sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

A FENDA

por  Ticiana Vasconcelos Silva
 
Do muro desgastado e endurecido pelo tempo abriu-se uma fenda tão libertária quanto as mãos que a evitaram.
Mas de tão subestimada e evitada, fez-se das próprias armas que a negaram. Ela nasceu para dar sentido a algo que nem sequer se imagina, pois tudo parece ser tão natural e normal, que nada se consagra como se deveria. Por isso, não se dá valor a uma folha, mas sim à árvore que a contém. E da mesma maneira, a fenda é tão vil quanto aquela chuva que não molhou a alma.
A fenda é o caminho de poucos e raros, que se atrevem a conhecer o além muro e que foram sufocados pelo peso cinza da matéria e passaram muito tempo no escuro, dentro dessa estrutura.
Sua força está na esperança e na possibilidade que a fenda lhes proporcionou, de fazer brotar uma singela e potente vida por entre os maciços e densos cimentos, fragmentários e ladrões da eterna canção da liberdade. Estruturas feitas de medo e da busca insensata por segurança, que nos separam e nos distanciam da verdade: a de que estamos todos unidos.
Mas a fenda é feita pelo tempo, pela ação inexorável do movimento eterno de mudança e desapego. É por ela que transpassam todas as essências que a imaginaram e tiveram a coragem de forjar sua própria força, permanecendo fiéis ao estado latente e potencial da fenda. Um dia ela nasceria e abriria caminho aos que nela acreditaram e com ela sonharam.
Essa é a história e a razão de ser da fenda. Sem ela nada disso seria possível. E sem a criatividade e a imaginação, ela não teria sentido. Seria apenas uma fenda. Sem olhar, sem atenção, sem consciência.

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