por Zé da Silva
Touro
Só tinha barriga nas fotos. Assim pensava. No espelho, nada. Ficava
de frente e a mágica se fazia. Gostava de olhar uma foto feita quando
tinha 30. Agora era avô, mas se achava como aquele magrinho da pose na
frente do bosque. Trinta quilos depois ele se recusava a se olhar de
lado no espelho. Mas não esquecia os anos que passou comendo três
sanduíches gordurosos por noite na solidão da quitinete. Todo o tempo
observado pelo olhar de uma belíssima modelo. Ela estampada na página de
um jornal pregado no vidro da janela do quarto. Era sua cortina. O ruim
da maionese fica para o lençol onde os dedos e a boca eram limpos.
Gostou da frase. Mas acontecia isso mesmo. Tempos arrastados. Agora,
não, mas ficou a marca. Aquela branca entre o alto da barriga e os seios
flácidos depois de um dia de sol na praia. Não, não, foto não! Ah, bom,
de frente, saindo da água, calção levantado sobre a dobra, até que
parece bem. Como no espelho, em casa, corpo inteiro, de longe, na
penumbra, toda noite, antes de dormir, sem comer hambúrgueres – mas
sempre sozinho. Ele e a barriga.
Fonte: http://jornale.com.br/zebeto/
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