quarta-feira, 29 de julho de 2009

DJANGO

Por: Rodrigo Carreiro 

 Com a explosão do chamado western spaghetti, entre as décadas de 1960 e 1970, o diretor italiano Sergio Corbucci ganhou, entre cinéfilos e admiradores do subgênero, a ingrata alcunha de “o outro Sergio”. O apelido era referência direta a Sergio Leone, mais talentoso cineasta a militar no movimento. Pouca gente sabia, entretanto, que Corbucci tinha sido assistente de Leone, e que partira para carreira solo ao mesmo tempo em que o mentor produzia o primeiro exemplar do western spaghetti, “Por Um Punhado de Dólares”, em 1964. “Django” (Itália/Espanha, 1966) foi feito quase ao mesmo tempo, só que acabou lançado dois anos depois. A rigor, Corbucci bebia na mesma fonte de Leone. Os dois utilizaram a mesma estrutura arquetípica para criar a figura do pistoleiro misterioso, infalível com a pistola e de passado incerto, que perturbava a ordem de cidadezinhas perdidas no meio da vastidão dos desertos do meio-oeste norte-americano. Nos dois casos, são heróis de ética própria, cuja moral está a serviço de si mesmo e acima de conceitos como Bem e Mal. Mas os resultados foram distintos. O talento levou Leone ao sucesso de crítica e a uma carreira em Hollywood. Já o apenas competente Corbucci jamais conseguiu ultrapassar a barreira do filme B. É interessante perceber que “Django”, apesar de tido como um filme inferior, influenciaria os dois filmes seguintes de Leone. Em “Por uns Dólares a Mais” e “Três Homens em Conflito”, o personagem de Clint Eastwood torna-se ainda mais silencioso e mais enigmático, o que lhe empresta uma aura quase mítica. Esses detalhes, que refinaram o imortal “homem sem nome” de Sergio Leone, são emprestados do Django de Franco Nero. Aliás, a persona do vingador misterioso se tornaria imprescindível para todo o western spaghetti. O subgênero, que gerou perto de 600 longas-metragens até meados dos anos 1970, criou dezenas de heróis idênticos. A origem desses vingadores enigmáticos pode ser encontrada nos quadrinhos de faroeste, muito populares na Itália. Mas Django e o homem sem nome de Clint Eastwood puseram esse arquétipo no mapa dos cineastas. Nesse sentido, a poderosa imagem de abertura de “Django” é insuperável. A tomada mostra nosso herói caminhando por uma planície lamacenta e carregando um caixão. Sim, um caixão. Uma música dramática, quase operística, acompanha a caminhada solitária. A presencia da bagagem macabra apenas acentua a curiosidade: quem é esse homem? O caixão está vazio, guarda algo ou alguém? A cena, embora criada como pano de fundo para a exibição dos créditos do filme, é a melhor do longa-metragem. Uma vez que o filme inicia, contudo, a semelhança da história com o primeiro faroeste de Sergio Leone é grande demais para ser ignorada. Django (Neri) chega a uma pequena cidade, cenário da luta de dois grupos de bandidos (militares renegados X bandoleiros mexicanos), para obter uma vingança. Nos dois filmes há cemitérios e caixões desempenhando papel importante. Mas a obra de Sergio Corbucci abre com mais perguntas do que a do compadre Leone: o que Django deseja vingar? E o que raios existe dentro do caixão, afinal? Essas perguntas serão respondidas mais rapidamente do que esperamos, já que após os 30 minutos de projeção a trama de vingança dá lugar a um assalto impossível, e envereda por outro caminho. Django é um pistoleiro na melhor tradição do western spaghetti: frio, ousado, veloz e de mira quase sobrenatural. O personagem é trabalhado por Corbucci com o mesmo estilo operístico de Sergio Leone. Ele abusa de closes que apanham o rosto de Django quase sempre encoberto pelo chapéu, o que acentua ainda mais o enigma do forasteiro e valoriza o azul límpido dos olhos do ator. O diretor prefere, também, valorizar os momentos de tensão pré-tiroteio, ao invés de exibir-se nas seqüências de violência e ação. Inserido dentro da tradição do western spaghetti, “Django” foi feito com orçamento minúsculo, o que dá ao filme a aparência tosca de um filme B. O orçamento é tão pequeno que não há sangue nos tiroteios: os atingidos têm quedas acrobáticas e morrem sem que sejam vistas manchas vermelhas nas roupas. A razão disso não foi a censura, como prova uma cena, particularmente perturbadora, em que os mexicanos torturam um ianque. O problema foi a falta de dinheiro mesmo. Esse detalhe não impediu Corbucci de colocar no enredo todas as marcas registradas do que se tornaria o gênero, como os cenários repletos de lama (um elemento de que Leone não gostava), as construções devastadas como se fizessem parte de uma cidade-fantasma e um ótimo criador de trilhas sonoras. Luiz Bacalov, como se sabe, ficaria conhecido por emular com perfeição o estilo de Ennio Morricone. “Django” pode não ter feito fama como os filmes de Sergio Leone, mas consagrou-se como um dos melhores exemplares do western spaghetti e não passou despercebido para os admiradores do estilo. Robert Rodriguez, por exemplo, apenas trocou o exótico caixão do pistoleiro por uma caixa de violão para criar seu assassino mariachi. E Quentin Tarantino, o mais famoso fã de faroestes italianos, fez uma citação bem evidente da cena da tortura de “Django” no seu trabalho de abertura, “Cães de Aluguel”. O lançamento brasileiro leva a assinatura da New Line Home Video. A cópia de “Django” tem imagem widescreen 1.85:1, com razoável qualidade, e duas trilhas de áudio Dolby Digital 2.0 (em inglês e português, ambas com chiados). O único extra é uma pequena entrevista legendada com Franco Nero (7 minutos), que lembra detalhes das filmagens. Django(Itália/Espanha, 1966) Direção: Sergio Corbucci Elenco: Franco Nero, José Bódalo, Loredana Nusciak, Eduardo Fajardo Duração: 90 minutos

 fonte: http://www.cinereporter.com.br/dvd/django/

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