sexta-feira, 18 de julho de 2008

LADRÕES DE BICICLETAS

Por Rodrigo Cunha
Ladrões de Bicicletas é um dos filmes integrantes do Neo-Realismo, movimento originário na Itália no meio dos anos 40 que contava histórias de conseqüências da guerra, ou então resistências durante a mesma; movimento que possui alguns dos melhores filmes da história do cinema. Além do filme em questão, Roma, Cidade Aberta (de Roberto Rossellini, com roteiro do gênio Frederico Fellini), Obsessão e A Terra Treme (ambos de Luchino Visconti) são outros clássicos inesquecíveis presentes no movimento.
Quem dirige Ladrões de Bicicletas é Vittorio de Sica, o mesmo por trás das lentes de Milagre em Milão e O Teto, o poeta do Neo-Realismo, o sentimental do triângulo básico neo-realista. Era o homem das emoções, o que ia direto aos corações italianos.
Vale citar que, por causa do medo da imagem que a Itália tinha com o que os filmes mostram, os neo-realistas sofriam diversas repressões, o que levou todos os diretores a abandonar esse estilo de filmar pouco depois.
Diversas pessoas são mostradas desesperadas, atrás de emprego, fazendo qualquer coisa. Mostra-se também o mercado negro, representado pelo mercado de bicicletas, e o desespero humano, até onde uma pessoa pode chegar. Aliás, é nisso que o filme se baseia, na degradação humana pela necessidade, em busca do que hoje para muitos pode ser banal. O desespero de forma crua e imprevisível, tudo com o toque sentimental inconfundível De Sica à obra. A história de Ladrões de Bicicletas se passa logo após a segunda grande guerra, com a Itália destruída e o povo passando necessidade. Ricci (interpretado pelo amador Lamberto Maggiorani) consegue um emprego após muita espera. Só que esse emprego (de colar cartazes na rua) lhe pedia como obrigação uma bicicleta, já que ele deveria se locomover muito e andando não seria uma boa opção, por causa do tempo que seria desperdiçado. Sem dinheiro, Ricci e sua mulher Maria (interpretada por Lianella Carell) conseguem dinheiro para uma bicicleta, possibilitando Ricci de realizar o seu trabalho. Na história há também o menino Bruno, interpretado por Enzo Staiola, filho do casal de aparentemente 10 anos, no máximo. Fascinado por bicicletas, o menino cai de cabeça com o pai na busca pela bicicleta que lhe foi roubada, enquanto Ricci trabalhava em seu primeiro dia. Esse roubo é o empurrão para o desenrolar do filme, a busca incansável de Ricci, seu filho e amigos para recuperar o objeto não só de trabalho, mas de esperança de uma vida melhor da família.
A cena em que Ricci consegue sua bicicleta e sai para o primeiro dia de trabalho é antológica. Só de lembrar da música eu me arrepio, a felicidade era completamente expressada na cena, a esperança de um futuro melhor, tudo. E a fotografia tem um papel importantíssimo na obra, além da música. Com o decorrer do filme, ambos vão ficando cada vez mais pessimistas, escuros, fúnebres. O clímax se desfaz com mais uma cena antológica, inesquecível, não há como não sentir pena do personagem. Outro ponto que queria ressaltar é a utilização de atores amadores na obra. Por causa da falta de verbas (e até mesmo do desemprego que rondava a época), muitos filmes neo-realistas eram rodados com 100% do elenco de atores amadores, como aqui em Ladrões de Bicicletas. Alguns casos à parte, como Roma, Cidade Aberta, faziam uma mistura de amadores com profissionais. De Sica sabia sempre como ninguém guiar seus atores, e este filme é um perfeito exemplo disso.Não há como, em nenhum momento do filme, você afirmar que aquelas pessoas em frente à câmera não são convincentes. Quando era necessário, recursos mais pesados eram usados, como na cena em que Bruno tinha que chorar após apanhar o pai. Enzo não conseguia chorar, então o que fizeram? Colocaram cigarros da produção em seu bolso e começaram a acusá-lo de roubo. Ofendido, o menino começou a chorar de verdade. Cena que De Sica captou com perfeição e adaptou de maneira mais magistral ainda à trama. Ah, outra curiosidade interessante (porém, nada feliz) é que muitas das cenas desse tipo de filme eram rodadas em céu aberto. Isso porque os estúdios italianos estavam todos ocupados com pessoas desabrigadas da guerra.
Ladrões de Bicicletas com certeza é um filme que irá não só lhe entreter, mas também emocionar. Não há como ficar indiferente a esta magnífica obra de De Sica, sentimentalista. Uma triste realidade, mas que é colocada de uma forma toda especial, reflexiva. Quem se considera um cinéfilo de plantão, filme obrigatório para se assistir e ter em sua videoteca caseira.


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