PEQUENOS ASSASSINATOS, de ALAN ARKIN
Cena inicial - um fotógrafo, chamado Alfred Chamberlain, tirando fotos aleatórias em uma rua qualquer de Nova Iorque. Ele acaba chamando a atenção da gangue da região, que começa a espancá-lo. Apático, Chamberlain não reage.
Mas uma moça que passava por ali, Patsy Newqvist, se indigna e resolve intervir. Os marginais fogem. Surpreendentemente, Alfred briga é com a sua defensora, pois ele não desejava socorro algum. Apesar desse estranhamento inicial, os dois resolvem manter o contato. Tempos depois, o fotógrafo confessa a Patsy que não consegue mais gostar de nada. E ela, mulher apaixonada pela vida, resolve ajudá-lo a se interessar pelo mundo novamente. Assim, os dois acabam namorando. Casando. E...
Esta é a premissa de “Pequenos Assassinatos”, um tesouro do cinema estadunidense que precisa ser (re) descoberto.
Dirigido por Alan Arkin, o longa-metragem em questão foi lançado em 1971, baseado na peça de mesmo nome do cartunista pop Jules Feiffer. É interessante contar que o dito espetáculo fracassou na sua estréia em NYC: a primeira montagem, de 1967, ficou apenas uma semana em cartaz. Contudo, a produção teatral obteve sucesso na Inglaterra e, quando retornou aos palcos da América, acabou sendo adaptada para os cinemas. No elenco do filme temos Eliott Gould e Márcia Rodd como o casal principal. Nomes como o próprio Alan Arkin, Lou Jacobi e Donald Sutherland completam o cast.
Por isso, não se engane, não estamos falando sobre um romance. Há o envolvimento entre os dois protagonistas, mas o final da história de ambos não é feliz. Nem estamos diante de uma comédia escrachada. É inegável que o primeiro ato da produção é carregado de humor. Uma graça que explora o caos do cotidiano, que segue a máxima de que, de perto, ninguém é normal. Entretanto, muito habilmente, há uma guinada e o final da obra ganha cores sombrias, com críticas escancaradas à sociedade ocidental pós-moderna e questionamentos sobre a nossa existência gritando na tela. A família feliz/histérica atirando pela janela, um quadro quase kafkiano, incomoda e nos faz pensar para onde estamos caminhando.
Nesse sentido, Alan Arkin consegue, assim como a sua heroína Patsy, acabar com a apatia reinante, mesmo que brevemente. Ele nos faz, sem ilusão alguma, refletir sobre o que estamos nos tornando, sobre o valor das nossas vidas – existem mesmo assassinatos sem importância?
Para concluir, é preciso ressaltar que “Pequenos Assassinatos” é um produto de seu tempo. Uma arte quase apocalíptica, nascida em meio à Guerra do Vietnã, durante a desilusão do movimento hippie e a ascensão de um conservadorismo que tinha em Richard Nixon o seu principal rosto. Contudo, algumas das problemáticas levantadas no filme continuam relevantes ainda no século XXI - o fetiche por armas de fogo e a banalização da violência, o valor dos sentimentos em uma sociedade cada vez mais conflituosa, sobre como precisamos reagir frente às adversidades, quais são os rumos da arte (Alfred, por não desejar mais retratar seres humanos, começou a fotografar excrementos de cachorros. E, na história, ganha prêmios por isso)... Ou seja, a profundidade da película não se esgota nesta resenha. Ela é uma bela pérola do fenômeno histórico que foi a contracultura dos anos 60 e 70.
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