sexta-feira, 22 de setembro de 2017

MANOEL DE BARROS


Autorretrato falado



Venho de um Cuiabá de garimpos e de ruelas entortadas.

Meu pai teve uma venda no Beco da Marinha, onde nasci.

Me criei no Pantanal de Corumbá entre bichos do chão,

aves, pessoas humildes, árvores e rios.

Aprecio viver em lugares decadentes por gosto de estar

entre pedras e lagartos.

Já publiquei 10 livros de poesia: ao publicá-los me sinto

meio desonrado e fujo para o Pantanal onde sou

abençoado a garças.

Me procurei a vida inteira e não me achei — pelo que

fui salvo.

Não estou na sarjeta porque herdei uma fazenda de gado.

Os bois me recriam.

Agora eu sou tão ocaso!

Estou na categoria de sofrer do moral porque só faço

coisas inúteis.

No meu morrer tem uma dor de árvore.



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