sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

MANOEL DE BARROS



Autorretrato Falado


Venho de um Cuiabá de garimpos e de ruelas entortadas.

Meu pai teve uma venda no Beco da Marinha, onde nasci.

Me criei no Pantanal de Corumbá entre bichos do chão,
aves, pessoas humildes, árvores e rios.

Aprecio viver em lugares decadentes por gosto de estar
entre pedras e lagartos.

Já publiquei 10 livros de poesia: ao publicá-los me sinto 
meio desonrado e fujo para o Pantanal onde sou 
abençoado a garças.

Me procurei a vida inteira e não me achei — pelo que
fui salvo.

Não estou na sarjeta porque herdei uma fazenda de gado.

Os bois me recriam. 

Agora eu sou tão ocaso!

Estou na categoria de sofrer do moral porque só faço
coisas inúteis.

No meu morrer tem uma dor de árvore.



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