quinta-feira, 31 de dezembro de 2015
POR MIM
por Álvares de Azevedo
Teus negros olhos uma vez fitando
Teus negros olhos uma vez fitando
Senti que luz mais branda os acendia,
Pálida de langor, eu vi, te olhando,
Mulher do meu amor, meu serafim,
Esse amor que em teus olhos refletia...
Talvez! - era por mim?
Pendeste, suspirando, a face pura,
Morreu nos lábios teus um ai perdido...
Tão ébrio de paixão e de ventura!
Mulher de meu amor, meu serafim,
Por quem era o suspiro amortecido?
Suspiravas por mim?
... Mas... eu sei!... ai de mim? Eu vi na dança
Um olhar que em teus olhos se fitava...
Ouvi outro suspiro... d´esperança!
Mulher do meu amor, meu serafim,
Teu olhar, teu suspiro que matava...
Oh! não eram por mim
A OBSESSÃO DO SANGUE
por Augusto dos Anjos
Acordou, vendo sangue… – Horrível! O osso
Frontal em fogo… Ia talvez morrer,
Disse. Olhou-se no espelho. Era tão moço,
Ah! certamente não podia ser!
Levantou-se. E eis que viu, antes do almoço,
Na mão dos açougueiros, a escorrer
Fita rubra de sangue muito grosso,
A carne que ele havia de comer!
No inferno da visão alucinada,
Viu montanhas de sangue enchendo a estrada,
Viu vísceras vermelhas pelo chão …
E amou, com um berro bárbaro de gozo,
O monocromatismo monstruoso
Daquela universal vermelhidão!
FONTE: http://www.poesiaspoemaseversos.com.br/augusto-dos-anjos-poemas/#.VoUr4_krKUk
terça-feira, 29 de dezembro de 2015
segunda-feira, 28 de dezembro de 2015
CABEÇA DE PEDRA
Bem no fundo
de Paulo Leminski
No fundo, no fundo,
bem lá no fundo,
a gente gostaria
de ver nossos problemas
resolvidos por decreto
a partir desta data,
aquela mágoa sem remédio
é considerada nula
e sobre ela — silêncio perpétuo
extinto por lei todo o remorso,
maldito seja quem olhar pra trás,
lá pra trás não há nada,
e nada mais
mas problemas não se resolvem,
problemas têm família grande,
e aos domingos
saem todos a passear
o problema, sua senhora
e outros pequenos probleminhas.
CABEÇA DE PEDRA:http://cabecadepedra1.blogspot.com.br/
bem lá no fundo,
a gente gostaria
de ver nossos problemas
resolvidos por decreto
a partir desta data,
aquela mágoa sem remédio
é considerada nula
e sobre ela — silêncio perpétuo
extinto por lei todo o remorso,
maldito seja quem olhar pra trás,
lá pra trás não há nada,
e nada mais
mas problemas não se resolvem,
problemas têm família grande,
e aos domingos
saem todos a passear
o problema, sua senhora
e outros pequenos probleminhas.
domingo, 27 de dezembro de 2015
CANTO A MIM MESMO
de Walt Whitman
Estão todas as verdades
À espera em todas as coisas:
Não apressam o próprio nascimento
Nem a ele se opõem;
Não carecem do fórceps do obstetra,
E para mim a menos significante
É grande como todas.
Que pode haver de maior ou menor do que um toque?
Sermões e lógicas jamais convencem;
O peso da noite cala bem mais
Fundo em minha alma.
Só o que se prova a qualquer homem ou mulher,
É o que é;
Só o que ninguém pode negar,
É o que é.
Um minuto e uma gota de mim
Tranquilizam o meu cérebro:
Eu acredito que torrões de barro
Podem vir a ser lâmpadas e amantes;
Que um manual de manuais é a carne
De um homem ou de uma mulher;
E que num ápice ou numa flor
Está o sentimento de um pelo outro,
E hão de ramificar-se ao infinito,
A começar daí,
Até que essa lição venha a ser de todos,
E um e todos possam nos deleitar
E nós a eles.
quarta-feira, 23 de dezembro de 2015
ANDREA AMORIM
A cantora e compositora Andrea Amorim, nascida em Garanhuns interior de Pernambuco, vem trilhando seu caminho há quase 15 anos. Gravou cinco CD’ s independentes no estilo rock pop, e, na maioria dos festivais de música que participou no interior de seu Estado, arrebatou quase todos os prêmios, dentre eles, o primeiro lugar geral no Festival de Música e Arte de Garanhuns, que, na época, era o evento com a maior premiação do Brasil, nesse segmento.
Logo no início de 2009, foi morar em São Paulo, para dar continuidade à sua carreira. Em maio desse ano, um vídeo seu foi indicado por Nil Bernardes para o quadro Garagem do Faustão, da TV Globo. Logo em seguida, foi entrevistada por Jô Soares, na mesma emissora.
Em 2011, Andrea mudou-se para o Rio de Janeiro e firmou parceria com a Gravadora Albatroz, de Roberto Menescal, quando gravou um disco autoral, gravado também em inglês, japonês e espanhol, para o mercado internacional. Nesse disco, no meio de suas composições, Andrea gravou uma música de Marcos Valle, onde divide vocais com Lenine. Logo após a gravação desse CD, ela iniciou a sua carreira internacional. Viajou duas vezes para os Estados Unidos, onde foi receber o Prêmio Rising Star, conferido aos novos talentos brasileiros, e, em outra oportunidade, cantou ao lado de Marcos Valle, no evento Press Award. Em setembro, viajou para o Japão, onde se apresentou nos eventos Brazilian Day e Press Award. Em dezembro, a convite de um produtor japonês, retornou ao Japão, onde fez uma turnê de 21 apresentações por todo o país, durante 30 dias.
Quando voltou do Japão, depois de ter conhecido de perto o amor que os japoneses têm pela bossa nova e por Roberto Menescal e, por sugestão de um produtor japonês, Andrea resolveu homenagear o seu padrinho, que estava completando 75 anos de vida, gravando o CD Bossa de Alma Nova. Menescal abraçou inteiramente a ideia e não somente produziu, como participou de todo o disco. Foi assim que a ex-roqueira pernambucana tornou-se a mais nova parceira de Menescal! Ela foge do estereótipo das cantoras bossanovistas em sua interpretação e aparência, pois tem o corpo bastante tatuado, é a primeira cantora tatuada da Bossa Nova. No dia de aniversário de 75 anos de Menescal, Andrea tatuou o nome do seu novo parceiro em japonês, no antebraço esquerdo.
Atualmente, eles fazem shows e composições juntos. Andrea revela que primeiro se apaixonou por Menescal, depois pela bossa nova. “Roberto Menescal me lapidou e a bossa nova me ensinou a cantar”, afirma a cantora.
Em março, Menescal e Andrea se apresentaram no Programa Encontro, da Fátima Bernardes, e, em junho foi ao ar o Som Brasil Bossa Nova, onde Andrea participou com Menescal da faixa Rio, que abriu o programa. mais recentemente, foram destaque no Programa Todo Seu, apresentado por Ronnie Von, na TV Gazeta.
Em outubro passado, gravaram o DVD Bossa de Alma Nova, e uma nova turnê está sendo montada para 2014, quando vão percorrer alguns países do mundo. Além do Projeto Bossa de Alma Nova, Andrea tem programado para 2014, um CD de rock, com músicas autorias e inéditas.
O CD Bossa de Alma Nova está entre os cem melhores discos de Música Brasileira já lançados no Japão, registrado no livro “A verdadeira história da Bossa Nova”, do japonês Willie Whopper.
*FOTOS / RICARDO SILVA
Natal Luz, Garanhuns, domingo, 20 de dezembro de 2015.
ANDREA AMORIM: http://www.andreaamorim.com.br/
ANGÚSTIA
de José Maria Correia
Tenho medo desse silêncio
Que antecede os sinos
E os cantos dos galos.
Há muito essa angústia
Me apavora entre paredes
De meu quarto de criança.
Medo das perda inevitáveis,
As que sempre chegam
Sem espera, ao Ano Novo
E nos levam para sempre
Os amigos mais antigos.
E os pais que tanto amamos,
Os romances e a juventude.
Nessa época dramática
Entre o brilho das luzes
Tenho esse medo comum,
O que vejo em arredios olhos
Dos cães de rua perdidos
Entre esquinas sombrias
De pedintes esquálidos.
É essa angústia profunda
Atávica e de perdição
Que me faz temer trovões
E tigres de dentes de sabre
E fugir das ceias natalinas
Da euforia dos presentes
E das multidões de shoppings.
Medo que empacotem em saldo
Também a minha alma em desuso
Que de sensível e frágil,
Entre outras tantas perdidas,
Possa vir a morrer distraída,
De desencanto, amor e delicadeza.
Que antecede os sinos
E os cantos dos galos.
Há muito essa angústia
Me apavora entre paredes
De meu quarto de criança.
Medo das perda inevitáveis,
As que sempre chegam
Sem espera, ao Ano Novo
E nos levam para sempre
Os amigos mais antigos.
E os pais que tanto amamos,
Os romances e a juventude.
Nessa época dramática
Entre o brilho das luzes
Tenho esse medo comum,
O que vejo em arredios olhos
Dos cães de rua perdidos
Entre esquinas sombrias
De pedintes esquálidos.
É essa angústia profunda
Atávica e de perdição
Que me faz temer trovões
E tigres de dentes de sabre
E fugir das ceias natalinas
Da euforia dos presentes
E das multidões de shoppings.
Medo que empacotem em saldo
Também a minha alma em desuso
Que de sensível e frágil,
Entre outras tantas perdidas,
Possa vir a morrer distraída,
De desencanto, amor e delicadeza.
terça-feira, 22 de dezembro de 2015
sexta-feira, 18 de dezembro de 2015
KEITH RICHARDS' 72
quinta-feira, 17 de dezembro de 2015
VLADÍMIR MAIAKÓVSKI
O bilhete do suicida
"A todos
"De minha morte não acusem ninguém, por favor, não façam fofocas. O defunto odiava isso.
"Mãe, irmãs e companheiros, me desculpem, este não é o melhor método (não recomendo a ninguém), mas não tenho saída.
"Lília, ame-me.
"Ao governo: minha família são Lília Brik, minha mãe, minhas irmãs e Verônica Vitoldovna Polonskaia.
"Caso torne a vida delas suportável, obrigado.
"Os poemas inacabados entreguem aos Brik, eles saberão o que fazer.
'Como dizem:
caso encerrado,
O barco do amor
espatifou-se na rotina.
Acertei as contas com a vida
inútil a lista
de dores,
desgraças
e mágoas mútuas.'
Felicidade para quem fica.
© Copyright 2015 — Revista Bula — Literatura e Jornalismo Cultural — seutexto@uol.com.br
"A todos
"De minha morte não acusem ninguém, por favor, não façam fofocas. O defunto odiava isso.
"Mãe, irmãs e companheiros, me desculpem, este não é o melhor método (não recomendo a ninguém), mas não tenho saída.
"Lília, ame-me.
"Ao governo: minha família são Lília Brik, minha mãe, minhas irmãs e Verônica Vitoldovna Polonskaia.
"Caso torne a vida delas suportável, obrigado.
"Os poemas inacabados entreguem aos Brik, eles saberão o que fazer.
'Como dizem:
caso encerrado,
O barco do amor
espatifou-se na rotina.
Acertei as contas com a vida
inútil a lista
de dores,
desgraças
e mágoas mútuas.'
Felicidade para quem fica.
*Vladímir Maiakóvski matou-se no dia 14 de abril de 1930 e deixou um bilhete.
quarta-feira, 16 de dezembro de 2015
CABEÇA DE PEDRA
Tralha
Malandro forgô pra cima de mim. Fiquei na minha porque nunca fui de treta – mas isso incentivou o nóia. Enquanto ele falava merda, fiquei quieto, parado, ali. Conhecia o gajo, mas nunca dei chance dele chegar perto, seja para uma parada arriscada, uma rodada de cerveja ou uns tiros de farinha no prato aquecido. Aí ele cometeu o erro de encostar a mão no meu peito. O relê colou na hora, o bisturi saiu de dentro da manga e o corte na carótida foi rápido e cirúrgico. Saí tranquilo enquanto ouvia a gritaria do acode, como se isso adiantasse. Ninguém veio atrás de mim, porque sabem onde mora o perigo. Os amigos dele talvez um dia arrisquem algo, mas só se me pegarem desprevenido – o que é muito raro. Restava o mocó, o meu. Mais difícil de achar do que a caverna do Batman. Nem os ratos chegaram lá. Ali guardo tudo, inclusive um diário onde escrevo desde o dia em que apaguei o primeiro, aos 10 anos de idade. A casa que me protege é de família tradicional e sossegada. Não estou no porão ou sótão, apesar de ser louquinho. Sou o lado de lá de uma estante abarrotada de livros. Entro por uma outra casa, do lado oposto da rua. Chego ao meu muquifo por um túnel que tem as marcas de uma fuga antiga de delegacia. Comigo, só tralha, tralhafernalha. Eu gosto. Me basta.
CABEÇA DE PEDRA:http://cabecadepedra1.blogspot.com.br/
Malandro forgô pra cima de mim. Fiquei na minha porque nunca fui de treta – mas isso incentivou o nóia. Enquanto ele falava merda, fiquei quieto, parado, ali. Conhecia o gajo, mas nunca dei chance dele chegar perto, seja para uma parada arriscada, uma rodada de cerveja ou uns tiros de farinha no prato aquecido. Aí ele cometeu o erro de encostar a mão no meu peito. O relê colou na hora, o bisturi saiu de dentro da manga e o corte na carótida foi rápido e cirúrgico. Saí tranquilo enquanto ouvia a gritaria do acode, como se isso adiantasse. Ninguém veio atrás de mim, porque sabem onde mora o perigo. Os amigos dele talvez um dia arrisquem algo, mas só se me pegarem desprevenido – o que é muito raro. Restava o mocó, o meu. Mais difícil de achar do que a caverna do Batman. Nem os ratos chegaram lá. Ali guardo tudo, inclusive um diário onde escrevo desde o dia em que apaguei o primeiro, aos 10 anos de idade. A casa que me protege é de família tradicional e sossegada. Não estou no porão ou sótão, apesar de ser louquinho. Sou o lado de lá de uma estante abarrotada de livros. Entro por uma outra casa, do lado oposto da rua. Chego ao meu muquifo por um túnel que tem as marcas de uma fuga antiga de delegacia. Comigo, só tralha, tralhafernalha. Eu gosto. Me basta.
CABEÇA DE PEDRA:http://cabecadepedra1.blogspot.com.br/
terça-feira, 15 de dezembro de 2015
A FLECHA DO TEMPO
por Yuri Vasconcelos Silva
Tic Tac. Tic Tac. Este som aterroriza o capitão. Para as crianças que ouvem a velha história, Gancho teme os toques do relógio porque significa que seu algoz, um crocodilo gigante que lhe arrancou o braço, está por perto desejando todo o resto. Não se trata de um reptiliano bomba. Quando abocanhou o braço do capitão, levou também seu relógio, que ainda funciona no interior da fera.
Os adultos, porém, encaram a alegoria do Capitão Gancho através de uma perspectiva bem diferente. Todos são como o Sr. Gancho. Em algum momento percebe-se a inevitabilidade da morte e do não existir. Ter a consciência da própria finitude é uma das causas capitais de boa parte do sofrimento humano. Ao analisar os fatores que encerram a existência das coisas como hoje são, da vida humana a uma taça de vinho que se estilhaça ao cair no chão, o tempo parece ser não apenas o principal elemento, mas também o mentor e culpado pelo crime do fim de tudo. É o tempo que persegue o Capitão Gancho que, não por acaso, inveja Peter Pan, o garoto que escapou do processo de envelhecer, adoecer e morrer. Surge, portanto, uma pergunta simples, mas desconcertante, típica de uma criança. O que é o tempo?
Quando físicos afirmam que se trata da 4a dimensão, é fácil compreender com um exemplo clássico. As primeiras três dimensões são espaciais. Altura, largura e profundidade definem o mundo tridimensional que todos vivenciam. Se alguém marca um encontro com outra pessoa, elas precisarão ter, no mínimo, os dados das dimensões espaciais e a dimensão temporal. Assim, um sujeito afirma que estará na Avenida Xis esquina com a Rua Ypsilon, na altura do 7º andar de um prédio, às 9 horas. Se não houvesse a definição do horário, seria impossível localizar esta pessoa. O que é um mistério para a ciência atual é o porquê de o tempo ter apenas um sentido, correndo apenas para o futuro. Por que os eventos não ocorrem de trás para frente? Na realidade, segundo as leis da física e suas equações, não há nada que impeça que o tempo retroceda. No entanto, a experiência cotidiana sugere fortemente que os eventos se desenrolam em apenas um sentido. A equação que traduz esta realidade emerge da 2ª Lei da Termodinâmica e trata da Geração de Entropia.
É a constatação de que todo o universo caminha de um grau de ordem para a desordem. Quanto mais caótico o sistema, maior sua Entropia. Um ovo inteiro representa um belo grau de ordem e consistência, até mesmo estético. Quando quebrado, sua clara e gema mexidos em uma frigideira são misturados e aquecidos até virar uma bagunça de maior Entropia. Ovos mexidos. O contrário não ocorre porque existe apenas uma maneira do ovo estar naquela condição específica, inteiro e intacto, contra uma infinidade de possibilidades dele estar espatifado e suas partes misturadas ou espalhadas por aí. E esta é a direção que parece ser natural no universo. Sempre aumentando o grau de desorganização e diminuindo a complexidade. O momento de maior organização possível nesta história toda foi o instante antecedente ao Big Bang. Desde então, a Entropia apenas aumenta. Esta observação nos dá a sensação do tempo passar, criando a percepção que se tem do passado, presente e futuro, nesta ordem específica.
A Entropia implica que não há escapatória. O corpo humano, as ideias, a civilização e o planeta estão sujeitos ao fato de que seus componentes irão se desestabilizar, se separar e esfriar. Mesmo com todos os esforços para prolongar a vida, os homens nunca chegarão a ser imortais. O próprio universo vai se expandir até se tornar um lugar frio, escuro e solitário. Não se trata de pessimismo, apenas experiência e observação dos fatos.
Por outro lado, literalmente, a Entropia pode ser a pedra angular da viagem no tempo. Se ela determina a Flecha do Tempo, o sentido único de avanço dos eventos em direção ao aumento da desordem, a observação e estudo deste processo pode nos guiar ao completo entendimento de causa e efeito e, talvez, possibilitar a inversão do fluxo temporal. Caminhar para o outro sentido. Não é necessário que pessoas ou objetos se transportem para o passado. Bastaria enviar informações através do tempo para consequências e resultados inimagináveis, sejam eles positivos ou negativos.
Entre os dois personagens da fábula infantil, estamos mais para Capitão Gancho do que para Peter Pan, habitante daquela terra onde o tempo não existe. Mas a imaginação humana, sem dúvida, habita a Terra do Nunca.
* Revisão de Professor George Stanescu, doutor em engenharia mecânica e termodinâmica
segunda-feira, 14 de dezembro de 2015
domingo, 13 de dezembro de 2015
HORÓSCOPO
Entrou na repartição e teve um siricutico. Deu um grito tão forte que paralisou todos aqueles que encontrava todos os dias no mesmo local, horário, cadeira e etc. há duas décadas. Paralisou porque se assustaram. Nunca tinham ouvido direito a voz dele, um retraído de voz quase inaudível. Passado o susto, foram acudi-lo. Ele gritou mais alto e disse que queria falar com todos ao mesmo tempo. Estava indo embora. Não imaginava que um dia aquilo ia acontecer, mas foi como o anjo dos infernos tivesse entrado na sua cabeça e arregalado os olhos da mente. O que estavam fazendo todos ali? Ganhavam mal e porcamente, não faziam praticamente nada, reclamavam da vida e do governo, iam pra casa e, no dia seguinte, tudo de novo, sempre na esperança de um dia a aposentadoria chegar. Disse então que todas as bundas ali tinham aquela identificação dos móveis oficiais - ovaladas, verdes no centro e com um número. Chutou tudo para o alto, garantiu. Não queria aposentadoria, nada – apenas sumir dali para sempre. Perguntou se alguém o seguiria. Ninguém abriu a boca. Ele virou as costas e foi embora. Os outros voltaram silenciosos para suas respectivas cadeiras e mesas. No dia seguinte, no início de mais um expediente, chamaram o chefe e disseram que o fulano tinha pirado e que era preciso interná-lo. Foi o que fizeram – para o bem do serviço público.
sábado, 12 de dezembro de 2015
sexta-feira, 11 de dezembro de 2015
FRIEDRICH NIETZSCHE
“Quanto mais me elevo, menor fico aos olhos de quem não sabe voar.”
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“Deus está morto: mas, considerando o estado em que se encontra a espécie humana, talvez ainda por um milénio existirão grutas em que se mostrará a sua sombra.”
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“Minha solidão não tem nada a ver com a presença ou ausência de pessoas... Detesto quem me rouba a solidão, sem em troca me oferecer verdadeiramente companhia.”
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quinta-feira, 10 de dezembro de 2015
FERNANDO PESSOA
Tudo o que já não é,
A dor que já me não dói,
A antiga e errônea fé,
O ontem que dor deixou,
O que deixou alegria
Só porque foi, e voou
E hoje é já outro dia.
terça-feira, 8 de dezembro de 2015
segunda-feira, 7 de dezembro de 2015
sábado, 5 de dezembro de 2015
A VIDA COMO ELA É
Por Ricardo Cota
NOIR TROPICAL
Há muito Nelson Rodrigues corre o risco de se transformar naquilo que, em vida, ele mais criticou: uma unanimidade. A tal ponto que, dia desses, ao sair de uma sessão de Fale com Ela, o crítico foi surpreendido pelo comentário deslumbrado de um espectador que acabara de babar na gravata: “Almodóvar é o Nelson Rodrigues espanhol!”. Será?
Em todas as frentes de batalha da mídia ou das artes cênicas encontra-se um fã ardoroso, um citador contumaz ou um encenador obsessivo da vastíssima obra rodrigueana. Arnaldo Jabor, que já havia filmado Toda Nudez Será Castigada e O Casamento, em sua nova função de articulista chega a manter contatos transcendentais com o falecido, através de um telefone metafísico. No cinema, por sinal, a lista de diretores que já levaram Nelson às telas é extensa e só prima pelas exceções, além do referido Jabor, Nelson Pereira dos Santos (Boca de Ouro) e Leon Hirzsman (A Falecida). Particularmente gosto de O Beijo no Asfalto, de Bruno Barreto, até porque está longe de ser uma unanimidade.
No teatro, então, nem se fala. Houve um tempo em que só havia Nelson Rodrigues nos palcos. Fui uma das vítimas dessa febre e confesso ter perdido algumas horas assistindo a interpretações bisonhas do profeta tricolor. Para não ser amargo, registro duas encenações que ficaram na memória: Paraíso Zona Norte, de Antunes Filho, e Viúva Porém Honesta, dirigida por Marco Antônio Braz, carioca radicado em São Paulo, no Armazém do Cais do Porto.
Mas há vozes discordantes. O ator Sérgio Britto, mesmo sendo admirador de Nelson, foi um crítico rigoroso das montagens excessivas de sua obra. O jornalista Amir Labaki também manifestou-se contrariamente ao culto rodrigueano. Amigos que foram vítimas da pena afiada e da ironia de Nelson afirmam que a admiração é válida, mas que certas expressões que se transformaram em marca registrada do mais suburbano dos pernambucanos foram coladas de autores como Eça de Queirós, Tolstói, e Dostoiévski. Polêmicas à parte, é graças a essa discordância que a alma de Nelson descansa em paz, escapando da burrice da unanimidade.
Leitor voraz de suas crônicas, preciosidades da literatura carioca, este crítico rasga seda para o jornalista e cronista esportivo (admiração reforçada pelo fato de ambos sermos tricolores), mas não sente a mesma euforia diante do dramaturgo. Nelson tem os dois pés na história do teatro brasileiro pela revolução cênica promovida por Vestido de Noiva. Suas peças, no entanto, são irregulares, muitas vezes repetitivas e se salvam não pelo conjunto, mas pelos detalhes, pelas observações afiadas do cronista sempre de plantão, capaz de fazer de uma crise de asma uma metáfora da mais absoluta impotência.
Na televisão Nelson não foi menos idolatrado. Até novela virou - O Homem Proibido - protagonizada pelo rodrigueano David Cardoso. Que eu me lembre, Engraçadinha, transformada em minissérie, já foi reprisada pelo menos três vezes. Faltava chegar ao Fantástico. Batata! E foi em grande estilo que Nelson abrilhantou as noites de domingo. Num projeto arrojado, de 1996, produzido e dirigido por Daniel Filho, as crônicas diárias publicadas na Última Hora sob o título A Vida Como Ela É... ganharam um tratamento altamente refinado que agora se encontra disponível em DVD duplo da Globo Filmes.
Foram escolhidos 40 textos de uma lista de duzentos adaptados por Euclydes Marinho. Com precisão cirúrgica, os roteiros contam pequenas histórias, de aproximadamente 15 minutos, em que acima da qualidade dos atores, da fotografia, da direção de arte e da excelente trilha sonora, sobressai o texto original do melhor Nelson Rodrigues.
Filmados em três meses, os curtas, vistos seguidamente, espelham com extrema fidelidade o mundinho da classe média carioca dos anos 50. Não o mundinho real, mas o mundinho que só a velha máquina de datilografar de Nelson poderia registrar. Amantes, fetichistas, suicidas, homicidas, velhos gagás, rapazes lindos como um “havaiano de Hollywood” são sacados da rotina do subúrbio, das repartições públicas, das arquibancadas de futebol. O desejo reprimido pela hipocrisia das convenções sociais transborda em frases de efeito ou em rompantes inusitados que quase sempre terminam num ardente beijo na boca ou numa facada fatal.
A Vida Como Ela É... é um exemplo bem-sucedido de padronização. Os atores, conforme demonstra um documentário extra, enfrentaram juntos uma rotina de ensaios em busca de um tom uniforme, sem ser comum. O mesmo ocorre com a fotografia de Edgar Moura, que filtra a luz do Rio para criar um clima contraditório, sufocante e acolhedor, de noir tropical, em que homens engomados e mulheres de carmim embalam suas paixões ao som de sambas-canções e boleros certeiros como a flecha de Robin Hood. Um mundo Nelson Rodrigues.
Não bastasse a qualidade dos 40 episódios, o DVD A Vida Como Ela É... traz entre seus extras uma entrevista antológica com Nelson Rodrigues e Otto Lara Rezende (a entrevista com Otto está no DVD 2, e não no 1, conforme indica a impressão nos discos). Amigos figadais, Nelson e Otto deixaram para a história trinta minutos da mais pura inteligência, do mais refinado humor, da mais alta camaradagem. Não, não se trata de uma troca de elogios de fazer os idiotas da objetividade lamberem os beiços. O que a entrevista registra está além do conteúdo, da aplicação exemplar da língua portuguesa, da sedutora capacidade de raciocínio e de produção de pensamentos lapidares. O que a entrevista registra é um outro tempo, tempo de outras preocupações, de outras falas, quando a televisão ainda não havia envelopado as entrevistas nas regras fixas dos talk-shows.
Otto, com a elegância habitual de homem refinado e erudito, esforça-se por conduzir a conversa num tom jornalístico, atento aos temas e questões da pauta (o lançamento da fundamental coletânea de crônicas de Nelson Rodrigues, O Reacionário). Nelson, rouco, castigado pela vida, recém-sarado de uma febre de fazer as lavas do Vesúvio parecerem neves do Kilimanjaro, dificulta ao máximo o papel do interlocutor. Logo no início, Otto pergunta se Nelson, um obcecado pela morte, já teria pensado em suas últimas palavras. Depois de relatar que após sair de um coma profundo de 15 dias havia concluído que a alma é imortal, Nelson dispara: “Minhas últimas palavras serão: Que boa besta é o Marx!” Discussões sobre a importância de ser velho, a ignorância dos cretinos fundamentais, e a falta de amor das grã-finas de narinas de cadáver pelo Brasil completam o bate-papo informal e bem-humorado. Ao ser indagado sobre se o título do livro era uma forma de atrair a atenção para si, uma “técnica de publicidade”, Nelson soa atualíssimo. “Não, meu caro Otto, é uma técnica de sinceridade”. De babar na gravata.
O DVD
A VIDA COMO ELA É...
Brasil, 1996
Direção: DANIEL FILHO
Fotografia: EDGAR MOURA
Elenco: MALU MADER, CASSIO GABUS MENDES, DEBORA BLOCH, CLAUDIA ABREU, FERNANDA TORRES, GUILHERME FONTES
Duração: 450 minutos (40 episódios)
Região do DVD: Multi-região
Formato de Tela: Standard
Idiomas: Português
Extras: Menu Interativo - Entrevista - Documentário - Acesso imediato aos capítulos - Bastidores - Depoimentos
Distribuidor: Som Livre
FONTE:http://criticos.com.br/?p=163&cat=5#sthash.I2H24SpC.dpuf
sexta-feira, 4 de dezembro de 2015
PAULO LEMINSKI
Dor elegante
Um homem com uma dor
É muito mais elegante
Caminha assim de lado
Com se chegando atrasado
Chegasse mais adiante
Carrega o peso da dor
Como se portasse medalhas
Uma coroa, um milhão de dólares
Ou coisa que os valha
Ópios, édens, analgésicos
Não me toquem nessa dor
Ela é tudo o que me sobra
Sofrer vai ser a minha última obra