LEONARD NIMOY
sábado, 28 de fevereiro de 2015
terça-feira, 17 de fevereiro de 2015
FOTOGRAFAR
de Manoel de Barros
Difícil fotografar o silêncio.
Entretanto tentei. Eu conto:
Madrugada, a minha aldeia estava morta. Não se via ou ouvia um barulho, ninguém passava entre as casas. Eu estava saindo de uma festa,.
Eram quase quatro da manhã. Ia o silêncio pela rua carregando um bêbado. Preparei minha máquina.
O silêncio era um carregador?
Estava carregando o bêbado.
Fotografei esse carregador.
Tive outras visões naquela madrugada. Preparei minha máquina de novo. Tinha um perfume de jasmim no beiral do sobrado. Fotografei o perfume. Vi uma lesma pregada na existência mais do que na pedra.
Fotografei a existência dela.
Vi ainda um azul-perdão no olho de um mendigo. Fotografei o perdão. Olhei uma paisagem velha a desabar sobre uma casa. Fotografei o sobre.
Foi difícil fotografar o sobre. Por fim eu enxerguei a nuvem de calça.
Representou pra mim que ela andava na aldeia de braços com Maiakovski – seu criador. Fotografei a nuvem de calça e o poeta. Nenhum outro poeta no mundo faria uma roupa
Mais justa para cobrir sua noiva.
A foto saiu legal.
sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015
sábado, 7 de fevereiro de 2015
O ÚLTIMO ELVIS
Por Chico Izidro
Gutierrez, além da fábrica, trabalha numa agência de dublês – e a Argentina é conhecida pela supremacia de suas cópias humanas, vide os grupos que homenageiam os Beatles, Queen, Pink Floyd, tocando a obra deles à perfeição. E Gutierrez, quando sobe ao palco, acredita ainda mais ser o próprio Elvis, mesmo tocando em muquifos de quinta categoria. Gutierrez tem um plano para sua vida, e esse é atrapalhado de certa forma quando a mulher sofre um acidente, entra em coma, e ele se vê obrigado a cuidar da filha em tempo integral. Mas quem conhece a vida de Elvis Presley, aos poucos irá matando as charadas que surgem ao longo deste delicioso filme, cujo destino será Graceland.
CABEÇA DE PEDRA
Ateu sem convicção
Ele não acreditava em Deus até o dia em que a coisa apertou. Doença terminal. Tinha pouco tempo de vida. Ao saber, imediatamente tirou do repertório a piada em que o paciente fica sabendo pelo médico que tinha apenas três minutos antes de morrer; ao perguntar o que podia fazer, ouviu do especialista: “Um Miojo”. Resoluto, resolveu não se entregar ao pessimismo, como se isso fosse possível. Sua determinação durou trinta segundos. Foi para casa, jogou-se na poltrona, cochilou e, ao acordar, viu que fachos da luz do sol vazavam a persiana da sala e iluminavam pontos do tapete velho. Passou a acreditar em Deus imediatamente. De joelhos pediu um milagre e perdão por nunca ter acreditado na existência Dele. Sentiu um alívio no peito e dormiu tranquilo. Os meses se passaram. Ele morreu sem sentir muita dor. O corpo foi velado numa capela ao lado do cemitério. Apareceu um padre. Durante a reza uma mulher com maquiagem pesada perguntou à outra o que o da batina estava fazendo ali. Isso porque o morto, todo mundo sabia, era ateu convicto. A que ouviu o relato resolveu especulara. Achou que aquilo era um milagre porque ninguém da família teria pedido a presença do sacerdote por saber do ateísmo do que estava ali com algodão nas narinas. O da batina orou e, ao sair, foi chamado por um senhor que estava na porta do velório ao lado. Só aí descobriu que tinha errado de defunto.