The Head on the Door (1985)
(Edição 205 / Setembro de 2006)
por Camilo Rocha
O ano de 1985 foi horrendo para a música. Na rádio, imperavam nomes como Bruce Springsteen, Dire Straits e Phil Collins. O hip hop era uma novidade passada e ainda não tinha sido sacudido por Run-D.M.C. e Beastie Boys.
A revolução da música eletrônica não passava de iniciantes produtores em Detroit e Chicago que ninguém conhecia fora de suas cidades.
Em meio à pasmaceira exasperante, praticamente os únicos sinais de esperança e inteligência vinham do universo indie inglês. OK, lá na Inglaterra podia ser que esse caldeirão já borbulhasse visivelmente desde a virada dos 80, desde o início do pós-punk. Mas, na paleozóica era pré-internet e MTV, as tendências demoravam anos para atravessar os continentes. Então, tirando poucos antenados com boas conexões ou grana no bolso (muitos dos quais formaram bandas de rock), no Brasil praticamente ninguém, mas ninguém mesmo, sabia o que era o novo rock inglês de gente como Smiths, Echo & the Bunnymen, Siouxsie & the Banshees, Joy Division/New Order e Bauhaus.
Se teve um disco que ajudou a clarear o matagal da ignorância foi o sexto álbum do Cure, The Head on the Door É o disco mais redondo, diverso, criativo e acessível que a banda já lançou. Nem antes nem depois conseguiram algo tão perto do perfeito. Se antes os discos da banda pendiam mais decididamente para um estilo (punk-pop, pós-punk, gótico, electro'pop, psicodelia), The Head ... se esbalda em múltiplas influências. E sempre se sai bem.
Tem Robert Smith (guitarrista, principal compositor e líder) cantando sobre o sangue de Cristo por cima de violões flamencos em "The Blood"; tem o saltitante megahit "In Between Days", com sua historinha de traição e levada que lembra New Order; tem "Kyoto Song", balada trágica com sonoridades de música japonesa (claro!). E isso são só as três primeiras faixas! Avançando disco adentro, os deleites continuam: a descompromissada "Six Different Ways", com cordas indianas e melodia quase infantil; o baixão sujo, suado e funkeado de "Screw", com sua letra que descreve uma overdose; a sinuosa levada eletrônica da paranóica "Close to Me"; o vôo épico de "Push"; o clima de despedida melancólica em "A Night Like This", com seu saxofone que é marca registrada do meio dos anos 80; "Sinking", no final, traz céu nublado a la Joy Division.
É uma síntese impecável do espírito ambivalente da banda. O chavão sobre o Cure é óbvio: góticos, depressivos, melancólicos, darks. O que é verdade, especial mente nas letras. Mas existe o outro lado da moeda sobre o qual não se fala muito, mas que também está evidente: o Cure tem um tremendo senso de humor e leveza. Ao dar um acabamento mais pop nesse disco, o Cure estava enviando o seguinte recado: não nos levem tão a sério, também queremos fazer você dançar e cantar nossas músicas.
Os clips são bons exemplos: "In Between Days" traz a banda bobamente empurrando a câmera pra todo lado, com Robert Smith num sorrisão sarcástico. Em "Close to Me" a turma aparece enfiada num guarda-roupa que rola ribanceira abaixo. Depois tem todas aquelas fotos com Smith com o famoso look de ursinho panda batido no liquidificador com um estojo de maquiagem. Sem falar que o vocalista sempre adorou cervejinha no pub e pelada de futebol.
Com sua variedade de sons e climas e seus hits radiofônicos, foi um álbum vencedor. Abriu o mercado americano para a banda enquanto consolidava sua posição de titular do novo rock da década de 80 da Inglaterra, chegando a Disco de Ouro nos dois países. Foi o primeiro passo para a banda se tornar a milionária instituição do rock que é hoje. Entre os muitos países onde se tornou popular graças ao disco estava o Brasil. Em 1987, ela viria para uma arrebatadora turnê,que incluiu oito shows.
(Edição 205 / Setembro de 2006)
por Camilo Rocha
O ano de 1985 foi horrendo para a música. Na rádio, imperavam nomes como Bruce Springsteen, Dire Straits e Phil Collins. O hip hop era uma novidade passada e ainda não tinha sido sacudido por Run-D.M.C. e Beastie Boys.
A revolução da música eletrônica não passava de iniciantes produtores em Detroit e Chicago que ninguém conhecia fora de suas cidades.
Em meio à pasmaceira exasperante, praticamente os únicos sinais de esperança e inteligência vinham do universo indie inglês. OK, lá na Inglaterra podia ser que esse caldeirão já borbulhasse visivelmente desde a virada dos 80, desde o início do pós-punk. Mas, na paleozóica era pré-internet e MTV, as tendências demoravam anos para atravessar os continentes. Então, tirando poucos antenados com boas conexões ou grana no bolso (muitos dos quais formaram bandas de rock), no Brasil praticamente ninguém, mas ninguém mesmo, sabia o que era o novo rock inglês de gente como Smiths, Echo & the Bunnymen, Siouxsie & the Banshees, Joy Division/New Order e Bauhaus.
Se teve um disco que ajudou a clarear o matagal da ignorância foi o sexto álbum do Cure, The Head on the Door É o disco mais redondo, diverso, criativo e acessível que a banda já lançou. Nem antes nem depois conseguiram algo tão perto do perfeito. Se antes os discos da banda pendiam mais decididamente para um estilo (punk-pop, pós-punk, gótico, electro'pop, psicodelia), The Head ... se esbalda em múltiplas influências. E sempre se sai bem.
Tem Robert Smith (guitarrista, principal compositor e líder) cantando sobre o sangue de Cristo por cima de violões flamencos em "The Blood"; tem o saltitante megahit "In Between Days", com sua historinha de traição e levada que lembra New Order; tem "Kyoto Song", balada trágica com sonoridades de música japonesa (claro!). E isso são só as três primeiras faixas! Avançando disco adentro, os deleites continuam: a descompromissada "Six Different Ways", com cordas indianas e melodia quase infantil; o baixão sujo, suado e funkeado de "Screw", com sua letra que descreve uma overdose; a sinuosa levada eletrônica da paranóica "Close to Me"; o vôo épico de "Push"; o clima de despedida melancólica em "A Night Like This", com seu saxofone que é marca registrada do meio dos anos 80; "Sinking", no final, traz céu nublado a la Joy Division.
É uma síntese impecável do espírito ambivalente da banda. O chavão sobre o Cure é óbvio: góticos, depressivos, melancólicos, darks. O que é verdade, especial mente nas letras. Mas existe o outro lado da moeda sobre o qual não se fala muito, mas que também está evidente: o Cure tem um tremendo senso de humor e leveza. Ao dar um acabamento mais pop nesse disco, o Cure estava enviando o seguinte recado: não nos levem tão a sério, também queremos fazer você dançar e cantar nossas músicas.
Os clips são bons exemplos: "In Between Days" traz a banda bobamente empurrando a câmera pra todo lado, com Robert Smith num sorrisão sarcástico. Em "Close to Me" a turma aparece enfiada num guarda-roupa que rola ribanceira abaixo. Depois tem todas aquelas fotos com Smith com o famoso look de ursinho panda batido no liquidificador com um estojo de maquiagem. Sem falar que o vocalista sempre adorou cervejinha no pub e pelada de futebol.
Com sua variedade de sons e climas e seus hits radiofônicos, foi um álbum vencedor. Abriu o mercado americano para a banda enquanto consolidava sua posição de titular do novo rock da década de 80 da Inglaterra, chegando a Disco de Ouro nos dois países. Foi o primeiro passo para a banda se tornar a milionária instituição do rock que é hoje. Entre os muitos países onde se tornou popular graças ao disco estava o Brasil. Em 1987, ela viria para uma arrebatadora turnê,que incluiu oito shows.
FONTE: http://rateyourmusic.com/list/Mhrr/discoteca_basica_revista_bizz/5/
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