TEMPOS MODERNOS (Modern times, 1936, Charles Chaplin Productions/United Artists, 87min) Direção e roteiro: Charles Chaplin. Fotografia: Ira Morgan, Roland Totheroh. Montagem: Charles Chaplin, Willard Nico. Música: Charles Chaplin. Direção de arte/cenários: Charles D. Hall/J. Russell Spencer. Produção: Charles Chaplin. Elenco: Charles Chaplin, Paulette Goddard, Henry Bergman, Stanley Sandford. Estreia: 05/02/36
Convencido de que o cinema sonoro havia realmente chegado para ficar e não era apenas uma fase transitória - como havia pensado logo que a novidade aportou em Hollywood - Charles Chaplin finalmente decidiu que já era hora de ceder em sua firme decisão de manter-se mudo. Escreveu um roteiro inteiro com diálogos, tendo seu Carlitos como protagonista, mas, para surpresa de muitos (e como esperado por outros tantos) mudou de ideia na última hora. Afinal de contas, sendo coerente com toda a sua filmografia anterior, o vagabundo que lhe deu fama, prestígio e dinheiro não poderia encerrar sua carreira nas telas falando, como se fosse um personagem qualquer. Sendo assim, "Tempos modernos", o último filme mudo do grande Chaplin também foi a despedida de Carlitos. E ele não poderia ter ido embora - na clássica cena final - em melhor estilo: ao mesmo tempo uma feroz crítica à frieza da era industrial e uma deliciosa comédia física repleta de sequências sensacionais, o filme encerrou, por ser também o último filme mudo realizado em Hollywood (sem contar paródias e posteriores homenagens), uma era do cinema americano com chave de ouro.
Lançado em plena Depressão americana - pós-quebra da bolsa de Nova York em 1929 - "Tempos modernos" mostra, em forma do típico humor aparentemente ingênuo de Chaplin, a opinião do cineasta em relação à automatização do mundo, em detrimento dos seres humanos, frequentemente oprimidos em fábricas que os tratam como animais (como fica evidente em várias sequências) ou empregados descartáveis. Tais pensamentos políticos acabaram se revelando, alguns anos depois, nocivos ao próprio diretor, quando, investigado pelo Comitê de Atividades Anti-americanas e taxado como comunista, viu-se impedido de voltar aos EUA por mais de vinte anos. Talvez os americanos devessem também ter ficado contrariados com Mahatma Gandhi: foi em uma conversa com o líder indiano sobre a dominação das máquinas sobre as pessoas que Chaplin teve a ideia para seu roteiro.
Utilizando apenas efeitos sonoros - até mesmo como forma de ilustrar suas ideias a respeito do progresso e da modernidade na sociedade - Chaplin conta a história de um homem comum (seu conhecido vagabundo) que começa o filme enlouquecendo com o trabalho mecânico em uma fábrica, que, além de obrigá-lo a um trabalho repetitivo, ainda o usa como cobaia em um teste de uma máquina de dar comida na boca dos funcionários (!!). Depois de sair do hospital, ele tenta voltar ao mercado de trabalho, principalmente por estar apaixonado pela filha de um grevista morto em combate (Paulette Goddard). Logicamente as coisas não saem como o esperado e, enquanto tenta encontrar um lugar ao sol em uma sociedade cada vez menos afeita ao indivíduo, ele brinda o espectador com momentos da mais pura poesia visual equilibrados com um brilhante timing cômico. Chaplin chega inclusive a deixar com que a plateia finalmente ouça sua voz, cantando uma música cuja letra (em um idioma incompreensível) não faz o menor sentido a não ser que se acompanhe os gestos que ele faz.
Mais um enorme sucesso na carreira de Chaplin, "Tempos modernos" encerrou um ciclo em sua filmografia, melancolicamente ilustrado pela belíssima canção "Smile", composta por ele mesmo. Seu filme seguinte, "O grande ditador" faria uma sátira ao nazismo em geral e Adolf Hitler em pessoa e a partir de então, o som estaria definitivamente incorporado à sua dinâmica como cineasta. Seu capítulo final na fase mais brilhante de sua carreira é mais uma prova inconteste de sua genialidade e da perenidade de suas ideias - por mais avançadas que elas pudessem ser. Impossível não se deixar encantar.
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