terça-feira, 16 de outubro de 2012

HORÓSCOPO

por Zé da Silva

Escorpião

Na madrugada em preto e branco o motorista mantinha todas as janelas do carro abertas enquanto circulava sem destino pela cidade deserta. Usava uma jaqueta de couro, fumava de forma lenta e sentia prazer em controlar o carro americano antigo, quatro portas, volante enorme com aro cromado para acionar a buzina. Isso ele nunca fazia. Ao seu lado, no banco inteiriço, pacotes de dinheiro. Ele andava e, a intervalos não muito longos, apanhava um maço de notas e jogava para fora. Elas voavam ao sabor do vento. Ele nem olhava. Foi num dia de chuva que ele viu essa cena na tela de um cinema. O filme, japonês. Faz muito tempo. Não lembra o nome, não lembra o enredo, não lembra quantos anos tinha. Mas aquela abertura, sem fala, sem trilha, ficou para sempre em seu caráter. Ele nunca fez o mesmo, porque nunca teve, nunca roubou, nunca herdou, nunca nada. Mas sempre deixou o dinheiro no devido lugar, ao lado do banco, para ser tratado de acordo com a importância para a vida.

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