terça-feira, 24 de abril de 2012

HORÓSCOPO

por Zé da Silva

Câncer

Não era mais uma agenda. Era um amontoado de papéis soltos, sujos, faltando pedaços, acomodados entre duas capas de plástico preto, carcomidas pelo tempo. Em todas as letras havia nomes e números. Mas o tempo e o manuseio tornaram indecifráveis a maioria deles. Um calendário identificava o ano em que ela começou a ser preenchida. Até ele retirá-la de dentro de uma baú guardado no sótão empoeirado da casa, passaram-se décadas. Não sabia porquê tinha feito aquilo. Isolara-se de tudo e de todos. Os motivos nem lembrava mais. Resolveu então tentar falar com alguma daquelas pessoas, descobrindo as combinações dos números. No único que acertou depois de meses recebeu a triste notícia de que a pessoa havia morrido havia 15 anos. Nos outros… nos outros começou a falar com estranhos. Para eles, também sem saber o motivo, contava a história da agenda. A maioria se encantou. E passaram a telefonar para ele. Um dia ele saiu e foi até a papelaria mais próxima comprar a edição do ano. De uma agenda. Anotou todos os nomes e telefones com caneta tinteiro. Porque lembrou do costume de assoprar para que a tinta secasse rapidamente. Encheu as páginas com os novos nomes. E teve certeza de que não mais esqueceria-os. Não tinha mais tempo de vida para tanto.

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