segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

INCÓLUME

por Ticiana Vasconcelos Silva

Eu me envenenei com minha vaidade e pelas idades fui até o alto da montanha para olhar os considerados estúpidos e vis em um lugar em que não me caberia estar. Mas lá estava eu, sozinha e sem correntes, livre e com todos os graus de um ser inteligente, que usou sua inteligência para se impor. E assim eu esqueci de meus pés, assim como usei minhas mãos apenas para retirar as pedras do caminho. Esqueci os que vinham atrás e as atirei sem cuidado. Não olhei para trás, como reza a velha sabedoria, ato que muitas vezes pode se tornar um equívoco. O grande erro é que não me recordo porque caminhei, para que e o que esperava ver do alto da montanha. Fixei-me na ideia de chegar e de me testar e esqueci de apreciar, de me perdoar por errar, de reinventar novos caminhos e de me abrir para o que poderia acontecer. Peguei o meu cajado e trilhei até o topo. Cheguei, me extasiei e esqueci de caminhar novamente ao vale para contar aos curiosos, aos bons, aos perdidos, aos loucos e santos que existe sim um lugar onde se é livre de verdade, onde o coração se transforma no próprio coração do Universo e canta a canção dos infindos tempos. E cá estou eu, escrevendo esta declaração da dor mais triste que um ser pode sentir, que é a de se esquecer dos outros, de tudo, do que realmente vale a pena. E de que não há realização sem união.
Hoje estou na planície, como uma ave que busca seu alimento na terra e se esquece do céu. Mas, por saber de tudo isso, ainda me pego sonhando com a grande liberdade que me arrebatou e que hoje é a minha própria prisão.
Sem inspiração não há imaginação que sobreviva ao primeiro revés da vida. Sem amor não há quem sobreviva ao primeiro maremoto. Sem luz, não há espírito que grite no escuro por medo da solidão. Sem angústias, não há pulmão que se encha de esperança. E mesmo que a mente seja o nosso ambíguo amigo, não há caminho que se faça sem uma força que está além da montanha.

Sinto-me arranhanda, machucada, ferida, assutada, acuada e perdida depois de ter caído da montanha, mas minha alma me suspirou o seguinte título para esse texto: incólume.
Obs.: quando menciono cajado, não é uma apologia a profetas, mas sim uma metáfora do quanto necessitamos caminhar com algo que nos dá apoio externamente (família, drogas, festas, trabalho, paixões, enfim, nossos apegos), ou seja, o quão difícil é caminhar sobre nossas próprias pernas para alcançar nossas metas.



FONTE: http://paradoxodoser.blogspot.com.br/2012/12/incolume.html

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