quarta-feira, 3 de outubro de 2012

HORÓSCOPO

por Zé da Silva

Capricórnio

Chamaram os bombeiros, a polícia, as Forças Armadas. O que aconteceu naquela casa era algo inédito no país. Tragédia não foi porque ele se salvou milagrosamente. Mas ninguém entendeu porque juntou tantos santinhos de políticos desde que esta propaganda de campanhas políticas começou a inundar o país. Nem mesmo ele sabia. Depois de muito tempo no hospital contou que um dia foi enfeitiçado pelo olhar de candidato a vereador que se vestia num misto de curandeiro, vidente e mágico. Não lembrava o nome. Nem poderia. Ele então passou a recolher toda a papelada que via espalhada no chão nos dias de eleição. Ficou tão conhecido pelo hábito que os garis fizeram acordo e lhe repassavam tudo que recolhia. Comprou até uma Kombi para facilitar o transporte. Em casa entupiu os cômodos – e recusava visitas por causa disso. Quando não tinha mais espaço, começou a cavar no fundo do quintal e fez, sozinho, uma espécie de bunker. Guardou, guardou, guardou e, jura, ouvia vozes dos candidatos ao dormir. Eram as promessas que vinham embaralhadas num coro que mais parecia o de torcidas em dia de clássico de decisão no futebol. Até aquele dia em que descobriu elas. As traças. Isso o tirou do delírio. Ficou louco, principalmente porque os bichinhos tinham se interessado pelos olhos do candidato naquele papelzinho que o hipnotizou. Ele começou a gritar e tentar adentrar aquele mundo de zilhões de papéis. Alguém arrombou a porta e os santinhos começaram a sair para a rua como se um dique tivesse se rompido. Foram precisos vários caminhões para limpar a casa. Tudo foi incinerado em fornos de siderúrgicas. Depois de algum tempo no hospital, ele voltou à vida normal. Agora é candidato.

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