UM ARTÍSTA À SERVIÇO DA CORTE PORTUGUESA NO BRASIL
A primeira metade do século XIX nos permite relembrar, e com muita satisfação,
da presença de grandes artistas franceses no Brasil. Tal circunstância deveu-se
à intenção da própria Coroa portuguesa em trazer cultura para o país, na ocasião,
recém ocupado pela nobreza há apenas 08 anos. Destacaremos, dentre os habilidosos
"artistas-viajantes": Jean Baptiste Debret, que segundo a autora Valéria Lima,
fora o mais requisitado e competente, naquilo que pretendia revelar por meio
da arte.
O que pretendemos mostrar neste humilde artigo é o interesse, por parte dos expectadores, quanto à "realidade" inserida nas obras de Debret quando da sua "missão artística" aqui no Brasil. O artista francês foi "convocado" pelo Príncipe Regente de Portugal, D. João VI - em 1816 a retratar todos os momentos ilustres da monarquia.
A autora nos revela que Debret, em sua interessante obra: "Viagem Pitoresca
e Histórica ao Brasil", permite demonstrar importantes traços de sua própria
identidade e personalidade, distanciando-se um pouco daquela idéia de apresentar
"imagens fiéis" da escravidão negra no Brasil, e também sobre os "exóticos"
momentos da monarquia lusa, instalada no Rio de Janeiro a partir de 1808.
Debret sem dúvida, foi mais do que um pintor oficial da nobreza, também atuou
com muita competência na fundação da Academia Imperial de Belas-Artes do Rio
de Janeiro, contribuindo como professor, cumprindo desta forma, outro desejo
do Príncipe D. João VI.
Valeria nos lembra bem que neste período o Brasil encontrava-se em processo
de formação de sua própria história, inclusive como nação "independente".
UM POUCO DA ORIGEM ARTÍSTICA DE DEBRET
Jean Baptiste Debret, nasceu no ano de 1768, em Paris, França. Recebeu grande
influência artística de seu primo Jacques-Louis David, um virtuoso pintor
portador de um profundo rigor clássico. Debret sempre freqüentou ateliês na
França, seu pai era funcionário público e possuía verdadeiro interesse em
história natural, elaborando pesquisas sobre o assunto. Referida influência
também contribuiu bastante para trajetória artística de Debret, sendo utilizada
inclusive no Brasil.
A formação cultural de Debret se desenvolveu em meio
a conturbados momentos políticos da França revolucionária. O artista passou
a fazer parte do grupo de pintores responsáveis pelas imagens de atos históricos
e heróicos de Napoleão Bonaparte. As academias francesas de arte até este
momento, preocupavam-se com o resgate da historia antiga, trazendo, desta
forma, a intenção de elevar a moralidade social da época. Com a "intervenção"
de Bonaparte, o cenário é alterado, pois os pintores agora teriam de se preocupar
em revelar, com praticamente nenhuma liberdade, assuntos pertinentes à história
contemporânea, da qual o próprio Imperador era protagonista.
O AMBIENTE QUE ANTECEDEU A VINDA DE DEBRET PARA O BRASIL
É interessante notarmos que o cenário que antecedeu a vinda do pintor francês
a terras brasileiras estava um tanto quanto conturbado. Não podemos esquecer
que Napoleão praticamente expulsou a Coroa portuguesa, que na ocasião, fugira
para o Brasil. Em 1808 D. João e mais 15 mil pessoas que acompanhavam a Corte,
desembarcaram no Rio de Janeiro.
Neste mesmo período, os portugueses estavam
de relações políticas e sociais, completamente cortadas com os franceses.
Diante desta dimensão, talvez seja oportuno perguntarmos, qual seria o objetivo,
por parte dos portugueses, em trazer artistas franceses para prestar serviços
à monarquia no Brasil. Podemos, no entanto, destacar alguns fatores correspondentes
à questão: Segundo a autora, o próprio Debret, como mencionamos anteriormente,
fez parte dos pintores "oficiais" designado a retratar momentos gloriosos
de Napoleão Bonaparte. Por outro lado, não podemos deixar de mencionar a cultura
italiana que, por muitos séculos, formou grandes artistas como Michelangelo,
Leonardo Davinci, dentre tantos outros.
A Itália dominou, de forma soberana, o cenário artístico até meados do século XVII. A partir do final deste mesmo século e inicio do XVIII a França passou a revelar grandes talentos do mundo da arte, isto graças ao sensível avanço dos ensinos acadêmicos, reunindo desta forma, condições para competir e até superar a qualidade artística italiana. O próprio Debret estudou arte num ateliê na famosa Itália. Outro fator contribuinte que apóia a decisão dos lusos em trazer artistas franceses está ligado à atuação dos "agentes" portugueses. O agente português, Conde de Baça esteve em Paris momentos antes dos artistas franceses embarcarem para o Brasil. Com a eliminação definitiva de Napoleão em 1815 a diplomacia entre Portugal e França voltou a apresentar cordialidade entre os países.
Valéria Lima menciona que o Brasil desta época, encontrava-se em plena formação
e precisava de cultura, precisava de pessoas com capacidade de ensinar arte.
Este também foi um dos principais motivos da convocação dos artistas ao Brasil.
A dimensão de Debret não era diferente, pos fora convocado para atuar junto
à Corte portuguesa e que também acabou desempenhando importante papel na Academia
Imperial de Belas-Artes do Rio de Janeiro, como professor.
DEBRET: O ARTISTA OFICIAL DA CORTE, DA ACADEMIA ...
Valeria Lima menciona ainda um importante acontecimento quando da chegada
de Debret ao Brasil, em 1816. Visto que tal feito coincidiu com a morte da
então Rainha de Portugal, D. Maria I. O pintor francês estava incumbido, a
partir de então, de retratar o funeral da Rainha e, evidentemente, a aclamação
do novo monarca da Corte, inclusive o referido funeral. Paralelamente aos
trabalhos de pintor e cenógrafo da monarquia, Debret exercia funções como
membro fundador e pintor de história da Academia Imperial, conseguindo reunir
condições no sentido de "produzir" novos artistas para o país.
"Queria oferecer aos estrangeiros um panorama que extrapolasse a visão de
um país exótico e interessante apenas do ponto de vista da história natural.
Acreditava que o Brasil merecia estar entre as nações mais civilizadas da
época e que a elaboração de uma obra histórica a seu respeito seria uma contribuição
valiosa para que esta justiça se cumprisse."
Com o grande projeto Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, Debret revela
sua profunda relação pessoal e emocional, adquirida em sua permanência no
Brasil por 15 anos. Em 1831 o pintor solicitou licença ao Conselho da Regência
para retornar à França, alegando problemas de saúde. Dois motivos o levaram
a tomar tal atitude: primeiro para juntar-se a sua família e segundo, tão
importante para o artista quanto o primeiro, era organizar o primeiro volume
de sua obra Viagem pitoresca e histórica ao Brasil.
A Corte portuguesa aceitou tal solicitação, no entanto, condicionou-a a um
retorno do artista para o "novo mundo", fato que não ocorreu, Debret deixou
o Brasil em 1831 para nunca mais voltar. Mas, de acordo com a autora, o artista
francês jamais deixou se desvencilhar das terras brasileiras, estando profundamente
envolvido por meio de sua obra, até o fim de seus dias ocorrido em 1848.
O BRASIL "PINTADO" POR DEBRET
Por meio de sua obra Viagem ..., Debret procurou demonstrar, com minuciosos
detalhes e cuidados, a "formação" do Brasil, especialmente no sentido cultural
do povo e nação. Os 3 volumes foram publicados em 1834, 1835 e 1839. De acordo
com a autora, Debret enfatiza os principais destaques de sua obra:
"Ao longo de suas páginas, Debret enfatiza o que considera os diferentes
momentos da marcha da civilização no Brasil: os indígenas e suas relações
com o homem branco, as atividades econômicas e a presença marcante da mão
de obra escrava e, por fim, as instituições políticas e religiosas." Pág.
29
Debret procurou resgatar particularidades do país e do povo. Utilizou o termo
"pitoresco" com a ideologia de precisão, habilidade, talento, e qualidade
artística em representar e "preservar" o passado daquele povo.
Segundo a autora,
para Debret, esta obra favoreceria no sentido de demonstrar para Europa um
Brasil que merecia ocupar o mesmo lugar dos grandes e civilizados países.
Vejamos outra citação da autora a respeito do termo "pitoresco" utilizado
por Debret:
" ...traduzia, igualmente, nas primeiras décadas do século XIX, a opção por
privilegiar, no "retrato" dos povos, aspectos que não estivessem limitados
às questões políticas, mas que dessem testemunho da religião, da cultura e
dos costumes dos homens."
Debret preocupou-se muito com os textos que acompanhavam suas imagens, demonstrando
certa fidelidade ao sentido literário. Tal postura não era comum em outros
"artistas - viajantes". Muitos pintores não se preocupavam demasiadamente
com o sentido dos textos comparando-os com as ilustrações contidas em seus
trabalhos.
Esse desejo, por parte do pintor em resgatar costumes e acontecimentos do
passado brasileiro evidencia a importância de sua estada ao Brasil durante
esses 15 anos. Muitos acreditam em não haver nenhum tipo de contribuição por
parte do artista para história do Brasil.
CONCLUSÃO
O próprio Debret certamente não imaginava que sua viagem ao "novo mundo"
o tornaria reconhecido como o principal retratista do Brasil Imperial, considerando,
portanto, alguns cuidados, bem cogitado pela autora.
Em tempo, não há duvidas de que a passagem de Debret pelo Brasil criou um
positivo impacto desde suas brilhantes participações na Academia de Artes,
e em seu extraordinário desempenho ao participar como pintor e cenógrafo oficial
da monarquia brasileira. O talento sempre acompanhou o artista que cumprira
sua missão, alcançando resultados, muita vezes, alem da expectativa. Não é
de se admirar que muitos estudiosos, em nossos dias, estão trabalhando em
pesquisas sobre este magnífico e abrangente artista francês.
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