por Zé da Silva
Escorpião
Mirou e deu o tiro na cara. Estava a quinhentos metros. Ficou olhando
pela lente o impacto, feito soco, e a cabeça se desfazendo. Miolos ao
ar. Sangue. Seguranças em polvorosa e patéticos, como se esperava. Riu.
Deixou a arma ali, no alto do prédio. As luvas cirúrgicas enfiou no
bolso. Vestia um terno Ermenegildo Zenga. Para a ocasião especial. Não
riu. Não chorou. Cumpriu a missão que o anjo lhe deu. O anjo do mal.
Naquela noite de insônia e raios vistos pela janela do sótão. Não era
filme. Não era sonho. Ser assassino de assassino. O outro, um genocida.
Por não cumprir leis. Por inventar leis em benefício próprio. Por isso
ele beijou a ponta da bala. Aquela. Que penetrou bem entre os olhos e
arrancou o tampo e o fundo da cabeça. Ao sair do prédio sentiu vontade
de Eskibon. Comprou. Foi andando pela ciclovia. Um pedaço da fina camada
de chocolate se desprendeu. Caiu na ponta do sapato de cromo alemão.
Ele parou, olhou e riu. Uma sabiá pousou ao lado, na grama. Ele olhou e
achou que a vida vale a pena. Sirenes ao longe. Faziam o estardalhaço
inútil. Ele foi para casa e dormiu. O anjo não apareceu naquela noite.
Fonte: http://jornale.com.br/zebeto/2011/01/27/horoscopo-282/
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