I
Eu amo a luta, transfiguradora e fecunda, em seus agudos instantes de plenitude.
Eu amo, eu amo a luta como se me apresenta, quando a vida sorri, e quando a vida me castiga. Porque a luta tem beleza intrínseca, como a fonte tem a água eo sol tem a luz.
Eu amo a luta, transfiguradora e fecunda, em seus agudos instantes de plenitude.
Eu amo, eu amo a luta como se me apresenta, quando a vida sorri, e quando a vida me castiga. Porque a luta tem beleza intrínseca, como a fonte tem a água eo sol tem a luz.
II
Eu não gosto do céu nessas noites macias em que a lua romântica vai tecendo madrigais a seu amante milenário.
Eu gosto do céu quando o sol faz doer os olhos dos homens atrevidos.
Eu gosto do céu quando o céu enche o mundo de claridades que deslumbram.
Eu não gosto do céu nessas noites macias em que a lua romântica vai tecendo madrigais a seu amante milenário.
Eu gosto do céu quando o sol faz doer os olhos dos homens atrevidos.
Eu gosto do céu quando o céu enche o mundo de claridades que deslumbram.
III
Eu não gosto do mar quando as ondas só fazem carícias à praia brancacenta.
Eu gosto do mar quando o mar é fúria desencadeada enchendo o ar com estrondejamentos de apocalipse.
Eu não gosto do mar quando as ondas só fazem carícias à praia brancacenta.
Eu gosto do mar quando o mar é fúria desencadeada enchendo o ar com estrondejamentos de apocalipse.
IV
Eu não gosto do vento quando a folhabgem apenas baila um bailado pequenino.
Eu gosto do vento quando os cedros descrevem curvas penosas, e toda a floresta fica gemendo na devastação absoluta.
Eu não gosto do vento quando a folhabgem apenas baila um bailado pequenino.
Eu gosto do vento quando os cedros descrevem curvas penosas, e toda a floresta fica gemendo na devastação absoluta.
V
Eu vejo refrações magníficas na pele de trabalhadores que suam em trabalhos rudes.
Eu me sinto orgulhoso quando minha própria fonte é só um porejar abundante.
Eu bebo meu suor sem nojo, como os selvagens deglutem religiosamente os restos de seus guerreiros mortos.
VI
Eu bendigo o rosário de inquietações que o destino me concedeu, porque por essas contas se há-de medir força de minha mocidade.
Eu bendigo os golpes com que o mundo me faz sofrer, porque esses golpes estão pondo à prova as energias de meu espírito.
Eu bendigo, eu bendigo a sanha dos que me combatem e a impiedade dos que me odeiam, porque, com este ódio e com esses combates, incendiarei substâncias novas do meu ser.
Eu vejo refrações magníficas na pele de trabalhadores que suam em trabalhos rudes.
Eu me sinto orgulhoso quando minha própria fonte é só um porejar abundante.
Eu bebo meu suor sem nojo, como os selvagens deglutem religiosamente os restos de seus guerreiros mortos.
VI
Eu bendigo o rosário de inquietações que o destino me concedeu, porque por essas contas se há-de medir força de minha mocidade.
Eu bendigo os golpes com que o mundo me faz sofrer, porque esses golpes estão pondo à prova as energias de meu espírito.
Eu bendigo, eu bendigo a sanha dos que me combatem e a impiedade dos que me odeiam, porque, com este ódio e com esses combates, incendiarei substâncias novas do meu ser.
VII
Eu abomino as horas longas e as largadas; porque nas horas largadas e longas, não se erguerão as catedrais imperecíveis.
Eu fujo do silêncio porque o silêncio é mensagem da noite e a noite é ausência do Sol.
Eu abomino as horas longas e as largadas; porque nas horas largadas e longas, não se erguerão as catedrais imperecíveis.
Eu fujo do silêncio porque o silêncio é mensagem da noite e a noite é ausência do Sol.
VIII
Eu não quero morrer na posição que todos ensaiam, no fim do dia.
Eu quero morrer varando o azul em saltos incríveis. Ou rasgando o chão pela força de velocidades inauditas. Ou sentindo, no fundo da vida, onomatopéias de sangue gorgolejando, de todas as carnes se abrindo…
Eu não quero morrer na posição que todos ensaiam, no fim do dia.
Eu quero morrer varando o azul em saltos incríveis. Ou rasgando o chão pela força de velocidades inauditas. Ou sentindo, no fundo da vida, onomatopéias de sangue gorgolejando, de todas as carnes se abrindo…
IX
Porque o cântico do homen novo é um cântico de guerra.
Porque o cântico do homen novo é um cântico de guerra.
Escreve a última frase, larga a caneta. Chega-se à janela e respira fundo, deliciado.
Consulta o relógio.
– Tão cedo! Podia passar tudo a limpo, agora.
Reflete.
– Não. De noite é melhor.
Arruma o cabelo, prepara o nó na gravata, enquanto relê os períodos mais importantes.
– Modéstia à parte, esse negócio está bem passável. Só que me saiu um tanto bolchevista. Mas não faz mal. De vez em quando se deve assustar os burgueses…
Veste o paletó. Examina-se no espelho. Sai do quarto assombiando um samba vitorioso.
Na sala de jantar. Clarita estuda um figurino.
– Que é isso? Tomando vento nas costas? Não tem medo de uma pneumonia?
– De uma não. Só de duas.
– Engraçadinha!
– Fecha a porta do corredor.
– Onde está meu guarda-chuva?
– Pra que guarda-chuva?
– Ora, pra quê…
– Com esse tempo firme?
– Tempo firme, nada! Então eu não conheço este Rio de Janeiro?
Mira-se no espelho da étagère. E recomenda:
– Não discuta mais com seu Gonçalves, ouviu? Não quero nem uma encrenca com os vizinhos.
(Eu amo a luta, transfiguradora e fecunda…)
– Mas o rádio do Português é insuportável, Raimundo.
– Embora.
– Você fala assim porque não passa o dia inteiro em casa, como eu.
Não retruca. Faz o último exame no traje.
– Bem. Vou indo.
– Há mais tempo.
Ganha a rua. Um automóvel passa chispando. Tapa o nariz com o lenço, por causa da poeira.
– Maluco!
Espera que o sinal fiquem bem aberto, antes de atravessar.
– Vou eu aí quebrar a cabeça, por imprudência…
(Eu quero morrer varando o azul em saltos incríveis).
Perto do poste de parada, os homens da Companhia trabalham ruidosamente. Um negro exibe ao sol o dorso nu. Sua em bica.
– Xexéu safado.
(Eu vejo refrações magníficas na pele de trabalhadores…)
O veículo não tarda.
– Fazem um barulho, esses bondes…
(Eu fujo do silêncio porque…)
Procura lugar, pedindo licença a meio mundo. Senta-se.
A perspectiva de mais um inútil dia de repartição lhe dá certa melancolia. Conforta-o, entretanto, o acontecimento da nova página.
O bonde faz a volta da rua Bambina, e Raimundo dos Santos Filho começa a recapitular, inteiramente absorto, o “Cântico do Homem Novo”.
Consulta o relógio.
– Tão cedo! Podia passar tudo a limpo, agora.
Reflete.
– Não. De noite é melhor.
Arruma o cabelo, prepara o nó na gravata, enquanto relê os períodos mais importantes.
– Modéstia à parte, esse negócio está bem passável. Só que me saiu um tanto bolchevista. Mas não faz mal. De vez em quando se deve assustar os burgueses…
Veste o paletó. Examina-se no espelho. Sai do quarto assombiando um samba vitorioso.
Na sala de jantar. Clarita estuda um figurino.
– Que é isso? Tomando vento nas costas? Não tem medo de uma pneumonia?
– De uma não. Só de duas.
– Engraçadinha!
– Fecha a porta do corredor.
– Onde está meu guarda-chuva?
– Pra que guarda-chuva?
– Ora, pra quê…
– Com esse tempo firme?
– Tempo firme, nada! Então eu não conheço este Rio de Janeiro?
Mira-se no espelho da étagère. E recomenda:
– Não discuta mais com seu Gonçalves, ouviu? Não quero nem uma encrenca com os vizinhos.
(Eu amo a luta, transfiguradora e fecunda…)
– Mas o rádio do Português é insuportável, Raimundo.
– Embora.
– Você fala assim porque não passa o dia inteiro em casa, como eu.
Não retruca. Faz o último exame no traje.
– Bem. Vou indo.
– Há mais tempo.
Ganha a rua. Um automóvel passa chispando. Tapa o nariz com o lenço, por causa da poeira.
– Maluco!
Espera que o sinal fiquem bem aberto, antes de atravessar.
– Vou eu aí quebrar a cabeça, por imprudência…
(Eu quero morrer varando o azul em saltos incríveis).
Perto do poste de parada, os homens da Companhia trabalham ruidosamente. Um negro exibe ao sol o dorso nu. Sua em bica.
– Xexéu safado.
(Eu vejo refrações magníficas na pele de trabalhadores…)
O veículo não tarda.
– Fazem um barulho, esses bondes…
(Eu fujo do silêncio porque…)
Procura lugar, pedindo licença a meio mundo. Senta-se.
A perspectiva de mais um inútil dia de repartição lhe dá certa melancolia. Conforta-o, entretanto, o acontecimento da nova página.
O bonde faz a volta da rua Bambina, e Raimundo dos Santos Filho começa a recapitular, inteiramente absorto, o “Cântico do Homem Novo”.
Fonte: http://jornale.com.br/zebeto/
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