por Zé da Silva
Sagitário
Sobrevivia de fotos antigas. Não, não comercializava, nem tinha
coleção. Procurava por aí, em museus, revistas e livros de sebos.
Gostava de viver naqueles locais, imaginar como se chamavam e o que
faziam as pessoas retratadas, principalmente a de flagrantes. Ouvia o
som dos carros, as conversas, penetrava nos edifícios, percorria
corredores, comia nos restaurantes, dançava nas boates, mergulhava e
nadava em rios limpos que cortavam cidades. Morava num quarto de fundos
que a família reservou e o colocou lá porque achavam que era esquisito
demais. Nunca trabalhou porque… não tinha tempo. Seu campo de ação se
resumia à cidade onde nasceu. Emoções não faltavam. Subiu a serra do mar
no lombo de burro, recepcionou imigrantes, participou da construção dos
primeiros edifícios. Às vezes saía para procurar resquícios do seu
mundo particular. Ainda encontrava alguma coisa. Um dia telefonaram para
sua casa. Foram buscá-lo, catatônico, na porta giratória de um banco
inglês que se instalara no prédio centenário. Se recusava a sair.
Depois, passou meses repetindo “digite a sua senha”. Quando parou,
queimou todo o arquivo. Agora percorre a cidade atrás de bandas de
garagem. A família acha que ele está melhorando.
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