM MERGULHO  

 


Fotos de Ricardo Silva

domingo, 15 de abril de 2012

SOLDA

CÁUSTICO

Fonte: http://cartunistasolda.com.br/2012/04/12/mural-da-historia-241/

KLÉBI NORI

SALVE LINDA CANÇÃO SEM ESPERANÇA



De Luiz Melodia 

Entre canções que ouvi
Entre notícias que li
Entre risadas fiquei
Na claridade esperei

Você não veio
Medo ou receio

Trajes bonitos, modernos
Um colorido com vida
O afagar de outro humano
Eu sei, bem sei, fui traído

Mas tudo é beleza
Mais vale a franqueza

Eu comunico, não peço
Espero que neste universo
Alguém lhe queira como eu
Faço de mim o que posso
E de vocês qualquer troço
Pra resolver quando se enganam

RAT RACE

BOB MARLEY


sábado, 14 de abril de 2012

SANTOS F. C.


O SANTOS QUE O ZÉ LUIS ME DEU

Por Roberto José da Silva

Nunca me levou a campo, nunca tentou fazer minha cabeça, nunca vestiu uma camisa do time, nunca falou do seu amor por ele. Não precisava. Dificilmente deixava a couraça expandir sentimentos, e a chave dela eu só consegui achar muitos anos mais tarde para descobrir um menino sofrido cujo rosto que parecia esculpido a talhadeira só não metia medo porque os olhos eram de um azul tão claro e cristalino que demonstrava quem estava ali dentro. Mas havia um momento naquela vida de operário, que saía todo dia com a enorme pasta com a marmita de alumínio fechada hermeticamente fechada com elástico, e voltava no fim da tarde sem demonstrar um pingo de sofrimento, sem reclamar de nada, havia um momento em que era a alma que tomava conta e envolvia aquele corpo magro e gigante para um menino que olhava, olhava, olhava e jamais esqueceu a cena. Na meia-água nos fundos de um quintal de uma vila no subúrbio paulistano o ritual consistia em puxar uma cadeira para uma mesinha pequena de madeira onde, como num altar, o rádio sempre sintonizado na Bandeirantes era ligado nas tardes de domingo. Ele se sentava de lado, para ouvir com o lado direito, o antebraço todo apoiado, a mão direita com os dedos longos empalmando a cabeça e, dependendo do lance narrado por Pedro Luis ou Edson Leite, ela, a mão, deslizava até a nuca, como se quisesse ajeitar os cabelos. Mas o que ficou marcado para sempre na retina da memória era o gesto que simbolizava a partida difícil, a decisão de um título. Ele cultivava um bigode cujos pelos, ao contrário do que ele alisava na nuca, eram grossos. E nesses momentos de tensão máxima, ampliada pela descrição empolgante dos lances, parecia que ele ia arrancá-los um a um com a pinça formada pelo indicador e polegar. Eu olhava, escutava alguns lances, dava uma volta e sabia que aquele time pelo qual ele torcia era meu também, porque era assim – e pronto. Não lembro de tê-lo visto na explosão do gol, da conquista, e isso aconteceu demais naquele final de anos 50 e todo a década seguinte – e aí, penso hoje, aí invertia tudo, como numa mágica que fazia com que ele não demonstrasse tudo o que sentia. Muitos anos mais tarde, quando ele voltou para a sua Palmeira dos Índios, eu sintetizei de forma simplista aquela paixão: todo pau-de-arara que desceu para São Paulo naqueles anos do nascimento do Rei do Futebol naquele time mágico não tinha como torcer para outro time. Pode ser, mas antes ele morou no Rio de Janeiro e havia outro time mágico, o Botafogo de Nilton Santos, Didi e Garrincha – e ele nunca nem se dignou a falar dele, mesmo porque, antes do Palmeiras de Ademir da Guia, foi o grande rival do Santos. Eu poderia ter visto aquele time jogar muitas e muitas vezes, se meu pai Zé Luis fosse torcedor de ir a campo. Mas ele era cismado. Gostava de acompanhar pela magia das ondas médias, mas estava ao meu lado, na sala de um vizinho, o dentista da vila, o baiano Dr. Milton, também santista doente, quando o Santos sem Pelé, mas com Pepe infernal na noite de chuva do Maracanã, ganhou a primeira partida contra o Milan, depois consolidada por conta da loucura e coragem de Almir Pernambuquinho. Sim, lembro agora, quando o ponta esquerda soltou a bomba do meio da rua, furando tudo, ele abriu um sorriso diante da tela de tv que transmitia em preto e branco, direto do Rio, e um despertador que estava na mesa de centro para marcar o tempo tinha ido parar no teto na explosão de alegria do dono da casa. Com ele também vi no Cine Dom Bosco, que ficava atrás de casa, o filme “Isto é Pelé” – e aquela foi a única vez que fomos juntos ao cinema. Talvez por tudo isso, muito tempo depois, quando descobri, através do meu rito de passagem de dor, porque ele era tão fechado, e isso nos aproximou porque eu lhe dei o primeiro beijo, retribuído três anos depois em nova visita ao Nordeste, talvez por isso eu nunca tenha lhe falado que tinha descoberto o time do meu coração, com outras cores, em outro estádio. Claro que ele iria compreender, porque essas coisas não se explicam, porque ele sempre soube que o amor que ele passou pelo Santos permaneceria. Às vezes penso que o fato de ter trabalhado com futebol mais de 20 anos tem a ver com ele. E como eu era muito parecido, agora nem lembro mais se lhe contei que estive a trabalho na Vila Belmiro logo no início da carreira, que entrei naquele vestiário, que vi o armário do Rei e imaginei aqueles times ali dentro. Alguns anos antes de ele partir, lhe dei de presente o boné do Peixe, ele que gostava tanto de proteger a cabeça com cabelos ralos do sol inclemente daquelas bandas. Ele deu aquele sorriso como no jogo contra o Milan. Talvez tenha acontecido a mesma coisa quando meu irmão Ricardo, torce para o São Paulo, lhe mostrou algumas fotos minhas de um encontro com Pelé aqui em Curitiba. De vez em quando eu coloco o boné na cabeça, assim, naqueles momentos em que é preciso algo maior que o racional para se levar a vida. Nesses momentos eu entendo o que passei anos se entender: como alguém podia sofrer torcendo para um time como aquele. Entendo que não é preciso entender. É o futebol. E eu agradeço ter herdado o Santos de meu pai.

ROBERT DOISNEAU, 100 ANOS

Robert Doisneau (14 de abril de 1912 - 1º de abril de 1994) foi um famoso fotógrafo nascido na cidade de Gentilly, Val-de-Marne, na França. Era um apaixonado por fotografias de rua, registrando a vida social das pessoas que viviam em Paris e em seus arredores.
Doisneau foi um dos fotógrafos mais populares da França. Era conhecido por sua modéstia e imagens irônicas, misturando as classes sociais das ruas e cafés de Paris. Influenciado pela obra Atget, de Kertész e Cartier Bresson, Doisneau apresentou em mais de vinte livros uma visão encantadora da fragilidade humana e da vida como uma série de momentos calmos e incongruentes.






"As maravilhas da vida cotidiana são tão emocionantes. Nenhum diretor de filmes pode organizar o inesperado que você encontra na rua". Robert Doisneau.

Fonte: Wikipédia