quinta-feira, 25 de maio de 2017

FRANK ZAPPA

Black Napkins 
Frank performing with The Mike Douglas Orchestra
Very unique performance. October, 28, 1976

CANNES CONTRA NETFLIX



A mudança nos modos de consumo é incontrolável, mas a criação merece uma política de apoio na qual as plataformas pagas também sejam aliadas.

A guerra estourou entre o Festival de Cannes, um ícone da indústria cultural francesa, e a Netflix, a plataforma norte-americana de cinema online com 100 milhões de clientes em todo o mundo. Nesta 70a edição, o evento anunciou uma mudança nas regras do jogo: a partir de 2018, os filmes que não estrearem em salas francesas não podem competir pela Palma de Ouro. Hollywood impõe algo parecido: os candidatos ao Oscar de melhor filme devem ter sido exibidos pelo menos sete dias seguidos, três vezes por dia, nos cinemas de Los Angeles. É a resposta à Netflix, que depois de concorrer em Berlim e Veneza —que permitiram isso— chegou a Cannes com dois filmes de produção própria que não vai exibir na França.

O próprio Pedro Almodóvar, presidente do júri, cerrou fileiras com o festival: “A Netflix é uma nova plataforma que oferece conteúdo pago, o que em princípio é bom e enriquecedor. No entanto, esta nova forma de consumo não pode tentar substituir as já existentes. Me parece um enorme paradoxo dar uma Palma de Ouro e qualquer outro prêmio a um filme que não pode ser assistido na tela grande”.

Alguns especialistas situaram o debate no terreno da qualidade: da originalidade do produto de autor frente à padronização que pode significar estar nas mãos de uma multinacional que produz ao mesmo tempo em que exibe; e da defesa de uma experiência de silêncio e concentração diante da grande tela que, no entanto, está diminuindo em relação a outras formas de consumo. O cinema no computador, televisor ou celular é cada vez mais a opção preferida por muitos espectadores, mesmo pagando.

O debate, no entanto, é mais amplo e tem a ver com a defesa de uma identidade cultural e de uma indústria em transformação. A própria eleição de um presidente, Macron, capaz de salpicar seus discursos de citações de pensadores é paradigma de uma França que colocou a cultura e a educação em terreno protegido para além dos partidos.

Sarkozy foi defensor da luta contra a pirataria. E Hollande garantiu os gastos com educação e cultura em plena onda de cortes. Na Espanha, enquanto isso, o Governo aumentou o IVA cultural e foi incapaz de proteger a indústria da pirataria. A mudança nos modelos de consumo cultural é incontrolável e as plataformas de pagamento só podem ser bem-vindas, mas a criação merece uma política de apoio por parte do Estado em que a Netflix, assim como outras grandes empresas, pode e deve ser também aliada dos atores culturais.


FONTEEl País

quarta-feira, 24 de maio de 2017

SOLDA

CÁUSTICO

































FERNANDO PESSOA


Do Livro do Desassossego 



Já vi tudo, ainda o que nunca vi, nem o que nunca verei. No meu sangue corre até a menor das paisagens futuras, e a angústia do que terei que ver de novo é uma monotonia antecipada para mim.

E debruçado ao parapeito, gozando do dia, sobre o volume vário da cidade inteira, só um pensamento me enche a alma — a vontade íntima de morrer, de acabar, de não ver mais luz sobre cidade alguma, de não pensar, de não sentir, de deixar atrás, como um papel de embrulho, o curso do sol e dos dias, de despir, como um traje pesado, à beira do grande leito, o esforço involuntário de ser.


ANTIGOS POSTAIS ERÓTICOS







sexta-feira, 19 de maio de 2017

NEIL YOUNG & CRAZY HORSE

Down By the River (Live at Farm Aid 1994)

*Neil Young and Crazy Horse perform "Down By the River" live at the Farm Aid concert in New Orleans, Louisiana on September 18, 1994. Farm Aid was started by Willie Nelson, Neil Young and John Mellencamp in 1985 to keep family farmers on the land and has worked since then to make sure everyone has access to good food from family farmers. Dave Matthews joined Farm Aid's board of directors in 2001.

quinta-feira, 18 de maio de 2017

ALMAS NUAS


de
  Oscar Wilde  em  O Retrato de Dorian Gray


Influenciar uma pessoa é dar-lhe a nossa própria alma. O indivíduo deixa de pensar com os seus próprios pensamentos ou de arder com as suas próprias paixões. As suas virtudes não lhe são naturais. Os seus pecados, se é que existe tal coisa, são tomados de empréstimo. Torna-se o eco de uma música alheia, o ator de um papel que não foi escrito para ele. O objetivo da vida é o desenvolvimento próprio, a total percepção da própria natureza, é para isso que cada um de nós vem ao mundo. Hoje em dia as pessoas têm medo de si próprias. Esqueceram o maior de todos os deveres, o dever para consigo mesmos. É verdade que são caridosas. Alimentam os esfomeados e vestem os pobres. Mas as suas próprias almas morrem de fome e estão nuas. A coragem desapareceu da nossa raça e se calhar nunca a tivemos realmente. O temor à sociedade, que é a base da moral, e o temor a Deus, que é o segredo da religião, são as duas coisas que nos governam.


BLOG DO ZÉ BETOhttp://www.zebeto.com.br/


DRAN


ZÉ DA SILVA



Não desconfiava, apesar de ter sido alertado desde pequeno. Um dia foi visto enchendo o prato com macarrão de uma forma tal que a comida transbordava o prato e ocupava um grande espaço na mesa. Ele comeu tudo – de fora pra dentro. Numa banca de produtos chineses comprou um óculos com quatro graus para leitura e passou a usar, sem ter problema algum de visão. O enxoval do filho estava comprado há tempos, mas ele nem namorada tinha. Pagou adiantado o próprio velório e o crematório e encomendou algumas coroas de flores. Não conseguia ler duas linhas de qualquer texto e seu principal passatempo na tv era zapear constantemente e a uma velocidade espantosa. Nunca andava – corria. A respiração sempre acelerada. Teve o piripaque aos 20 anos. Na UTI, entubado, recebeu a visita de um amigo de infância, que lhe falou ao ouvido: “Não sei o porquê da pressa. Nós vamos e a terra fica”. Morreu logo que o colega saiu. Queria chegar ao céu o mais rapidamente possível.




FOTOGRAFIA

VIVIAN MAIER








quarta-feira, 17 de maio de 2017

DISCOTECA BÁSICA


The Stranglers
Black and White (1978)


(Edição 100,Novembro de 1993)

Tenho a mania de fuçar nos sebos de discos usados. E também de revirar ofertas nas chamadas "lojas populares". É um hábito antigo, que já me rendeu descobertas inesperadas. A inaugural foi nos idos de 74, num desses "saldões". Entre duplas sertanejas e galãs bregas, encontrei duas coletâneas de Velvet Underground! Eram da série Pop Giants (com medonhas capas-padrão), do selo Polyfar - da atual PolyGram. Um "encalhe" que valia outro, pois até então nenhum outro trabalho do grupo tinha sido editado no Brasil.
Dei de cara com achado semelhante alguns anos depois, ao me deparar outras duas jóias raras, disfarçadas de artigos em liquidação: "No More Heroes" e, especialmente, "Black And White", do quarteto inglês The Stranglers - que não se sabe pôr que cargas d'água foram lançados aqui pelo selo Copacabana, logo após as edições originais. O som dos caras já impressionava no primeiro disco, que tinha como mote a iconoclastia da faixa-título (que, citando de Leon Trotsky a Sancho Pança, proclamava não haver mais heróis), mas no álbum posterior era ainda mais poderoso.
Na época, só havia edições nacionais de alguns poucos discos de emergente punk rock (a coletânea bazuca "A Revista Pop Apresenta O Punk Rock", "Never Mind The Bollocks", dos Sex Pistols, The Clash com seu primeiro álbum), mas os "estranguladores" soavam diferentes. Ao ataque punk eles uniam um som depurado, em que a simplicidade do vocal e da guitarra de Hugh Corwell somava-se às firulas tecladisticas bem dosadas de Dave Greenfield, ao baixo de Jean-Jacques Burnel e à bateria de Jet Black embaçando a moldura sonora.
Os "homens de negro" (como eles se autodefiniam) eram umas figuras um tanto bizarras. Pareciam estar no lugar certo e na hora certa - ou melhor, chegaram antes, pois seu álbum de estréia ("The Stranglers IV: Rattus Norvegicus") era anterior à explosão do punk britânico. Porém, eles tinham a fachada errada, mesmo naqueles tempos da anarquia.
Para começar, se o perfil dos punks era notoriamente juvenil, eles eram "velhões": Cornwell havia desistido de ser professor de Química para tornar-se guitarrista e "junkie" em tempo integral; Burnel (músico de ascendência francesa, apesar de ter nascido em Londres) também tinha largado seu curso de História, enquanto Jet Black era sorveteiro antes de manejar as baquetas. Através de um anúncio na Melody Maker (que requeria um tecladista para um grupo de "soft rock"), eles entraram em contato com Greenfield. O quarteto tinha uma formação esquisita, mas que acertou na mosca com a combinação musical. tanto que foram incorporados prontamente ao movimento punk, apesar de freqüentemente acusados de sexistas e de machistas - por colocarem strippers girl em seus shows, por exemplo.
A música era agressiva nas cordas, nas letras e nos vocais. Mas ao mesmo tempo eles se permitiam fazer difressões psicodélicas à La The Doors ou até mesmo a pequenos toques de música clássica, dados pelo tempero dos teclados. Esta mistura chegou em ponto de bala no terceiro álbum, "Black And White". Com algumas das canções mais emblemáticas do grupo ("Nice'n'Sleazy", "Threatened", "Toiler On The Sea"), o disco ainda tratava com cinismo e deboche temas militaristas ("Tank", "Curfew"), consumismo ("Outside Tokyo") e até o pretenso "chauvinismo" deles - "Do You Wanna", "Death And Night And Blood (Yukio)". Tudo disposto em instantâneos de luz e sombra, num contraste que era sugerido pela própria apresentação do álbum. Outros trabalhos musicalmente mais sofisticados do grupo surgiriam depois - como os álbuns "(The Gaspel According To) The Meninblack", "La Folie", "Feline" -, todos muito bons, é verdade, mas sem a mesma pegada de "Black and White".
Depois, o grupo teve êxitos esparsos, até sofrer pesada baixa com a saída de Cornwell, em 91. Mas não importa: o retrato definitivo dos "estranguladores" já tinha sido tirado em 78, em preto & branco.


Celso Pucci

FONTE: http://rateyourmusic.com/list/Mhrr/discoteca_basica_revista_bizz/2/

terça-feira, 16 de maio de 2017

FRANK MILLER

O homem das sombras



O mundo das histórias em quadrinhos é marcado por nomes que transformam ideias em sagas, aventuras e lendas, tanto aqueles que contam essas histórias, como os que as transformam em imagens. E algumas vezes, pessoas nascem como o dom de escrever e desenhar suas próprias histórias, como é o caso de um dos maiores artistas de todos os tempos, no que se refere às HQs, Frank Miller.

Mestre do traço e da arte de narrar histórias, Frank Miller trabalhou nas maiores empresas de quadrinhos do mundo, construindo uma obra marcada por sombras, violência e crítica social, tudo com muito contraste entre luz e sombras, quase sempre, manchadas de vermelho sangue. E quando as páginas dos quadrinhos pareciam pequenas para o talento de Miller, ele resolveu se aventurar também nas telas do cinema.

Controverso, polêmico, arrogante, genial, mestre, um verdadeiro artista. Adepto de novos formatos e duro opressor de regras e padrões. Combatido por alguns, adorado por muitos. Assim é Frank Miller, um homem que dedica a sua vida a contar histórias, a mostrar a jornada de pessoas, a reviver conceitos e deturpá-los para que entendamos o mínimo de quem somos.

Esta é a história de um dos maiores artistas de quadrinhos de todos os tempos.

ORIGENS

Frank Miller nasceu em Olney, Maryland, no dia 27 de janeiro de 1957, e é filho de uma enfermeira e um carpinteiro/eletricista. Tem mais quatro irmãos.

Miller sempre foi apaixonado por cinema e adorava desenhar. Já aos seis anos, deu à mãe uma pilha de papeis para datilografia, dobrados na forma de gibis, coberta de desenhos feitos por ele e disse que aquilo era o que ele queria fazer pelo resto da vida. Ele mesmo diz que desenhar é sua maior paixão e que a cidade de Nova York sempre foi a sua grande inspiração, já que veio do interior e sempre sonhou em viver na maior cidade do mundo.

Frank Miller se sentava no topo do Empire State Building, num tempo em que não havia grades de proteção, e desenhava a cidade à sua frente. Fazia o mesmo com outros lugares, como a South Street Seaport, e registrava cada “respiro” da cidade viva, como mesmo a chamava. Nova York sempre foi a personagem mais retratada por Miller.

Nos anos 60, com a revolução dos quadrinhos estabelecida pela MARVEL, o jovem Miller viu que suas ideias poderiam se tornar realidade e que seu sonho de viver de quadrinhos poderia ser alcançado. Isso ainda levaria anos para acontecer, mas ele sabia que esse mercado abriria portas para pessoas como ele, cheias de ideias na cabeça e com modos próprios de mostrar aos outros essas ideias.

No início, os heróis da “grande galáxia MARVEL” fizeram com que Frank Miller, ainda adolescente, encontrasse uma fonte de expressão de suas próprias expectativas e frustrações, como as de todo jovem, sob a forma dos personagens criados por Stan Lee e Jack Kirby, verdadeiros ídolos de gerações e gerações de fãs da mais pura aventura e entretenimento. As famílias poderiam se inspirar no “Quarteto Fantástico”, os adolescentes nerds poderiam ser um “Homem-Aranha” e as meninas poderiam ser fabulosas como a “Garota Marvel”. Tudo à volta teria na MARVEL a possibilidade de ser muito mais do que era. Os sonhos de qualquer adolescente, como Frank Miller, poderiam se tornar reais ao abrir um gibi da MARVEL.

A MARVEL trouxe aventura e imaginação para Frank Miller. Mas faltava algo mais para que suas histórias viessem a serem contadas de verdade, não apenas como simples desejos de um adolescente criativo. Esse “algo mais” viria sob a forma da obra de Will Eisner, um dos escritores e desenhistas de quadrinhos mais famosos e referenciais de todos os tempos.

Eisner, muito conhecido como o “criador do Spirit”, nasceu em Nova York em 1917 e faleceu na Flórida em 2005, ao longo de quase toda a sua vida, retratou a “Grande Maçã” sob a perspectiva de seus habitantes, personagens comuns como todos nós, mas que representam a mola mestra e a força vital de uma cidade. O elemento humano era fundamental para se contar uma boa história e mesmo que essa viesse acompanhada de humor e aventura, além de muita briga e confusão, era primordial que os personagens parecessem humanos para o leitor.


A obra de Will Eisner determinou a escolha de Miller pela realidade sobre o fantástico, valorizando os personagens humanos, seus conflitos e problemas acima dos desafios que tinham enfrentar quando vestiam os uniformes e saíam para combater o crime.

A partir disso, Miller desenvolveu seu estilo de narrativa, acrescentando elementos jornalísticos em meio às histórias, como por exemplo, a necessidade de tratar uma cena como um registro fotográfico ou sensível ao olhar, herança de outro mestre dos quadrinhos, Neal Adams, que revolucionou a indústria nos anos 70. Para Miller, um quadrinho não deveria ser apenas um desenho preenchido por palavras, mas uma autêntica cena de um fato de que estivesse ocorrendo em dado momento na história.

Outro artista importante na concepção visual e narrativa de Miller foi Jim Steranko, responsável por incorporar aos quadrinhos elementos da cultura pop e surrealismo em meados dos anos 60, dando às histórias uma dimensão intermediária entre o cotidiano da sociedade e os seus sonhos e desejos mais íntimos.

Unindo conceitos artísticos aos valores humanos e à realidade cotidiana e inserindo esses elementos ao vasto e incrível universo dos super-heróis coloridos e incansáveis na luta contra o mal, Frank Miller construiu uma carreira vitoriosa, marcada por altos e baixos, como suas próprias histórias. Começou como um garoto que adorava desenhar, se transformou num importante artista contador de histórias e ganhou poder e notoriedade como um dos nomes mais importantes na indústria dos quadrinhos. E seu talento o levou a novos rumos, como o cinema.

A história de Frank Miller merece ser conhecida pelos fãs de aventura. Como todos os grandes mestres dessa arte, há quem o defenda e quem o considera um “charlatão”. De qualquer forma, o nome Frank Miller é sinônimo de HQs e merece ser lembrado como um desbravador, um contador de histórias que ultrapassam as barreiras do tempo e que ainda são base para novas histórias a serem contadas. Sua importância como um homem que desafiou o sistema e quebrou padrões nos ensinou que o mais importante nesta vida é contar a história em que você acredita e nada mais.

Seja seguindo os passos de Eisner, seja construindo um universo próprio, Frank Miller é um nome de destaque na história dos quadrinhos. Para ele, quadrinhos são arte e a única forma de entretenimento que jamais se perderá ante a ação do tempo.


UMA LENDA DOS QUADRINHOS

Desde muito cedo, Frank Miller se interessava em contar histórias e desenhá-las, já que produzia em casa seus próprios fanzines, o que despertou o interesse de outras pessoas que se dedicavam a este tipo de mídia. O talento o tornou um valioso freelancer para diferentes editoras norte-americanas, desde menores, até as gigantes do mercado, como MARVEL e DC COMICS.

Miller começou sua carreira oficial na segunda metade dos anos 70, quando chegou à Nova York, a cidade que seria parte integrante de sua obra. Seus primeiros trabalhos foram artes em revistas como “Weird War Tales” (DC Comics), “Twilight Zone” (Gold Key) e “John Carter: Warlord of Mars” (MARVEL Comics), mas sem grande destaque perante o público e a crítica.

Começou a ganhar notoriedade na MARVEL quando ilustrou duas edições da revista “Peter Parker – The Spetacular Spider-Man”, mas precisamente os números 27 e 28. Na história, o personagem “Justiceiro” enfrentava o herói aracnídeo, inclusive, antecipando seus movimentos. O anti-herói da MARVEL se convence de que o “Amigo da vizinhança” não é mais um malfeitor como aqueles que enfrentava, e decide não matá-lo ao fim da história. Miller começava a dar seus primeiros passos na “Casa das Ideias” e na própria grande indústria dos quadrinhos em geral, ainda que fosse considerado por muitos como uma aposta.

Após o sucesso alcançado, Frank Miller foi convidado pelos executivos da MARVEL para assumir um de seus mais conhecidos heróis, mas que passava por uma má fase, o “Demolidor”, desenhando as histórias e mais tarde, escrevendo seus roteiros. Além disso, o jovem artista deveria substituir um dos grandes nomes dos quadrinhos, Gene Colan, a partir da edição 158, de maio de 1979. Ao lado do arte-finalista Klaus Janson, Miller desenvolveu uma das melhores fases do personagem, ressuscitando as vendas de sua revista. Foi durante esta fase, que Miller criou uma das personagens mais icônicas da MARVEL, a assassina ninja grega “Elektra Natchios”. O nome da personagem foi inspirado na personagem trágica de Sófocles, e nos quadrinhos representava segundo o próprio autor, o poder da mulher nas HQs, de forma que as histórias ganhassem uma aura mais real e sensual com personagens como essa, deixando de lado o padrão das “namoradas em perigo” ou das “heroínas em segundo plano”.

“Por que as namoradas dos super-heróis tinham que necessariamente serem normais?” Miller pensava que os super seres poderiam se relacionar com mulheres à sua altura, que tivessem na vida íntima e amorosa o mesmo desempenho que na luta contra o crime. Elektra representa esse pensamento do autor e uma virada radical no conceito de relacionamentos entre heróis nos quadrinhos.

Não demorou muito para que Miller assumisse também a função de escritor de suas histórias, o que naqueles tempos era algo comum, já que o grande número de publicações possibilitava a um artista apresentar as suas próprias ideias no que se referia a roteiros de quadrinhos. Mesmo com as vendas em baixa, nomes como Miller ganhavam mais notoriedade com os argumentos e as artes das revistas. O Demolidor representou bem essa época, mostrando que o talento do artista poderia ser benéfico na construção da mitologia de um personagem, tornando-o uma “cria” daquele que o desenvolvesse ao longo de cada edição.

Miller se valeu do fato de que seu grande mestre, Will Eisner escrevia e desenhava suas obras, o que para alguns executivos da MARVEL era algo que não deveria existir. Segundo os “engravatados”, desenhistas deveriam desenhar e escritores tinham que apenas escrever. Miller desenvolveu esta que é uma de suas melhores qualidades, a de contar bem uma história tanto visual, quanto conceitualmente. Isso se mostrou ao longo de sua carreira com o Demolidor.

Além do traço único, Miller deu às aventuras do personagem um tom mais sombrio e dramático, coisa que não acontecia nas histórias anteriores à sua chegada. Não só as crianças gostavam de ler as histórias, mas também o público adulto recebeu bem essa revolução no personagem. Temas como prostituição, assassinato e drogas foram usados por Miller ao longo de sua passagem pela revista, inclusive, revitalizando personagens recorrentes no universo do herói, como o Rei do Crime e o Mercenário.

A ótica de Miller apresentou ao público um novo conceito de super-herói, não mais como um ser infalível e sempre presente quando o dever chamasse, mas um ser humano falho e angustiado, tendo que pôr na balança os deveres como herói e sua própria vida enquanto ser humano. Além disso, o estilo narrativo de Miller revolucionou a arte de contar histórias em quadrinhos, com seu tom e dinâmica cinematográficos, apresentando segmentos de violência física, exploração das classes minoritárias e o poder da mídia.

Considerada por fãs e especialistas como a melhor história do Demolidor escrita por Miller, “A queda de Murdock” representou uma verdadeira revolução nas aventuras do personagem. Com a arte de David Mazzuchelli, a história se foca no alter-ego do herói noturno, o advogado cego Matt Murdock, envolvido no submundo do crime, repleto de gangsteres, prostitutas e assassinatos. Miller desenvolveu suas histórias a partir dos dramas pessoais do personagem, além de sua sede de justiça e defesa da lei.

O já citado Rei do Crime, o mega-empresário Wilson Fisk passou a ser um oponente à altura do Demolidor, e não apenas mais um vilão na galeria de personagens da MARVEL. Um dos mais poderosos e influentes empresários de Nova York era na verdade um frio e calculista criminoso, não medindo esforços para conseguir o que queria. A visão dada por Miller ao personagem representava uma crítica social feita pelo autor, de que o poder maior de um Estado estaria nas mãos de poucos, por meio da corrupção, criminalidade e opressão às massas.

Em meados de 1981, Frank Miller decidiu acabar com sua personagem Elektra de uma forma dramática: assassinada pelo arquiinimigo do Demolidor, o Mercenário. Considerado um risco pela MARVEL, Frank Miller recebeu apoio de alguns executivos da editora e desenvolveu a história. O resultado foi sucesso de vendas da edição 181 da revista do Demolidor. Miller nunca concordou com as constantes “ressurreições” da personagem ao longo dos tempos, feita pela MARVEL. Sendo uma personagem criada por ele, a sua decisão deveria ser respeitada. Coisas de direitos de propriedade. É interessante quando o próprio Miller diz em entrevistas que pensava em matar a personagem desde os primeiros números que escrevia e que essa medida seria necessária para o desenvolvimento da saga que estava construindo com o Demolidor.

Miller transformou as histórias em quadrinhos de simples diversão e entretenimento para um veículo poderoso de discussão política e social em meados dos anos80. Asérie realizada com o Demolidor fez tanto sucesso que a saga redefiniu os rumos do personagem, inclusive após a saída de Miller da série. Além disso, este trabalho representou uma valiosa influência para as obras seguintes feitas por Miller.

Em 1982, em parceria com Chris Claremont, um dos principais responsáveis pelo sucesso dos X-Men, Miller desenvolveu a mini-série “Eu, Wolverine”, apresentando uma aventura solo do mais popular dos mutantes no Japão, numa trama envolvendo samurais e o passado do personagem. A história apresentava um amor na vida de Logan, Mariko Yashida, além do “Tentáculo”, organização de assassinos que também fazia parte das histórias de Elektra.

Claremont convidou Miller para desenhar a história, pois acreditava que Wolverine era mais do que um cara baixinho e esquentado. Sua psique era complexa, segundo o escritor, e essa condição deveria ser mais explicada ao longo de suas histórias. Miller considerava Logan uma espécie de “samurai defeituoso”, com um código de honra inerente, mas suplantado pela violência de sua longa vida. A busca pela sua própria identidade, juntamente com a missão de salvar seu grande amor de um casamento indesejado, é algo muito bem explorado nas páginas dessa aventura, considerada por muitos, como a principal na carreira solo de Wolverine.

O texto de Claremont é ricamente ilustrado pelos desenhos de Miller, apresentando ao leitor a mudança de postura vivida por Logan, deixando de seu um guerreiro perdido por um passado desconhecido para se tornar uma máquina de matar, enfrentando tudo e a todos para salvar seu amor. Ou seja, é a jornada de um homem em busca do que acredita e deseja, mesmo que para isso tenha que enfrentar toda a sorte de perigos e os piores oponentes.

Os anos de 1983 e 1984 marcaram a investida de Frank Miller num universo do qual ele sempre foi interessado, as histórias de samurais. Ele já havia apresentado em suas obras anteriores diversos elementos da cultura nipônica, sobretudo, os códigos de honra de guerreiros e a importância das artes marciais na formação de seus guerreiros. Demolidor, Elektra e Wolverine na visão de Miller são mais que heróis, são autênticas representações de personagens orientais, como ninjas e samurais, tanto na forma, como no conteúdo.

Mas ao invés de contar uma história do Japão Medieval como tantas outras, ele inseriu este universo numa esfera de ficção científica, utilizando diversos elementos de mangá, muitos deles inspirados na obra “Lobo Solitário”, do qual ele sempre admirou, para contar a saga de uma guerreira samurai em busca de vingança contra o assassino de seu pai, que após ficar aprisionada numa espada mágica, junto ao demônio que caçava, acaba indo parar numa Nova York futurista e caótica.

No desenrolar da trama, há diversas menções ao Japão Feudal e muitos confrontos entre humanos e robôs. O desenho animado “Samurai Jack”, de Genndy Tartakovsky tem diversos elementos inspirados na série de Miller.

Mesmo sem uma grande aceitação do público, a obra representa uma aproximação da cultura ocidental e oriental nos quadrinhos, além de representar um importante momento na história dos autores de HQs, que passaram a ter maior controle sobre suas obras em relação aos selos e editoras. A obra de Miller também redefiniu o conceito de quadrinho americano, aproximando-o ao estilo europeu, de traços e cores mais voltados para o artístico e visual do que para o dinamismo das cenas de ação.

O ano de 1986 marca o maior sucesso na carreira de Frank Miller, “Batman – O Cavaleiro das Trevas”, considerada uma das obras de quadrinhos mais importantes de toda a história, mostrando o retorno de Batman em uma Gotham City dominada por gangues e pela falta de esperança num futuro sombrio e destruído.

Mais violento e frio do que nunca, Batman é a única salvação dessa sociedade perdida, não medindo esforços para eliminar as ameaças, tanto as gangues de mutantes que dominavam a cidade, como o poder do governo americano, que tinha como principal propaganda e arma, nada mais, nada menos, que o Superman, um verdadeiro fantoche das forças direitistas dos EUA. Outros personagens conhecidos do universo DC ganharam versões futuras pelas mãos e mente de Frank Miller, como um Arqueiro Verde com ares de hippie e uma Robin, que traz Bruce Wayne de volta ao combate ao crime.

A visão de Miller para o Batman definiu o personagem nas histórias subseqüentes ao “Cavaleiro das Trevas”, inclusive em mídias além dos quadrinhos, como por exemplo, no filme de 1989, dirigido por Tim Burton. A contribuição maior de Miller para o personagem foi destruir totalmente a imagem construída pela série de televisão dos anos 60, que trazia um Batman “brincalhão” e totalmente distante às origens do personagem de Bob Kane. É importante salientar que essa imagem mais sombria do personagem já estava sendo feita em meados dos anos 70 nas aventuras escritas por Dennis O’ Neil e desenhadas por Neal Adams. Mas Miller definiu por completo essa tendência, revitalizando o Batman original.

No mesmo ano, Miller retorna para a MARVEL, novamente para ressuscitar o personagem “Demolidor”, cujas vendas começavam a cair, mesmo com a presença de Dennis O’ Neil nos roteiros e David Mazzucchelli nos desenhos. Além de “Demolidor: Guerra e Paz”, junto com Bill Sienkiewicz, e “Badlands” com John Buscema, Miller desenvolveu a história “A queda de Murdock”, com participação de Mazzucchelli e O’Neil na concepção da história.

O título nacional menciona a “queda” do personagem, mas na verdade, essa é apenas a primeira parte da série, chamada originalmente de “Born Again”, ou seja, os autores mostrariam a necessidade do herói em retomar o controle de sua vida, após passar por uma série de provações de toda ordem, como por exemplo, seus problemas amorosos, o fato de ter sua identidade sido descoberta e o valor de seus atos enquanto vigilante e justiceiro. Miller discute a relação de Matt com sua mãe, uma personagem que não era muito mencionada nas histórias do personagem até então.

Outro importante momento no universo do “Homem sem medo” é a série “Elektra Assassina”, escrita por Miller e desenhada por Bill Sienkiewicz, contando uma aventura da bela guerreira entre ninjas, ciborgues e muita violência. Na trama, uma Elektra sem memória, busca informações sobre seu passado ao mesmo tempo em que deve combater uma criatura conhecida como “A Besta” que escraviza pessoas, mas que tem planos de levar o mundo a uma guerra nuclear. Em meio a esse confronto, há a participação da S.H.I.E.L.D., a principal agência de espionagem do universo MARVEL e de um político obcecado pela guerreira.


A segunda parceria entre Miller e Sienkiewicz, logo após “Guerra e Paz” é bem mais estruturada e executada pelos artistas, o que levou à classificação “Epic Comics” para a obra, ou seja, voltada a um público adulto, sendo inclusive, distribuído em lojas especializadas. Além disso, a arte de Sienkiewicz se destaca pelo uso de aquarelas ao invés de tintas comuns para a arte de quadrinhos, conferindo à obra uma aproximação muito forte com quadrinhos europeus. Foi a primeira HQ pintada pelo artista e suas páginas poderiam muito bem estar em qualquer galeria de arte do mundo, devido à sua excelente qualidade e liberdade criativa do autor.

O que no início era apenas “mais uma história para ser escrita e desenhada” se tornou um dos maiores sucessos na indústria dos quadrinhos. A parceria entre o escritor e o desenhista foi se desenvolvendo ao longo do processo e criação da história, o que era mais importante para os dois, mais importantes do que o resultado final, segundo os próprios.

Em 1987, Miller retoma a parceria com David Mazzucchelli para criar mais uma história memorável de Batman. Em “Batman – Ano Um”, Miller reconta a história dos primeiros meses de Bruce Wayne como o “Cruzado da Capa”, ao mesmo tempo em que conta a história de James Gordon, chegando à Gotham como o novo tenente de polícia. Ambos os personagens, cada um à sua maneira, precisam lidar com o crime que assola a cidade, assim como a corrupção. Mesmo sendo uma história de Batman, o foco principal está em Gordon, que representa a esperança da população em alcançar a justiça pelos meios certos.

Como no universo das histórias em quadrinhos, morrer nunca foi problema, no ano de 1990, Frank Miller “resolveu” ressuscitar Elektra, na famosa história “Elektra Vive”, onde após a sua “morte” pelo Mercenário, a heroína é resgatada pelo Tentáculo para ser revivida. Mais que simplesmente trazer a heroína de volta à ativa, numa história de “mortos assombrando os vivos”, Frank Miller e Lynn Varney, sua colorista, que viria a se tornar também sua esposa, pretendiam criar uma obra que rivalizasse com as européias, que dominavam o mercado na época, tendo como grandes expoentes, por exemplo, o famoso quadrinistas Moebius.

O esforço em criar uma obra única foi grande, mas eles conseguiram e “Elektra Vive” é tida ainda hoje como uma das melhores histórias em quadrinhos da MARVEL e da carreira de Miller.

Ainda neste ano, Miller contou com a parceria do aclamado ilustrador Dave Gibbons (Watchmen) para criar a saga de Martha Washington, na série “Give Me Liberty”, uma crítica política ao regime democrata norte-americano por meio da história da ascensão de um líder que aos poucos vai se tornando um terrível tirano numa sociedade futura. A personagem-título passa de defensora do regime á uma ferrenha combatente do mesmo, ao descobrir os rumos que a sociedade deveria tomar caso continuasse sob o comando desse governo. As histórias seguem toda a vida da personagem e narram suas vitórias e derrotas contra o sistema.

No ano de 1991, Frank Miller lança um de seus trabalhos mais conhecidos e autorais, “Sin City – A cidade do pecado”, pela editora Dark Horse. Trata-se de uma série de 13 edições contando uma série de histórias em clima noir sobre uma cidade dominada pela corrupção e criminalidade.

A cidade de Basin City, localizada no noroeste dos EUA, próxima a Seatle, é marcada por uma constante chuva e pelos personagens que nela habitam, como policiais corruptos, líderes religiosos sem escrúpulos, prostitutas e pessoas sem ter o que fazer, entre outros tipos apresentados pelo autor. Dentre os principais personagens mostrados nas histórias, há Marv, um cara monstruoso e violento; Dwight McCarthy, um fotógrafo que deve favores às prostitutas e Goldie & Wendy, duas gêmeas que controlam o submundo das prostitutas.

As histórias foram contadas na série regular, entre os anos de 1991 e 1992, e em edições avulsas nos anos seguintes, contando aventuras e desventuras, tanto de personagens conhecidos do material original, como de outros apresentados nessas edições.

A série teve boa repercussão e mostra o estilo de Frank Miller, tanto na arte, quanto na forma como conta as histórias. Basicamente, os quadrinhos são feitos em um impressionante contraste de luz e sombra, com alguns elementos em cores, tais como sangue e determinadas partes do ambiente. Esse estilo noir de Miller é uma forma encontrada por ele para apresentar uma série de elementos de cena e situações numa mesma imagem, a partir do jogo entre luz e sombra e do contraste entre preto e branco. A falta de cor, segundo o autor, possibilita a amplitude na apresentação da história.

A escuridão é algo comum nas histórias de Miller porque segundo ele, representa muito de cada ser humano, seus impulsos e desejos em ultrapassar os limites estabelecidos pela sociedade. Tanto os atos heróicos, como os criminosos, se manifestam com maior poder quando estamos na escuridão, porque ela não representa apenas um estado em que nos encontramos, mas um estado que define muito de quem nós somos.

No ano de 2005, o diretor Robert Rodriguez convidou Miller para dirigirem uma versão da obra para o cinema, contando algumas histórias. Chamaram também para uma “participação especial”, o diretor Quentin Tarantino. O resultado final foi positivo e “Sin City – O filme” é bem fiel ao material em quadrinhos, numa das mais impressionantes transposições de uma HQ para as telas.


Ainda em 91, Miller escreveu “Hard Boiled”, ilustrado por Geof Darrow, sobre um cobrador de impostos suicida e ciborgue que se torna a última esperança numa corrida de robôs escravizados num futuro mais uma vez caracterizado como uma distopia.

Em 1993, na sua terceira passagem pela MARVEL, ao lado do famoso desenhista John Romita Jr., Miller lançou a série “Demolidor – O homem sem medo”, recontando a origem do personagem por um viés mais realista. A própria editora lançou uma campanha na imprensa de que Miller havia retornado com uma história avassaladora.

Em cinco capítulos, a história narra a trajetória de Matt Murdock, desde a infância, até seus tempos como o herói conhecido como Demolidor. Ao longo da saga, são reapresentados personagens marcantes na vida de Matt, como Wilson Fisk, seu amigo e sócio “Foogy” Nelson, sua maior paixão Elektra e Stick, responsável pelo treinamento do herói depois de seu trágico acidente.

Mais uma vez, Miller retrata a jornada pessoal do personagem principal, assim como seus dramas pessoais, tanto enquanto herói, quanto advogado.

O ano de 1995 foi marcado por um trabalho no mínimo diferente de Frank Miller. Ele escreveu a série “Big Boy and Husty”, desenhada por Geof Darrow, e publicada pela Dark Horse, sobre um garoto robô e seu companheiro robô gigante que têm que enfrentar uma gigantesca criatura réptil que ameaça a cidade de Tóquio. A temática e o traço são bem diferentes dos trabalhos anteriores atribuídos a Miller, mas mantém o mesmo espírito de aventura de outras obras.

Em 1998, Miller resgata um dos momentos mais marcantes da História Antiga, ao retratar em sua obra “300”a chamada “Batalha das Termópilas”, no ano480 a.C., onde 300 guerreiros espartanos liderados por Leônidas lutaram contra os exércitos persas, comandados por Xerxes, que estavam dominando toda a Grécia. Além dos registros históricos, Miller se inspirou no filme “Os 300 de Esparta”, de 1962, considerado um de seus preferidos na infância.

O formato da graphic novel inovou ao contar a história sob uma perspectiva horizontal de imagem, onde cada página dupla era representada como uma foto ou pintura das cenas narradas na trama. Segundo o próprio Miller, as histórias que se passavam nas cidades contemporâneas, deveriam ser contadas sob uma ótica vertical, porque assim elas são, com seus arranha-céus. Já as narrativas míticas e fantásticas, seriam contatas sob a visão horizontal, valorizando a amplitude das terras onde aconteciam as batalhas, além da própria perspectiva panorâmica dos combates.

A série recebeu diversos prêmios, mas também foi alvo de protestos, sobretudo, à conotação homossexual dos personagens, do tratamento dos espartanos com os demais povos e a extrema violência gráfica na edição. A forma como os guerreiros são mostrados também foi alvo de polêmica, já que eles não usam armaduras ou proteção, deixando os corpos o mais expostos possível. Não se trata de uma visão literal da história, mas uma concepção artística da mesma.

No ano de 2001, Frank Miller lança a continuação de sua maior obra. “O Cavaleiro das Trevas 2” se passa três anos após o fim da série original, quando Batman fora dado como morto e os EUA estavam sob o governo do presidente Rickard, um joguete nas mãos de Lex Luthor, transformando o país outrora livre, num regime facista. Os antigos heróis estão fora de combate e começam a voltar à ativa a partir do momento em que a tropa dos “batboys” liderada pela “Catgirl” resgatam Átomo e Flash. O ressurgimento das lendas heróicas é inevitável e o confronto com o Cavaleiro das Trevas mais uma vez ocorreria.

Miller não usou o estilo sombrio da obra original, preferindo fazer uma crítica ao mercado de quadrinhos tradicional, com seus heróis coloridos saltando de lá pra cá e enfrentando os desafios e oponentes. O visual dos personagens também é marcante, muito diferente dos desenhos norte-americanos comuns feitos pelos artistas ocidentais e mais influenciado pelo estilo japonês do mangá. Narrativa e traço com o objetivo de satirizar a indústria. Era essa a mensagem feita por Frank Miller e que a maioria dos fãs e adoradores de “Cavaleiro das Trevas” não quis entender. O resultado é que a obra foi uma das mais criticadas daquele ano e fez com que Frank Miller perdesse muitos pontos para os fãs de quadrinhos. Novamente Lynn Varney participou como colorista da obra.

O trabalho mais recente de Miller é “Holy Terror”, lançado em 2006, que conta a história do herói The Fixer lutando contra terroristas muçulmanos após um ataque à cidade de Empiry City. Segundo o próprio Miller, esta obra foi criada para ser uma “propaganda para ofender a maioria das pessoas”. O tema do terrorismo e a perseguição aos povos muçulmanos, sobretudo, após os eventos de 11 de setembro de 2011, fez com que essa obra recebesse críticas negativas, como por exemplo, ser considerada uma obra anti-islâmica.

O projeto inicial envolveria Batman combatendo a organização terrorista Al-Quaeda, mas essa ideia não foi desenvolvida, como se sabe. A partir dos ataques de 11 de setembro, Frank Miller passou a defender a soberania dos EUA enquanto nação dominante e o senso de patriotismo e auto-preservação dos norte-americanos, mesmo que para isso, o uso da força sobre outras nações seja usada. O personagem The Fixer estava mais para Dirty Harry (personagem de Clint Eastwood em filmes dos anos 70 e 80) do que para Batman, ou seja, ele seria muito mais durão e explosivo do que o racional Cavaleiro das Trevas.

Seja escrevendo e desenhando suas próprias histórias ou enviando seus roteiros para que outros artistas colaborem com ele na criação de obras fantásticas, Frank Miller é um nome que não pode ser esquecido por todos os amantes de histórias em quadrinhos e aventura em geral. O mais importante nas obras atribuídas a Frank Miller é que elas possuem um aspecto único, que caracteriza esse grande artista: a sua vontade de contar histórias para as pessoas.


MILLER NO CINEMA

Já nos anos 80, Frank Miller despertou o interesse dos produtores de Hollywood. O estilo de linguagem e as imagens elaboradas por Miller poderiam ser bem utilizados no cinema, e não tardou para que o escritor/desenhista fosse convidado para produzir roteiros.

O primeiro grande roteiro de Miller para o cinema foi de “Robocop 2”, filme de 1990. Após ter sido aceito no cenário do cinema, Miller disse que jamais abandonaria esse mercado. Contudo, os produtores do filme não gostaram da história escrita por ele e modificaram a história em vários aspectos. Mesmo assim, o nome de Miller é creditado no fim do filme. O mesmo aconteceu com o filme “Robocop 3”, mas desta vez, os produtores possibilitaram que Miller escrevesse uma nova versão de seu próprio roteiro. Evidentemente, após esses fatos, a posição de Frank Miller em relação às adaptações cinematográficas de suas histórias mudou.

Logo após isso, ele escreveu a sua versão de “Robocop 3” para a editora Dark Horse, detentora dos direitos do personagem.

Já em 2003, a partir do convite do cineasta e fã, Robert Rodriguez, ele aceitou voltar aos sets, para participar como co-diretor da versão de “Sin City” para as telonas. A aquisição de Quentin Tarantino ao projeto se deu por dois fatores: sua amizade com Robert Rodriguez e a possibilidade de trabalhar ao lado de seu ídolo, Frank Miller.

O próprio criador fez uma ponta no filme como um padre. Antes disso, ele já havia participado do filme “Demolidor – O homem sem medo”, como um bandido que morre nas mãos do Mercenário.

Em 2006, o diretor e produtor Zack Snyder lançou nos cinemas a sua adaptação fiel da obra “300”, que foi bem aceita por público e crítica por ser praticamente idêntica aos quadrinhos. O próprio Snyder admitiu em entrevistas que os quadrinhos serviram de roteiro para a filmagem das cenas. O objetivo do diretor era criar um filme visualmente espetacular, aproximando ao máximo o espectador da obra de Miller.

A Warner Bros. está produzindo um novo filme chamado “300 – Batalha de Artemísia”, sobre uma batalha ocorrida ao mesmo tempo que a das Termópilas, mas em outra parte da Grécia. Este filme focará na origem do personagem Xerxes, rei da Persa. Frank Miller está escrevendo e desenhando a HQ que inspirará esta nova produção cinematográfica.

E a mais recente participação de Frank Miller no cinema é a sua adaptação de “The Spirit”, personagem de Will Eisner, numa versão absolutamente fiel ao estilo gráfico do autor nos quadrinhos. Miller escreveu o roteiro e dirige o filme. O resultado não foi muito positivo nas bilheterias.

O mestre dos quadrinhos Frank Miller ainda tem muito a oferecer ao entretenimento e suas histórias continuarão a fascinar fãs por todo o mundo. Escondidos nas sombras ou lutando à luz do dia, os personagens de Frank Miller continuarão mostrando que o espírito humano é o que nos torna heróis ou vilões, e que cada um de nossos atos tem consequências que nos acompanharão por toda a vida.

Vida longa a Frank Miller!


FONTE
: http://filmesegames.com.br/2012/frank-miller-o-homem-das-sombras/

domingo, 14 de maio de 2017

THE ROLLING STONES

Jumpin' Jack Flash (Promo Video 1968)





PARA SEMPRE

de  Carlos Drummond de Andrade

Por que Deus permite
que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.
Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça,
é eternidade.
Por que Deus se lembra
— mistério profundo —
de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará sempre
junto de seu filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho.


sábado, 13 de maio de 2017

MOEBIUS / DRUILLET

From "Approche Sur Centauri
by Jean"Moebius"Giraud & Scenario by Philippe Druillet 
Metal Hurlant # 1; first quarter of 1975





ANA CRISTINA CÉSAR


“Apaixonada,
saquei minha arma,
minha alma,
minha calma.
Só você não sacou nada.”



terça-feira, 9 de maio de 2017

CECÍLIA MEIRELES

Motivo

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
— não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
— mais nada.

sexta-feira, 5 de maio de 2017

NEW YORK DOLLS

Bad Girl & Stranded in the Jungle
Musikladen 1973

NUM LAGO DOURADO

On golden pond, 1981, Universal Pictures, 109min. Direção: Mark Rydell. Roteiro: Ernest Thompson, baseado em sua peça teatral homônima. Fotografia: Billy Williams. Montagem: Robert L. Wolfe. Música: Dave Grusin. Figurino: Dorothy Jeakins. Direção de arte/cenários: Stephen Grimes/Jane Bogart. Casting: Dianne Crittenden, Barry Primus. Produção: Bruce Gilbert. Elenco: Henry Fonda, Katharine Hepburn, Jane Fonda, Doug McKeon, Dabney Coleman. Estreia: 04/12/81

10 indicações ao Oscar: Melhor Filme, Diretor (Mark Rydell), Ator (Henry Fonda), Atriz (Katharine Hepburn), Atriz Coadjuvante (Jane Fonda), Roteiro Adaptado, Fotografia, Montagem, Trilha Sonora, Som
Vencedor de 3 Oscar: Ator (Henry Fonda), Atriz (Katharine Hepburn), Roteiro Adaptado
Vencedor de 3 Golden Globes: Filme/Drama, Ator/Drama (Henry Fonda), Roteiro

Existem no mínimo dois motivos para que o filme "Num lago dourado" tenha sido feito. Primeiro, para registrar em película o emocionante encontro entre duas gerações de uma nobre linhagem do cinema americano (que vivem na tela um interessante paralelo do que viviam na realidade) e para dar a Henry Fonda, aos 76 anos de idade, sua maior chance de levar um Oscar. O primeiro objetivo foi atingido plenamente: ao lado da filha Jane, de forma comovente, o veterano ator exorcisa uma difícil relação familiar em frente à plateia de forma comovente. E no resultado do segundo motivo saiu-se ainda melhor: não só Fonda levou a estatueta como sua companheira de cena, Katharine Hepburn arrebatou seu quarto Oscar, estabelecendo um recorde que não dá sinais de ser batido tão cedo.

Escrito pelo dramaturgo Ernest Thompson baseado em sua peça teatral homônima, o roteiro de "Num lago dourado" versa sobre assuntos normalmente considerados venenos de bilheteria, como velhice, medo da morte e relações familiares problemáticas. Totalmente escorado no trabalho de atores e em seus diálogos bem escritos, em detrimento de efeitos visuais e piadas infames (que já na época de seu lançamento faziam a alegria dos estúdios), o filme de Mark Rydell conquista justamente pela simplicidade de seu enredo e pela felicidade na escalação de seu elenco. Ao contrário de aborrecer o público com falas inflamadas e lugares-comuns, "Num lago dourado" oferece à plateia um espetáculo de delicadeza e bom gosto, que exige apenas um mínimo de sensibilidade para emocionar a audiência sem apelar para golpes baixos.

A trama do filme se passa no verão em que Norman Thayler Jr (vivido com sutileza por Henry Fonda em seu último papel) completa 80 anos. Irascível, rabugento e sem maiores admirações pelos seres humanos em geral, ele chega até sua casa de verão com a dedicada esposa Ethel (Katharine Hepburn) pra comemorar seu aniversário e afastar-se do turbilhão da cidade grande. Logo em seguida sua única filha, Chelsea (Jane Fonda) também chega ao local, acompanhada do novo namorado, Bill Ray (Dabney Coleman) e do filho deste (Doug McKeon), um menino de 13 anos de idade, rebelde e pouco amistoso. Fica patente para os visitantes que a relação entre pai e filha não é das mais saudáveis, mas mesmo assim tudo transcorre dentro da normalidade. As coisas mudam de figura quando Chelsea pede aos pais que fiquem cuidando de seu futuro enteado enquanto ela viaja com Bill Ray. O que poderia ser uma temeridade, no entanto, acaba ajudando tanto o menino, que torna-se mais afável, quanto o próprio Norman, que vê no rapaz o neto que nunca teve.
A maior beleza de "Num lago dourado", além de sua fotografia deslumbrante, é a maneira com que o roteiro de Thompson trata suas personagens. Abdicando de qualquer condescendência, ele criou personagens dolorosamente reais, repletos das qualidades e defeitos de qualquer ser humano. Norman é um homem amargurado, chato, de uma misantropia quase patológica, mas ao mesmo tempo se envolve em uma relação de amizade e amor com um pré-adolescente que busca aceitação e carinho. E sua filha, uma mulher fechada em suas mágoas de infância tenta desesperadamente conquistar a admiração de um pai do qual nunca teve mais do que críticas. No meio deles, uma mãe carinhosa e amorosa que luta para uní-los através dos laços de sangue.

É inegável que "Num lago dourado" ganha muito com os embates verbais entre os dois Fonda de seu elenco, ambos vibrantes e à flor da pele. Mas é injusto não aplaudir também a química entre o bom e velho Henry e o menino Doug McKeon (que, a despeito de seu bom trabalho não conseguiu uma carreira decente em Hollywood): as cenas entre os dois transmitem uma ternura quase palpável, que emociona sem ser piegas. E emocionante, aliás, é um eufemismo para o que acontece quando Fonda e Katharine Hepburn estão juntos. O último ato do filme, em que o velho casa volta a ficar sozinho em casa depois da partida de seus convidados é de uma pungência ímpar. Sem recorrer a truques sujos para tentar a emoção do espectador, o texto de Thompson e a direção elegante de Mark Rydell atingem o máximo de beleza ao deixar que seus intérpretes brilhem ao máximo. E eles dão um show à parte, provando que talento definitivamente não envelhece.

FONTE:

terça-feira, 2 de maio de 2017

WOLFMOTHER

Victorious (Jimmy Kimmel Live)


É UMA MERDA


por  Antonio Thadeu Wojciechowski



é uma merda

senhoras e senhores
a partir deste vocativo
invoco a musa dos fedores
e assim torno imperativo
o tema que agora abordo

senhoras e senhores, é uma merda
o grande cagalhão que como um bólido
nos enfiam pela boca aberta
deixando uma sensação fétida
tanto na calcinha como na cueca

senhoras e senhores,
isso não é uma metáfora
e muito menos uma metonímia
destilando magia de mandrágora
ou um poeta lambuzando a pílula

não, senhoras e senhores,
não é a merda de Salvador Dali
que nos faz rir a gases despregados
e nem mesmo aquela do Leminski daqui
comparando a amada em versos apaixonados

não, senhoras e senhores,
a merda a que me refiro
não é essa merda que dignifica
engrandece o espírito
e sólido o caráter nos edifica

não, senhoras e senhores,
também não é a merda da corrupção,
do tráfico, da violência, da prostituição,
da grana entupindo cu de políticos,
da miséria exposta como ornamento da nação

não, senhoras e senhores,
a merda, a grande merda de que estou falando
é que o povo brasileiro em sua grande maioria
tanto na prática como na teoria,
ao ver merda, merda, merda e mais merda
está cagando e andando, puta merda!



segunda-feira, 1 de maio de 2017

RAPHAEL KIRCHNER


MANOEL DE BARROS


Difícil fotografar o silêncio


Difícil fotografar o silêncio.
Entretanto tentei. Eu conto:
Madrugada, a minha aldeia estava morta.
Não se via ou ouvia um barulho, ninguém passava entre as casas.
Eu estava saindo de uma festa,.
Eram quase quatro da manhã.
Ia o silêncio pela rua carregando um bêbado.
Preparei minha máquina.
O silêncio era um carregador?
Estava carregando o bêbado.
Fotografei esse carregador.
Tive outras visões naquela madrugada.
Preparei minha máquina de novo.
Tinha um perfume de jasmim no beiral do sobrado.
Fotografei o perfume.
Vi uma lesma pregada na existência mais do que na pedra.
Fotografei a existência dela.
Vi ainda um azul-perdão no olho de um mendigo.
Fotografei o perdão.
Olhei uma paisagem velha a desabar sobre uma casa.
Fotografei o sobre.
Foi difícil fotografar o sobre.
Por fim eu enxerguei a nuvem de calça.
Representou pra mim que ela andava na aldeia de braços com Maiakoviski – seu criador.
Fotografei a nuvem de calça e o poeta.Ninguém outro poeta no mundo faria uma roupa
Mais justa para cobrir sua noiva.
A foto saiu legal.