O Mutante imprevisível se (re)cria.
É
impossível não ficar embasbacado com tanta alteração de curso. Quando a
gente acha que capturou a essência da criatura, ela foge. Esconde-se
atrás de seu ego impossível de se mensurar, criando um universo novo a
cada investida. Nos mostra como somos vários em um, que é possível se
reinventar a cada fase de nossa vida criando um novo universo em cada
página virada.
Poderia
ter sido um monge budista. Ou apenas ter se consolidado com um humilde
mímico e ator, mais um ilustre e talentoso desconhecido multiartista.
Mas jamais desistiu da fama, objetivo para o qual parecia ter sido
criado. Ainda que tardia, pois a obteve depois dos 20, fez de tudo para
conseguí-la. Até mesmo dormir com quem fosse necessário. Seu primeiro
verdadeiro casamento, com Angie, foi a definitiva produção inicial de si
mesmo. Encontrou alguém para direcioná-lo, e também não teve prurido de
trocar tudo quando se encheu. É, assim são os artistas, assim é Bowie.
Tanta
inteligência e talento para o Pop sempre se expandiu na hora certa,
mais do que imitando, ditando moda. Ator, web-designer, estilista,
cantor, compositor, arranjador, pintor? O importante é a arte, não o
meio para expressá-la. Sejamos pragmáticos como ele o é. Vejamos o que
esperam de nós, atendamos à demanda e acrescentemos nosso dom. Aí
teremos a novidade, pronta pra ser admirada por todas as partes do
mundo.
Desde
um convencional cantorzinho inglês que faz comédia até o mais
desbravador artista underground eletronificado, nosso herói é uma
verdadeira metamorfose. Não satisfeito em criar um personagem que marcou
toda uma geração e um estilo, ele abandona o barco e investe na
profundidade de Orwell, na transcendência de Turcos e Berlinenses, na
eletrônica e na livre experimentação, vira um suíço de coração e produz
algumas das canções mais marcantes do pop rock. Sempre reciclando
músicos e amigos, pelo menos é fiel a si mesmo. Não trai sua natureza
renovadora.
Inesquecível ouvir Five Years
pela primeira vez. É a valsa do mundo contemporâneo e cada vez mais
atual. Teremos realmente 5 anos? O mundo urge, as pessoas se
descontrolam e caem na violência. Há muita informação, mas ninguém sabe
de nada. A glamorização dos ricos e famosos se tornou insuportável. O
culto ao bizarro também. Bowie é o criador e a criatura dos eventos
pós-modernos. Culpado ou vítima?
Mesmo sem ser famoso ele escreveu algumas canções incríveis: Life on Mars?, Changes, Oh, You Pretty Things estão entre as melhores, com certeza. Não há quem não tenha dançado ao som do existencialismo de Let’s Dance ou China Girl nos 80. Não há quem não queira ver um show seu, que é sempre inovador e/ou surpreendente.
Mas por onde anda essa pessoa? Provavelmente em uma bucólica paisagem,
curtindo a vida, nos dando, mais uma vez, o exemplo do que é melhor
fazer em uma determinada época, depois do desgaste da mocidade. Afinal,
cabe aos grandes nomes da cultura encaminhar as novas gerações para o
conforto e a beleza.
Por Lawrence David
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